Por favor metam aqui um final feliz. E eu menino não corri pelas picadas de Angola, mas escondia-me nas sombras de Luanda, deitava-me de barriga para o ar, e debaixo das mangueiras sonhava com papagaios de papel, o cordel suspenso no portão de entrada, junto a mim, junto a mim um triciclo enferrujado pelos anos, e escutava os Mercedes-Unimog em corridas vagarosas para o Grafanil,
- E se eu pudesse metia um final feliz
O avô Domingos com os ossos esmagados na claridade da manhã, a cidade engasgava-se quando do cacimbo emergia o silêncio, e pelas ruas da cidade passeava um machimbombo infeliz pelos anos, e eu aguardava impacientemente pelo seu regresso, o abraço de sempre, a areia límpida da ilha do Mussulo, a Mutamba, e frente à estatua da Maria da fonte, eu silenciava-me e perguntava-me,
- Tão grande
Eu silenciava-me e perguntava-me, e hoje pergunto-me o porquê dos camuflados em Angola, porquê, e para quê, e hoje não capim, hoje não ilha do Mussulo, hoje não avô Domingos, hoje o avô Domingos sentado na esplanada do Baleizão em conversas com Deus,
- Protege o meu neto
E se eu pudesse metia um final feliz, no céu desenhava papagaios de papel, sentava-me numa cadeira de praia, e na Baía de Luanda ficava a olhar o mar, apenas o mar, e esperava que o meu corpo adormecesse eternamente, e enquanto o meu papagaio de papel constrói sílabas nos céus de Luanda, percebo que todos os finais são infelizes,
- Protege o meu neto.
(texto de ficção)
Luís Fontinha
9 de Junho de 2011
Alijó