O cubo do corpo
Hermeticamente fechado
E lá de dentro o cheiro da minha mão
Que me acena do silêncio frio da escuridão
Fumo de papel amarrotado
O corpo impresso na calçada junto ao rio
À procura de barcos com chouriço
E migalhinhas de pão
O corpo sem mão
Camuflado na manhã sedosa das nuvens envergonhadas
Cansadas
Depositadas na sepultura da tarde quando as rosas
Empoleiradas no arame da secura
A boca engasgada nas horas intermináveis
Da língua o fogo do desejo
Na língua os teus beijos amargurados
Finos cansados acordados
Que tingem o meu corpo de névoa anoitecer
Que prendem os meus braços aos ramos de uma oliveira
E na brincadeira
Espetas-me pregos nas costas pisadas na sombra
O meu corpo tomba
E na minha cabeça dessoldada
Poisa uma gaivota evaporada
O rio foge-me no mar
O meu corpo misturado com o lodo
Eu fico nada
E ontem eu também nada
Não tenho corpo
Lábios
Não tenho beijos
Ou corda onde me agarrar…
O meu corpo uma simples pedra
A rocha quando as lágrimas soltam o amanhecer
O meu corpo envelhece o meu corpo parece morrer
E os pássaros afogam-se no mar.