Desistir dos sonhos,
Por mais braçadas que dê o meu corpo afunda-se numa nuvem de sofrimento, das ondas gigantescas, correntes de aço prendem-me ao fundo dos grãozinhos de areia, e as algas agarram-se-me às pernas finas e cansadas, comem-me os olhos verdes, dilatam-se-me as mãos, e “the end” impresso na minha testa,
- The Doors em mergulhos semânticos nas entranhas do amanhecer, ele aos poucos morre, cansa-se do pai, cansa-se da mãe, cansa-se dele,
Cansa-se da vida construída de sonhos,
E os sonhos não são mais do que um projeto, uma folha de papel A0 com estruturas complexas, cálculos, aço, tudo o que imaginamos e que nunca seremos capaz de construir, uma vezes por culpa nossa, outras, outras pelo prazer dos outros,
- Um falhado, é o que tu és, quem já mo tenha dito,
Muita gente,
Ouço essas palavras desde menino quando me colocavam um pindérico rádio a pilhas junto à cabeça, eu olhava o teto e adormecia com o silêncio dos sons, hoje não adormeço, hoje não vivo, hoje, hoje por castigo transporto duzentos e seis ossos construídos de poeira, hoje tenho noção que sou uma “merda”,
- Uma “merda” em três páginas de currículo, e por favor, por favor não se aproximem de mim,
Porquê?,
Porque a quem se aproximar de mim alguma coisa lhe vai acontecer, ou fica doente, gravemente doente, ou morre,
Desistir dos sonhos,
Limpar o rabo ao sonhos, e esperar, esperar que a vida cesse,
- Sentado no xisto a olhar o rio e a contar socalcos,
E a vida num vagar cansativo, cessa,
The end.