Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

17
Jul 11

O alicate da tarde a mutilar-me os dedos

Os resíduos dos cigarros aprisionados às minhas unhas

E da pedra de xisto onde me sento

A maré de suor que encharca as minhas nádegas poeirentas

 

Esqueço o cigarro nos lábios

E ele extingue-se

Subtraio um Ai à dor da cinza em brasa

E o pássaro que poisava no meu ombro foge

 

Esconde-se nas mãos da amoreira

E eu aos poucos adormeço na sombra

E finjo que chapinho a mão na água salgada do mar

E sinto um petroleiro que me entra pela garganta

 

Atraca-se-me ao estômago vazio

E a âncora agarra-se-me aos intestinos

De dentro de mim os arrotos das silabas

Contra as paredes da tarde

 

Cerro os olhos e sinto no pulso as horas em movimento

E o petroleiro a despejar o petróleo no meu corpo

O carbono evapora-se-me pelas narinas esquecidas nos cigarros

E percebo que dentro da minha cabeça voam borboletas

 

Abro os olhos

Olho-me ao espelho das mãos

Não vejo o alicate da tarde e à minha volta não existe mar

Estou sentado numa rotunda debaixo de uma amoreira…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:39

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