Este é o último poema da minha vida
As finíssimas palavras em espera
Sobre a copa das árvores
Odeio-te diz-me o poema
E eu fico feliz ao perceber
Que o poema deixará de me pertencer,
As palavras morrem dentro de mim
Como as gaivotas quando as nuvens emergem na água
E um soslaio de energia mecânica adormece
Os êmbolos da tarde,
O papel emagrece e em sombras
Absorve as palavras que me odeiam…
Não sei se hoje é o meu último dia de vida
Mas tenho a certeza que este é o meu último poema,
Todos os outros são meus e pertencem-me…
Mas este deixará de ter vida
De ser meu
Este poema é um fantasma
O esqueleto que dentro de mim habita
E desfalece na claridade da manhã,
A janela da biblioteca encosta-se nos livros doentes
E cansados da minha presença…
E um finíssimos sorriso de pássaros
Plantam-se no meu quintal,
O poema funde-se no cansaço dos dias
E renasce na alvorada em cinzas
O meu corpo e o poema beijam-se…
E da janela olho um barco cansado que se afunda,
O mar engole-o
E mais tarde quando vem a noite
Eu e o poema à procura de abrigo
No fundo do mar…