Abraçar-me a alguém ou a alguma coisa, nem que fosse a um embondeiro, deitar a minha cabeça no seu tronco e ouvir-lhe o palpitar do coração, pegar-lhe na mão e ficar em silêncio até que a noite se evapore na madrugada, hoje apetece-me um abraço mesmo sendo de um embondeiro,
E não quero olhar o mar, porque para mim é um luxo, e não me apetece ver a lua porque todas as noites a mesma lua, umas vezes de rosto descoberto pendurada na janela do céu e outras deitada, posições diferentes da mesma pessoa,
Abraçar-me a alguém ou a alguma coisa, nem que fosse a sombra de um candeeiro, nem que fosse um dos tantos livros que guardo, mas tenho preguiça de esticar os braços, procurar o livro certo porque hoje não me apetece abraçar a qualquer livro,
E não quero olhar o mar,
E começo a odiar o mar, as nuvens e as estrelas e os rios e as montanhas, porque hoje nem que fosse a um embondeiro, hoje abraçava-me a ele e ficava quietinho como fazem os pássaros, poisam nas árvores invisíveis, suspendem a respiração e adormecem,
Hoje preciso de um abraço, de alguém ou de alguma coisa, não interessa e não importa, apenas um abraço,
E não quero olhar o mar,
Porque o mar acorda-me a solidão,
Porque hoje odeio o mar.