Preciso que pegues na minha mão
Disfarçada de pétala,
Abandonada
Sem tela para brincar,
Escondida nas cores do teu olhar…
Preciso da manhã,
Perdida
No teu imaginário mar,
Quando ao longe vejo a saudade chorar.
Preciso que pegues na minha mão
Quando o dia acordar,
E baixinho sussurrares – estou aqui para te segurar…
Luís Fontinha
3 de Março de 2011
Moribundo eu junto ao cais que da maré se instala em mim o pôr-do-sol, as minhas pernas prisioneiras nas algas e nas minhas mãos sobrevivem aos sorrisos da madrugada passada, ele encostado ao silêncio, o outro ele, eu, quietinho como esperasse pelo acordar da noite, e ele desassossegado grita-me pedindo socorro,
- ao longe oiço a voz que me chama e da voz vem até mim o olhar que deixei pendurado numa nuvem, e da nuvem uma gaivota sobrevive à tempestade,
O néon da rua acorda, e bate em mim o vento que aos poucos em desenhos constantes dá vida aos meus cabelos, os meus olhos pairam dispersos no nada, e a minha boca desgovernada atira-se à noite,
- é tão longa a noite…
É tão longa a noite e ele gosta da noite porque é negra, e hoje possivelmente nem luar acordará, e eu dou por mim a contar minutos, um relógio pendurado na sombra avisa-me que são oito horas e vinte e cinco e trinta e seis, porra, tantas palavras para descrever um momento que já é passado,
- passado? Vamos em viagem ao futuro,
Que futuro…
O corpo dele começa a esquecer-se como eram as acácias, e que junto ao mar brincam gaivotas com cio, o corpo aos poucos é absorvido pelo sorriso da maré e do pôr-do-sol apenas ficou a areia fina da tarde,
- tenho medo da minha sombra quando se esconde dentro do guarda-fatos, e eu chamo por ela, e ela finge que não ouve, procuro debaixo da cama, não está,
Onde estará a tua sombra?
- acabo de olhar um machimbombo que passa e me sorri, não vai lá a minha sombra, e junto ao capim também não,
Talvez a tua sombra esteja dentro da tua mão, já viste?
Ele incrédulo abre a mão, olha-a como se fosse uma jóia acabada de nascer, nada, sombra nenhuma, apenas tem escrito,
- sou um inútil,
Moribundo eu junto ao cais que da maré se instala em mim o pôr-do-sol, respiro, deixo de respirar, acordo, adormeço, e oiço o balançar dos paquetes iluminados na noite escura, ele encostado ao silêncio, o outro ele, eu, faço desenhos na areia com as pontas dos dedos comidos pelo cansaço, e em voz alta ele pede-me socorro,
- ao longe oiço a voz que me chama e da voz vem até mim o olhar que deixei pendurado numa nuvem, e da nuvem uma gaivota sobrevive à tempestade,
O meu corpo suspenso num sorriso…
Luís Fontinha
3 de Março de 2011