Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

22
Mar 11

Na sala de espera um frenesim de vozes, uma senhora porque o governo já devia ter caído, outra, que vai cair amanhã, uma outra, junto ao umbral da porta, dizia,

- se cair eu apanho-o,

E eu apenas queria fazer a depilação. Nada de mais. É assim tão difícil?

Vou à janela e puxo de um cigarro, eu sei que não devia fumar, mas também não devia ouvir certas coisas e oiço, e das conversas que se construíam na sala de espera de nada me interessavam; eu só pretendia fazer a depilação…

Em cima de uma mesa as revistas do costume, as perguntas parvas do costume,

- beijei o meu namorado, será que estou grávida?

E eu que já nem me lembro da ultima vez que me veio o período,

- será que estou grávida? Mas não beijei o meu namorado…

No rádio alguém pede Tony Carreira,

- que mau gosto,

Na parede um crucifixo olha-me, deseja-me, e eu a ficar sem jeito,

- talvez porque hoje tenho a saia curta de mais,

Começo a sentir-me possuída com aquele olhar, incomodada, mas…

- mas Cristo também devia desejar mulheres,

E eu feliz por me sentir desejada…

O cigarro musicalmente vai percorrendo as avenidas da minha espera, e do fumo, do fumo vejo as sílabas a saírem pela janela, em baixo, na rua, um homem muito mal vestido pede cigarros,

- um cigarrinho,

E as sílabas a construírem frases, e das frases… palavras que se encaixavam na minha mão, e a minha mão não um livro,

- uma mão,

Um livro perdido na janela do primeiro andar, um livro onde não posso escrever mais nada, e ele aos tropeções nos paralelos da calçada,

- minha senhora, um cigarrinho por favor…

Não fumo.

Na sala de espera um frenesim de vozes, uma senhora porque o governo já devia ter caído, outra, que vai cair amanhã, uma outra, junto ao umbral da porta, dizia,

- se cair eu apanho-o,

E eu nem o apanho nem o derrubo, eu só quero fazer a depilação.

- será que estou grávida? Mas não beijei o meu namorado…

E o meu namorado junto ao rio a contar algas, e de cigarro na boca envia mensagens às gaivotas, e as gaivotas não até mim, eu no primeiro andar, desejada por um crucifixo há não sei quanto tempo naquela posição, esquecido na parede juntamente com as fendas,

- há quanto tempo se formou o universo?

Nada de mais. É assim tão difícil?

 

 

 

(texto de ficção)

Luís Fontinha

22 de Março de 2011

Alijó/Portugal

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:53

São horas de desespero

As minhas mãos prisioneiras na madrugada

Eu em lágrimas

Eu sem forças para acordar,

Eu que me escondo na sombra

Dos lábios encarnados

E as horas de desespero à minha espera

Junto ao nada.

 

 

Luís Fontinha

22 de Março de 2011

Alijó/Portugal

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:11

 

 

O meu sonho é simples, e este é o meu sonho. Uma casinha de madeira pré-fabricada, na montanha junto a uma ribeira ou junto ao mar, um cão e uma mulher para amar.

Um quartinho simples para me deitar, não precisa de ser muito grande e um estúdio para poisar os meus livros, os meus cachimbos e os meus CD’S, e um pequeno espaço contíguo para pintar.

Este é o meu sonho e vou realizá-lo, mas ela já me fez o aviso… não vou limpar a tua parte.

Ah… parece que ela também precisa de um espaço para os livros.

Este é o meu sonho.

 

 

Luís Fontinha

22 de Março de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:43

Falta-me a força para caminhar

E enfrentar a ondulação do mar

Falta-me o amanhecer ao acordar

Quando da noite se despede a madrugada

 

E ao fundo da rua se apaga o néon.

Faltam-me as nuvens para eu brincar

Nos finais de tarde junto ao rio…

Falta-me a coragem para partir

 

E navegar pelo oceano.

Falta-me a neblina

Onde se esconde a solidão

E adormece a minha mão em desespero…

 

Falta-me a lua para abraçar

Quando não consigo adormecer,

Falta-me o silêncio do sol

Quando se esquece de acordar.

 

Tudo em mim falta;

Excepto os livros para ler

E as telas para pintar…

 

 

 

Luís Fontinha

22 de Março de 2011

Alijó/Portugal

publicado por Francisco Luís Fontinha às 11:22

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