Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

29
Mar 11

Não preciso de dinheiro

Para viver

Apenas necessito do teu amor

Para respirar

 

Não quero automóveis de luxo

Casas de muitos aposentos

Não preciso de fato e gravata

Nem de sapato engraxado

 

Mas preciso do teu amor

Para respirar,

 

Preciso de ser amado.

 

 

 

FLRF

29 de Março de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:24

Não tinha quase nada, e do pouquinho que tinha, possivelmente perdi-o. É como uma gaivota quando se lhe tira as asas e começa a afundar-se no oceano, aos poucos mergulha, deita-se no chão e abraça-se à maré.

Olho o horizonte, nada.

Olho para o céu, nada.

Olho a minha mão, e na minha mão nada, apenas as asas da gaivota.

Chamo por ela, não responde.

E partiu sem se despedir, e partiu sem me dizer adeus.

Corro apressadamente pela areia fina da praia, e não me canso de chamar,

- gaivota, gaivota… gaivota,

E a gaivota fundeada nos lençóis do mar, cabecinha deitada numa rocha e as pernas enterradas no lodo; perdi-a.

Desisto de procurar, desisto de caminhar, desisto do mar que tanto amei em Luanda, desisto do circo, dos palhaços, desisto da Mutamba, dos machimbombos, desisto do hóquei nos Coqueiros… desisto de sonhar, desisto do capim e dos papagaios de papel.

E nunca vou desistir de aprender a voar…

 

 

 

(texto de ficção)

FLRF

29 de Março de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:10

Eu entalado entre a escuridão e o abismo, ao fundo da rua o mar, e a minha mão prisioneira na tempestade, trémula, cansada, eu entalado, e aos poucos a ser espremido pelo medo da noite, um candeeiro olha-me, um candeeiro ilumina-me, e a sombra é tanta que quase não dou pela sua presença.

Junto a mim um dos poucos amigos que tenho, o meu cão, o meu rafeiro, e ele sei que não me abandona, ele sempre junto aos meus tornozelos pronto se for necessário a passar-lhe os poucos dentinhos que tem, coitado, está velho, eu estou velho, eu entalado entre a escuridão e o abismo, ao fundo da rua o mar, e a minha mão prisioneira na tempestade, trémula, cansada, e o semáforo vermelho, stop, o mar tão perto de nós, e nós tão longe da maré, quando um marinheiro se suicida no pôr-do-sol, e no pôr-do-sol sorrisos do sol e lágrimas da lua.

E a sombra é tanta que quase não dou pela sua presença, enrosca-se no meu corpo polido pelo cansaço, dentro do guarda-fatos do quarto, tenho medo do espelho, medo do meu rosto quando na manhã desata a correr pelo corredor como um louco, e a enfermaria atulhada de malucos, eu lá espetado junto à janela a olhar os plátanos, e nos plátanos pássaros feios me olham, e se não houvesse janela… se não houvesse janela comiam-me como comem os insectos, ao pequeno-almoço.

Eu entalado entre a escuridão e o abismo, e sobre a secretária uma ferrugenta máquina de escrever alimenta-me a vontade de viver, oiço o batimento do seu coração, está apaixonada, está rodeada de malmequeres junto ao rio, e o rio, o rio apressadamente nos meus braços…

 

 

 

(texto de ficção)

FLRF

29 de Março de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 17:03

Alimento os teus lábios

Com a minha boca em sílabas

E no teu olhar construo um silêncio

Só meu

 

A minha mão esquecida

No interior da tua roupa

E no teu corpo

Escrevo poemas

 

Os poemas multiplicam-se na madrugada

E o teu corpo em brasa

Em chama ardente de mim

E os poemas transpiram

 

Crescem na noite

Alimento os teus lábios

Com a minha boca em sílabas

E as minhas mãos ficam cansadas

 

Órfãs dos teus cabelos

- gosto dos teus cabelos

Gosto das tuas mãos

Que pegam nas sílabas da minha boca

 

E as depositam no canteiro do meu pescoço

Junto ao mar

Sobe a maré dentro de ti

E as tuas asas abrem-se

 

E levitas em direcção ao luar…

E no teu olhar construo um silêncio

Só meu

Com as sílabas da minha boca.

 

 

FLRF

29 de Março de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 11:10

Despeço-me das horas

Ao ritmo de um relógio sem corda

Que na parede da solidão

Me olha e condena à morte

 

O meu corpo faz a travessia do fogo

E eu prisioneiro no pêndulo

À espera que os meu braços me venham salvar

Quando a maré acorda

 

E o meu corpo incha

Uma gaivota começa a comer-me

Junto ao refúgio

Onde estão enterrados os meus sonhos

 

Do meu corpo em putrefacção

Apenas ficou a minha mão

Que diz adeus

Ao relógio sem corda.

 

 

FLRF

29 de Março de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 10:03

Decididamente ninguém, ninguém gosta de mim. Decididamente nada, nada gosta de mim.

Detesto a chuva, e a chuva não de mim, e a chuva entra-me pela porta dentro sem a ter convidado, gosto do sol, e o sol não de mim, esconde-se por entre as nuvem e não aparece, gosto dos pássaros e os pássaros não de mim, cagam-me na cabeça e eu com a mão a cheirar a merda, gosto muito do meu cão e o meu cão não de mim, e quando pode ferra-me os poucos dentes que tem nos meus tornozelos, e depois, de barriga para o ar, eu sendo um parvalhão, ainda lhe vou coçar a barriguinha, não digo que gosto de dinheiro, e o dinheiro não de mim, e há muito que não o sinto na algibeira…

Decididamente ninguém, ninguém gosta de mim. Decididamente nada, nada gosta de mim, e brevemente andarei livremente pelas ruas de Lisboa, cabelo comprido, barba grande, rosto de fome, e de papelão na mão à procura do melhor sítio para dormir; e estes sim, estes gostam de mim (as ruas, o papelão e o sítio onde dormir).

Decididamente sinto-me só.

 

 

 

FLRF

29 de Março de 2011 Alijó

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 01:33

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