Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

06
Ago 11

Quando bebé caí do colo da minha mãe, noites inteiras sem dormir, possivelmente devido às palavras que começavam a acordar, e um certo dia, uma certa tarde, numa determinada cidade, e num determinado bairro, a minha mãe coitadinha, fica-se a dormir em pé, eu lanço-me dos braços dela e aterro no pavimento, apenas ouvi da boca dela Ai o meu filho!, eu cá para mim, Tenha calma mãe, está tudo bem, sou duro como os cornos dos bois, e Teimoso, diz-me ela enquanto me apanha do chão,

 

Também eu, noites e noites sem dormir, adormeci ao volante e enquanto o IP4 quis eu lá fui até que acordo já o carro se tinha estacionado juntos aos railes, e dos railes oiço a voz do aço Para onde vais rapaz?, para Bragança respondo-lhe ainda a abrir os olhos, e eles concluem Para Bragança é pela faixa de rodagem!, peço desculpa, e a porta do lado direito com os queixos inchados e pensei Talvez seja dos dentes,

 

E desde que me deixaram cair nunca mais fui o mesmo, cismava em meter os dedos nas tomadas da eletricidade, começava a construir papagaios de papel e ainda com poucas horas de voo os acidentes fatais de aviação, enrodilhavam-se nas mangueiras, e estatelavam-se na terra húmida da tarde, e tinha um boneco e eu com as manias que era estilista, sentava-me junto à minha mãe a inventar roupa para o chapelhudo, fazia o molde, cortava o tecido, e de agulha e dedal as minhas coleções primavera/verão, modelos lindíssimos,

 

Talvez alguém pense ser lindo este texto de ficção, mas o que me chateia é que tudo aconteceu e foi verdade; caí mesmo do colo da minha mãe, ela coitada, com o cansaço adormeceu em pé, e verdade verdadeira adormeci ao volante e bati nos railes, e sim, sim, tinha um boneco chamado chapelhudo e era eu que lhe fazia as roupas. E conta-me a minha mãe que eu tinha jeito para a coisa das roupas, tinha, porque agora nem pregos espeto nas oliveiras, pregos nas oliveiras é com ela, nem atiro pedras ao fumo do enxofre e quase que rachei a cabeça ao coitado do “Peleira”, a minha sorte foi acertar na máquina do enxofre…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:50

Sabes, meu amor, não existe manhã,

As flores são feias,

E a noite não tem encantos,

E não adianta escrever que te amo…

Se eu nem consigo alcançar o Pinhão,

Quanto mais, meu amor, chegar à lua onde habitas,

Três longos dias de viagem,

O pesado capacete na cabeça,

O fato que me faz comichão e alergias…

E depois os enjoos,

E a falta de cigarros,

Sabes, meu amor, também não existem pássaros,

 

O Tejo é mentira,

E Belém,

Ai Belém, meu amor, Belém morreu dentro de mim,

E olha-me de uma lápide disfarçada de cacilheiro,

 

Mas retomando à viagem até ti, meu amor,

A lua, meu amor, a lua onde habitas é linda,

E à noite peço-lhe que desça,

Devagarinho, e me entre pela janela,

Que te dispas e te deites sobre mim,

Sim meu amor, esquecemos o fato e o capacete,

E os enjoos, sim e os enjoos,

E te abraces ao meu corpo de terra húmida de Luanda,

 

Sabes, meu amor, sei que estou vivo,

Sei que estou vivo quando oiço a tua voz amarrotada na noite,

- Francisco, OLÁ!,

E olho o céu e não encontro a lua,

 

É tudo mentira, meu amor,

O céu é mentira,

O sol, meu mar, é mentira,

E sabes, meu amor, durante a noite a tua mão visita-me,

 

E nos teus lábios sinto a espuma do mar,

O orvalho misturado no cacimbo,

E meu amor, é tudo tão estranho,

Sabes, meu amor,

Muitas vezes não sei se estou em Portugal ou em Angola,

E depois sei onde estou,

Abro a mão nos silêncios do teu cabelo

E meu amor, nenhum papagaio de papel para eu brincar…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 15:57

Não sou, nunca o fui, e nunca o serei, escritor e poeta,

 

Sou um miserável que todos os dias ao acordar abre os olhos e abraça-se na sombra do quarto, olho o espelho e pergunto-me Como será hoje o dia?, ninguém me responde e enquanto me desenrolo dos lençóis entram em mim as lâmpadas acesas no teto do céu, volto a perguntar-me E hoje, como posso chegar vivo quando acordar a noite?,

 

E claro que há sempre formas simples de sobreviver, cravar um café a um amigo enquanto conversamos de política, literatura ou apenas de silêncios, ou apenas de nada, e na digestão de dois ou três cigarros um maço de pura lã virgem aprece sobre a mesa, Este é oferta da casa!,

 

E dou-me por feliz porque às onze da manhã ainda estou vivo,

 

E mais um pouquinho em mistura de pequenas manobras de sobrevivência tenho todas as condições de quando chegar à cama voltar a olhar o espelho do quarto e segredar-lhe E assim se passou o dia, consegui!,

 

Visto o pijama e pego em Lobo Antunes, despeço-me da miséria e entro na ficção, e durante uma hora esqueço a minha vida, fecho pausadamente o livro, olho-o e digo-lhe Obrigado pela companhia e por me manteres vivo!, e levanto-me,

 

Adormeço o livro sobre a secretária ao lado do cachimbo de água, cerro a porta da biblioteca para que os sons dos meus sonhos não os perturbem, vou à casa de banho e sento-me no bidé, e enquanto assassino o último cigarro da noite olho para o mar que adormece dentro da sanita, e pergunto-lhe,

 

E amanhã, Luís, como será amanhã!

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:31

O sargaço da manhã

Quando o rio entra-se-me na algibeira

Fina e cansada

Nas calças sonâmbulas e esfarrapadas

 

E do silício da madrugada

Um fio de luz poisa na minha mão

A manhã em pedacinhos de nada

E o rio que saltita nas calçadas

 

Engole barcos com dor

E no sargaço da manhã

Uma árvore despida e em lágrimas

Abraça-se a gaivotas ancoradas

 

Deitam as asas na ténue manhã dos sargaços

Engolem saliva a prestações

Cospem desejos nas ondas do mar

E diluem-se na espuma das palavras…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 10:57

Um dos meus solhos era senta-me à mesa com AL Berto, Luiz Pacheco, José Saramago e António Lobo Antunes, infelizmente os três primeiros morreram e não os conheci pessoalmente, felizmente que A. Lobo Antunes está vivo e espero que por muitos anos,

E se me fosse possível dizer alguma coisa ao António, e quantas que coisas que fico sem jeito, apenas lhe dizia Obrigado, António, por tudo e pela companhia nas noites de inferno e sem dormir e que às vezes acredito que o mundo desaba sobre mim…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 10:10

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