Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

30
Ago 11

A eterna manhã adormecida

Entre as nuvens em demandada

A manhã que se espedaça na tarde perdida

Nos dias de nada,

 

A eterna manhã adormecida

E de um cansaço de braços

A flor encardida

Suspensa nos meus braços,

 

A eterna manhã adormecida

Deitada no perfume do mar

Esquecida

Em sonhos de sonhar…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 09:42

29 de Agosto de 2011,

Fim do dia,

 

Despede-se de mim o dia, procuro sobre a mesa-de-cabeceira as sobras do silêncio, e pequenas migalhas poisam sobre o naperon da velha Arminda, uma borboleta visita-me, olha-me e adormece na minha mão, termina o dia,

 

30 de Agosto de 2011,

Início do dia,

 

Começa a terça-feira, e lá fora oiço o mar que bate na janela do quarto, e oiço e oiço e oiço, e oiço as sombras engasgadas que aos poucos descem a parede e em direção ao pavimento desparecem, e nas fendas dos velhinhos tacos de madeira esconde-se a voz do locutor da rádio Até amanhã, se deus quiser!, e se deus não quiser, o amanhã não existe, e se eu não tenho amanhã concluo que é porque deus não quer,

 

Terça-feira, início do dia, e a anoite balança no pêndulo do relógio pendurado na parede da sala, e oiço-o, oiço-o de quinze em quinze minutos martelar os quartos de horas, as meias horas e as horas, e peco a paciência, e já nem ouvi-lo quanto mais olhar-lhe os anos esquecidos quando o trouxeram para casa,

 

O mar lentamente deixa de bater na janela do quarto, transfiro a borboleta da minha mão e que dorme carinhosamente e lentamente para o naperon da velha Arminda, desenho-lhe um sorriso sobre as asas, e espero que a manhã acorde,

 

Se acordar,

 

Se deus quiser que haja manhã,

 

A borboleta suspira, e eu apago a luz do candeeiro.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:23

29
Ago 11

Eu de mentira

Um boneco construído em capim

Revestido a sonhos de Luanda

Eu de mentira sentado no jardim

 

Na mentira,

 

Eu de mentira

Em frestas de luz quando da tarde acorda o mar

Na sombra do musseque

Caminhando sem parar

 

Na mentira,

 

Eu de mentira

Um boneco construído em capim

Um boneco encaixotado num barco a vapor

Eu de mentira embrulhado em cetim

 

Na mentira,

 

Eu de mentira

Quando a noite desce suavemente sobre o rio

E nos meus braços os sargaços de ti

Miúda em cio

 

Na mentira de mim.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:43

Porque caiem as maçãs no meu quintal, uma e outra e mais outra, de manhã, à tarde e à noite, toda a noite, e oiço-as tombar no cimento, e oiço-lhes os ais e os uis, e parecem pombas quando abatidas por um caçador furtivo,

 

Newtom dir-me-ia que As maçãs caiem devido à gravidade, o doutor psiquiatra que As maçãs caiem devido à solidão e saudade, e eu, e eu que nem uma coisa nem outra, As maçãs caiem no meu quintal, primeiro porque existem macieiras, e segundo porque se suicidam, despregam-se da árvore, e pum, e a tarde evapora-se,

 

 Desistem de viver,

 

O doutor psiquiatra olha-me e de receituário na mão diz-me Com estes comprimidos e uns passeios junto ao mar, elas, elas ficam como novas e deixam de cair, Não percebo, não percebo, e pergunto-me, e pergunto-lhe Qual a semelhança entre o mar e caírem as maçãs no meu quintal,

 

Nenhuma, responde-me o doutor psiquiatra, e continua Você ainda não percebeu que sou maluco?, respondo-lhe que não, Não, não sabia, e eu, e eu que pensava ser o único maluco nesta terra,

 

Poesia, imaginação ou… tubos de LEDs?, e as maçãs caiem, os figos caiem, e as bananeiras, as bananeiras estatelam-se sobre a terra agreste do quintal, tudo em ruínas, ruinas ruinas ruinas ruinas, a minha vida retalhada em pedaços de amêndoa, e quem me está a ler, se alguém tem paciência para ler estas porcarias, pensa e grita e escreve nas paredes Este tipo ficou maluco!, fiquei e fiquei e fiquei, mas ainda me mantenho em pé, ao contrário das maçãs que constantemente caiem, constantemente caiem da noite e não me deixam dormir, pensar, viver, caminhar,

 

E porquê poesia, imaginação ou… tubos de LEDs?, por nada, porque sou maluco,

 

E porque sou maluco imagino maçãs a caírem no meu quintal, e porque sou maluco imagino que vivi perto do mar, e a verdade, não sei o que é o mar e nunca o vi, tão pouco sei ler ou escrever, e nunca vi barcos, e nunca vi aviões, e nunca vi pássaros, e a verdade, a verdade que fiquei maluco, e fiquei e fiquei e fiquei, e nunca estive em Luanda, a verdade, que no céu não existem estrelas, e a luz, a luz não existe,

 

A verdade, que caiem maçãs no meu quintal, a verdade, sim, fiquei maluco maluco e maluco, a verdade, que me olho ao espelho, e eu, e eu não lá, no espelho um corpo travestido, um homem velho e vestido de mulher, os seios extinguiram-se numa tarde junto ao Tejo, e o púbis, Qual púbis, pá?, o púbis deve andar pelas ruas desertas da minha infância, que é verdade, nunca estive em Luanda, Que ideia, Luanda!, Luanda nem existe segreda-me o doutor psiquiatra, e eu, e eu acredito, e repito, e grito…

 

Luanda nunca existiu, e as maçãs não caiem sobre o cimento doente, não e não e não, e passei-me, e farto-me deste corpo travestido sentado a olhar cacilheiros e ondas e gaivotas e putas e paneleiros e o rio e os cigarros que se engasgam na ponte 25 de abril, um carro chia, adormece, e da noite caiem maçãs no meu quintal,

 

Caiem e caiem e caiem, e Luanda nunca existiu, e que nunca estive em Lisboa, e que não sei o que é o Tejo, nunca o vi, é tudo mentira, Belém?, que Belém, pá?, nem Belém nem Calçada da Ajuda, quanto mais o Tejo…

 

Quanto mais cacilheiros.

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:03

O limite da sombra quando o mar tende para o infinito, os dias que entram pela minha janela e escondem-se junto ao rodapé, um cigarro aceso no sofrimento da dor, o limite da sombra na minha mão quando na ardósia da tarde escrevo Estou farto, cansado, desiludido, Estou farto!, escrevo quinhentas vezes, e escrevo, e escrevo Estou farto!, e no final obrigam-me a repetir o castigo, comecei em um, e dizem, e dizem-me O zero também é número, e repito, e cansado, as mãos poisadas no chão incandescente do sol de agosto, o asfalto derrete-se em mim, fico colado ao pavimento, e subo e desço, zero um dois três quatro, e eu penso Nunca, nunca vou conseguir chegar a quinhentos,

 

Cansado, desiludido, os dias extinguem-se nos furos do cinto, e cada vez mais magro, e cada vez mais desiludido, cansado, e desiludo com tudo o que me rodeia, com o sol, com as nuvens, com as flores, e escrevo Estou farto!, quinhentas vezes, mil vezes, preencho na totalidade a ardósia da tarde, a tarde mingua e desaparece, e eu, e eu aqui sentado a olhar para livros desfeitos em cadáveres, o cheiro intenso a podre das folhas enrugadas, e escrevo na ardósia da tarde Estou farto!, quinhentas vezes, mil vezes, duas mil vezes,

 

O limite da sombra quando o mar tende para o infinito, as árvores quando se deitam sobre os lábios dos relógios e de pulsos rabugentos gritam Estou farto!, cansado, desiludido com tudo, e os pássaros que poisam nos meus ombros, e pesam, e não me deixam caminhar quando sobre a mesa da cozinha um prato de sopa me espera e me diz Estás tão magro, francisco, fico calado, e um prato de sopa me espera quando o néon do teto cai sobre mim, brilham estrelas, acendem-se todas as luzes do céu, chove, começa a chover sobre o meu corpo, e gotinhas de água alicerçam-se no meu peito, o coração começa a diminuir as pulsações e de cento e vinte por minuto, aos poucos, aos pucos dou-me conta que neste preciso momento a minha pulsação é de três pulsações por minuto, ainda respiro, e deixo de ver o prato de sopa,

 

E a cozinha tomba ribanceira abaixo, e em voo retilíneo cai sobre as rochas junto ao mar, o coração salta do meu peito, e cessa de bombear a saliva da minha garganta,

 

E as gaivotas começam a comer o meu corpo em minutos de almoço.

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 16:30

Um dia vou acordar

E dar-me conta que roubaram os meus olhos

Que não tenho mãos

E que os dias são pedacinhos de papel,

 

Mortalhas semeadas no vento

Cigarros esquecidos no amanhecer

Um dia vou acordar

E o meu corpo em migalhas de nada,

 

Nos silêncios de viver,

 

Um dia vou acordar

E tudo que tinha foi roubado

Tiraram-me o mar

E a vontade de estar acordado…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:03

O fio da navalha pregado no meu pescoço

E a manhã emagrece e das horas oiço o silêncio

Das minhas mãos suspende-se um crucifixo

Que me olha impaciente,

 

Tem-me medo, e se esconde na sombra dos plátanos,

Pendura-se nos meus ombros

E olha-me

E olha-me,

 

O fio da navalha cravado nas minhas veias

E a morte espreita-me pela janela

O mar entra em mim

E o mar me leva para longe…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 10:57
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A seara dos teus cabelos

Quando se alicerça em ti o centeio

As espigas doiradas dos teus olhos

E da terra lavrada acorda a manhã,

 

E poisa o sol na tua mão

E brincam as nuvens nos teus seios

A seara dos teus cabelos

Dos teus lábios acesos,

 

Em teus lábios aos beijos,

O silêncio que te adormece

Na seara dos teus cabelos

E o dia termina em ti,

 

E a noite entra no teu peito

As estrelas alimentam-se da seara dos teus cabelos

As espigas dos teus olhos cerram-se

E da lua crescem sorrisos…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:02
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28
Ago 11

Este blog está muitas vezes em destaque no Sapo Angola, e claro que fico orgulhoso, é destacado por mérito, penso eu, e parece que penso bem, este blog nunca foi destacado por CUNHA, não senhor, nunca tive CUNHAS, e não sou dado a lambedelas, este blog é meu, continuará a ser meu, e só morrerá quando eu morrer, e foi esta a promessa que fiz a quem o desenhou, Teresa Alves).

 

Obrigado à Teresa Alves;

Obrigado ao João Sá;

 

Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:50

Te entranhas nas águas ondular

Te misturas na espuma ao anoitecer

Te perdes na areia do mar

Te cansas sem correr,

 

Te desejas caminhar

No silêncio de uma gaivota

Te entranhas no mar

Em palavras de revolta,

 

E caminhas sem parar

Te entranhas nos seus braços fingidos

Te acaricia os teus lábios de beijar

Do mar os teus desejos prometidos…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:05

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