Sou como as árvores

E quando vem o vento

Vacilo na tempestade,

Sinto os meus braços deslocarem-se na noite

E enrolam-se ao poema moribundo,

Vejo o meu corpo impresso no espelho

E de mim saem pedacinhos de lume,

Migalhas de pão

Sobre a mesa-de-cabeceira,

Sou como as árvores

E quando vem o vento,

Vacilo na tempestade,

E caio docemente sobre o chão lavrado

Flores amarelas poisam sobre o meu esqueleto

E oiço lágrimas que se desprendem de um olhar

E páginas de um livro que alguém folheia na madrugada,

Vacilo na tempestade,

E procuro os meus braços na tempestade

Mas o mar os levou

E ao mar pertencem

E do meu corpo extingue-se a saudade,

Sou como as árvores

E quando vem o vento

Vacilo na tempestade,

Flores amarelas poisam sobre o meu esqueleto

E oiço lágrimas que se desprendem de um olhar,

O vento me puxa,

E os meus braços, os meu braços perdidos no mar…

Deixei de desejar

E ser desejado,

Deixei de sonhar

E arrependo-me de ter sonhado,

Deixei de acreditar

E ter acreditado,

Deixei,

E quem vai desejar

Um esqueleto

Desengonçado?

Deixei de gostar

De todas as palavras terminadas em Ar,

Sou um esqueleto desengonçado

E deixei de acreditar

Nas palavras terminadas em ADO…

Deixei

Quando chorei

E sonhei,

De acreditar!

Espero que termine a manhã

E venha imediatamente a noite,

Porque na noite ninguém me vê

Porque na noite não vejo ninguém,

Espero que termine a manhã

E que o sol se extinga nas montanhas do nada,

Que venha a chuva à minha mão

Que se esconda a chuva na madrugada,

Espero que termine a manhã

E venha imediatamente a noite,

E que todas as lâmpadas se fundam

E que todas as estrelas se apaguem…