Querido francisco,
A tua falta imprime-se nas sombras dos cortinados, abro a janela e olho o mar, ondas e ondas e espuma, e o teu corpo ausente de mim, longe, mergulhado em lágrimas junto à maré do outro lado do universo, abraço-me e com toda a minha força imagino o teu corpo dentro de mim,
E com a minha voz grito para o mar Querido francisco, querido francisco…, espero pacientemente pelo teu regresso, horas e muitas horas, e do mar não tu, do mar as algas embrulhadas nas tardes de outono, o cheiro a incenso que arde sobre a mesinha-de-cabeceira, e nos meus lábios a saudade dos teus beijos ao acordar,
A tua falta imprime-se no meu cansaço, e cerro os olhos para me esquecer da tua ausência, e volto novamente à janela virada para o mar, e nada, não tu,
Faço-te poemas, construo textos porque sei que os vais ler,
Talvez não os leias,
Talvez os ignores,
E acordo na sombra do quarto, olho em redor e tu não estás, volto a olhar, e não tu, apenas eu sentado à tua espera,
E recordo,
Querido francisco, abraço-me e com toda a minha força imagino o teu corpo dentro de mim, um só corpo, apenas os meus lábios suspensos nas sombras dos cortinados, e recordo,
Sentado à tua espera,
E talvez não os leias,
E os ignores,
Faço-te poemas quando regresso tardíssimo das caves imundas junto ao tejo, cansado das porcarias que se alicerçam na minha cara, cansado dos sapatos que me erguem quase até ao céu, e é quando regresso a casa, cansado do loiro falso do meu cabelo,
Um abraço, um beijo,
O teu corpo mergulhado na espuma do mar quando o mar entra pela janela e esconde-se debaixo do guarda-fato, e aos poucos sinto o teu corpo nas minhas mãos,
Mergulhado em lágrimas junto à maré do outro lado do universo, sentado à tua espera, e talvez não os leias, e os ignores, mas escrevo-te todos os dias, todas as noites, os poemas que te dedico no final da noite, e talvez não os leias,
E os ignores,
Querido francisco,
A tua falta imprime-se nas sombras dos cortinados, abro a janela e olho o mar, ondas e ondas e espuma, e o teu corpo ausente de mim, longe, e não sei onde o procurar…
(texto de ficção)