Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

23
Set 11

Todas as coisas visíveis e invisíveis, a noite e o dia, o céu e a terra, todas as coisas visíveis e invisíveis me pertencem,

 

Todas,

 

O meu pai entretinha-se com os jornais atrasados que trazia da cervejaria e na esplanada uma ténue sombra sobre as cadeiras poisadas no silêncio das acácias, a empregada invisível perguntava Deseja alguma coisa?,

E eu com os braços cruzados e respondia-lhe que não sabia… Não sei!,

 

Todas,

 

O céu e a terra, os pássaros e todas as borboletas, me pertencem,

 

E eu sentado na companhia de três amigos invisíveis e o sol puxava-nos com o guindaste do fim de tarde, e junto ao tejo um marroquino vendia cachimbos de água, tapetes voadores e sandálias,

 

E nós subíamos lentamente até aos pulmões do céu,

 

Deseja alguma coisa?

 

Não sei, todas as coisas visíveis e invisíveis, a noite e o dia, o céu e a terra, todas as coisas visíveis e invisíveis me pertencem, e o meu pai acabava de descobrir no jornal que Angola já não era nossa, e a empregada invisível,

 

Nunca foi nossa,

 

E o meu pai teimava que sim e que na escola lhe tinham ensinado que Angola era nossa, minha, não sei,

 

Deseja alguma coisa?

 

E enquanto subíamos, as árvores encolhiam-se e pareciam formiguinhas abraçadas a torrões de açúcar, um dos meus amigos invisíveis enrola-se num pedacinho de nuvem e fiozinhos de luz começam a cair sobre o rio,

 

O jornal atrasado na mão,

 

Deseja alguma coisa?

 

Não, não desejo,

 

E dizia-me repetidas vezes que Angola era nossa,

 

Angola é nossa,

 

E que nunca o foi,

 

Respondia-lhe a empregada invisível dentro de um avental revestido a malmequeres e crisântemos,

 

E os malmequeres e os crisântemos deitavam-se sobre a mesa invisível, e à volta da mesa invisível quatro cadeiras invisíveis que conversavam com quatro parvos invisíveis que subiam lentamente até aos pulmões do céu,

 

E todos eles,

 

Acreditavam que Angola era nossa,

 

Angola é nossa,

 

E que nunca o foi…

 

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:06

Porque amanhã é sábado

As perdizes deitam-se na almofada da noite

E do rio que corre para o mar

Levantar-se-á uma tulipa na alvorada,

 

Um canganho é cuspido pela geringonça

E abraça-se ao chão lavrado da manhã

As horas adormecem no mostrador embaciado…

E porque amanhã é sábado,

 

As sandálias das ervas daninhas

Mergulham nas sombras de cigarros acesos,

O vento vem e traz sementes de girassol

E crescem sorrisos junto ao néon,

 

Levantar-se-á uma tulipa na alvorada

Em cada cansaço de mim

O mar que acolhe o rio…

Do mar que olho o jardim,

 

Porque amanhã é sábado

As perdizes deitam-se na almofada da noite,

E nas minhas mãos embrulhadas em papel de cetim

Um papagaio suspende-se no teto das nuvens…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:58

Hoje

Apenas uma simples palava

Poisada na minha mão…

Hoje

Não cresceram palavras em mim,

Hoje

Apenas uma simples palavra

Poisada na minha mão…

 

E o meu corpo que voa dentro de ti,

E do meu corpo se libertam andorinhas,

 

Hoje

Uma simples palavra

Poisada na minha mão,

 

Hoje

Não olhei as flores,

Hoje

Esqueci-me dos socalcos,

 

Hoje

Apenas uma simples palavra

Poisada na minha mão…

 

E o rio abraçado à lua,

 

Hoje

Só consigo escrever;

Amo-te!

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:19
tags: , ,

Setembro 2011
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3

4
5
6
7
8
9





Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

subscrever feeds
Posts mais comentados
mais sobre mim
pesquisar
 
blogs SAPO