Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

27
Set 11

Imagino que o mar é redondo,

Imagino que a lua é quadrada,

Imagino que as nuvens são de algodão

E as estrelas de goiabada,

 

Imagino que a noite é uma substância

Escondida nas mangueiras,

Imagino a minha infância

Misturada na infância dela,

Imagino-a a espetar pregos nas oliveiras

E a brincar com uma rosa amarela,

 

Imagino a manhã a acordar,

Imagino a tarde a sorrir,

Imagino a alegria do mar

Com ondas de fingir,

 

Imagino que os sonhos de sonhar

Dão a mão à lua quadrada,

 

Imagino que as nuvens são de algodão

E a vida uma roda dentada,

Imagino o meu coração

Palpitando na alvorada,

 

Imagino que os sonhos de sonhar

Dão a mão à lua quadrada,

E que no fundo do mar

Vive uma mulher apaixonada…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:42

26
Set 11

(descobri que existe uma mulher que gosta do que escrevo e a ela dedico este poema; à Sara)

 

Não me canso de brincar

Nos socalcos do douro,

E ver a amanhã a acordar

Nas finíssimas nuvens de ouro,

Não me canso de brincar

Com as pétalas da madrugada,

Não me canso de esperar…

A mulher amada,

 

Não me canso de brincar

Nos sonhos de criança,

Não, não me canso de acreditar

E ter esperança,

 

Não me canso de brincar

Com as gaivotas junto ao mar,

Não me canso e nunca me vou cansar…

De amar,

Não me canso de brincar

Nos socalcos do douro,

Não me canso de acariciar

O teu cabelo loiro,

 

Não me canso de brincar

Nas migalhas da alvorada,

Não me canso e nunca me vou cansar…

Dos lábios da mulher apaixonada.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:51

O meu corpo sofre

E sente,

O meu corpo ausente

Do abraço da noite

Quando no mar

Brinca um veleiro,

Sorri uma criança de meigo olhar…

E o vento encolhido no nevoeiro,

 

O meu corpo sofre

E sente,

O meu corpo ausente

Do abraço da noite,

O meu corpo mente

À sombra distante,

O meu corpo em pedacinhos de nada

À espera que acorde a madrugada,

 

O meu corpo sente

O teu corpo ausente,

 

Quando entras em casa cansada…

 

O meu corpo sente

O teu corpo ausente,

 

Na solidão da alvorada!

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:36

25
Set 11

Perco-me

E ninguém me consegue encontrar,

Desencontro-me das flores

Que dormem sem acordar,

 

Perco-me

Nas sombras cansadas

Que a noite tece na escuridão…

E as minhas mãos atadas

Às árvores em solidão,

 

Perco-me da madrugada

E dos silêncios ancorados,

Perco-me da Luanda amada

E dos sorrisos apaixonados,

 

Perco-me

E ninguém me consegue encontrar,

 

E eu sou o vento

Que não se cansa de soprar,

E ninguém me consegue encontrar

Neste maldito sofrimento

 

Neste inferno de olhar o mar,

Perco-me da vida

Numa rua sem saída…

E nas lágrimas de chorar!

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:05

Acorda a noite

E a solidão desce pelo meu corpo,

Estar só

E a solidão em pedacinhos

Que se penduram na janela,

Preciso de um abraço,

Abrir a janela e pedir socorro,

Ajuda…

Gritar às estrelas,

Cerrar hermeticamente a janela

E abraçar-me à sombra do meu cachimbo,

Construir desenhos na areia

Com o fumo aromático que se evapora no néon

E dos meus braços sorriem ramos de acácias,

 

A solidão dói

E magoa,

E o abraço desejado

Que não vem,

E o abraço prometido

Escondido nas pétalas de uma rosa…

 

Vermelha

Em lágrimas,

E acorda a noite

E ninguém,

E nada,

Tudo e todos ausentes,

Os pássaros,

As árvores,

Os rios e o mar…

E a lua,

E eu,

E nada…

 

Para me abraçar,

Sussurrar-me ao ouvido,

Nada, ninguém,

Nem o vento nem a chuva,

Acorda a noite

E a solidão desce pelo meu corpo,

 

E eu escondo-me debaixo de uma cadeira,

Olho a janela,

E ninguém e nada…

Que me possa abraçar!

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:11
tags: , ,

24
Set 11

Parvalhão mas eu amo-te muito,

 

Parvalhão, parvalhão, és um parvalhão, E que sou dizia-me ele quando nos sentávamo-nos à mesa do café, conversávamos sobre os altos e baixos da vida e que mais depressa se cai do que se sobe,

 

Parvalhão,

 

E concordo contigo porque a vida é como uma árvore, e que demora uma eternidade a fazer-se mulher, e vem um parvalhão de motosserra na mão e corta-a, e a mulher tomba sobre as nuvens do mar,

 

E vem o vento e tomba a árvore, e a mulher antes de cair que balança nas arcadas do abismo e os cabelos elevam-se, e escondem-se junto às amoreiras do quintal do tio Joaquim,

 

És tão parvo amor,

 

E que sou,

 

E que sobe, sobe, a manhã nos teus lábios de amêndoa e a tarde à porta de entrada dos teus seios para se deitar, a sesta mergulha nas asas de uma criança sonâmbula, e do cansaço das roseiras o vermelho dos teus olhos entalados no arco iris,

 

O pôr-do-sol acorda,

 

E que sou, sentávamo-nos à mesa do café, conversávamos sobre os altos e baixos da vida e que mais depressa se cai do que se sobe, descia as estrelas com a ajuda de uma faca e de um garfo, ambos mergulhados na saliva da loja de penhores, e as estrelas aos pouco poisadas no prato em fina porcelana virgem e importada de Sacavém, e que se cai tão depressa,

 

Parvalhão,

 

Porque as estrelas são assim mesmo, sobem e descem, e quando se escondem no ascensor que dá acesso ao paraíso nunca mais deus lhes põe a vista em cima, E que sou dizia-me ele, e as estrelas penduradas na cabeça do parvalhão, a cadeira pedia licença para se sentar, e da chávena e do pires e da colher e do açúcar e do café…, nada, apenas a despedida do mar quando ela cerrava os cortinados da noite, despia-se e mergulhava na água gélida até adormecer,

 

E vem um parvalhão de motosserra na mão e corta-a, e a mulher tomba nos finíssimos lençóis de seda, e a mulher tomba sobre as nuvens do mar, a luz extingue-se e deus aflito caminha no corredor do céu à procura das estrelas,

 

És tão parvo amor,

 

E que sou,

 

Sentado à mesa do café…

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:18

Olho-te, olho-te na claridade

Do espelho da manhã,

Olho-te, olho-te como se fosses a madrugada

Que aos poucos se ergue da minha mão,

O nosso quarto transpira sorrisos

E da cama o nevoeiro enfermo da noite

Silenciosamente amarrotado no soalho…

Olho-te e desejo-te quando descem as estrelas

E poisam no parapeito da janela,

O cortinado aos saltinhos encosta-se à parede

E eu olho-te, olho-te na claridade

Do espelho da manhã,

Olho-te, olho-te quando acaricias

O algodão doce que adormece no céu,

E uma gaivota teimosa…

Olha-nos da janela engasgada no mar,

 

Sorris…

E a gaivota lança-te um beijo,

E eu olho-te

Enquanto desenhas pássaros nos lábios da noite…

 

E espero a claridade…

Para te olhar no espelho da manhã.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:23

23
Set 11

Todas as coisas visíveis e invisíveis, a noite e o dia, o céu e a terra, todas as coisas visíveis e invisíveis me pertencem,

 

Todas,

 

O meu pai entretinha-se com os jornais atrasados que trazia da cervejaria e na esplanada uma ténue sombra sobre as cadeiras poisadas no silêncio das acácias, a empregada invisível perguntava Deseja alguma coisa?,

E eu com os braços cruzados e respondia-lhe que não sabia… Não sei!,

 

Todas,

 

O céu e a terra, os pássaros e todas as borboletas, me pertencem,

 

E eu sentado na companhia de três amigos invisíveis e o sol puxava-nos com o guindaste do fim de tarde, e junto ao tejo um marroquino vendia cachimbos de água, tapetes voadores e sandálias,

 

E nós subíamos lentamente até aos pulmões do céu,

 

Deseja alguma coisa?

 

Não sei, todas as coisas visíveis e invisíveis, a noite e o dia, o céu e a terra, todas as coisas visíveis e invisíveis me pertencem, e o meu pai acabava de descobrir no jornal que Angola já não era nossa, e a empregada invisível,

 

Nunca foi nossa,

 

E o meu pai teimava que sim e que na escola lhe tinham ensinado que Angola era nossa, minha, não sei,

 

Deseja alguma coisa?

 

E enquanto subíamos, as árvores encolhiam-se e pareciam formiguinhas abraçadas a torrões de açúcar, um dos meus amigos invisíveis enrola-se num pedacinho de nuvem e fiozinhos de luz começam a cair sobre o rio,

 

O jornal atrasado na mão,

 

Deseja alguma coisa?

 

Não, não desejo,

 

E dizia-me repetidas vezes que Angola era nossa,

 

Angola é nossa,

 

E que nunca o foi,

 

Respondia-lhe a empregada invisível dentro de um avental revestido a malmequeres e crisântemos,

 

E os malmequeres e os crisântemos deitavam-se sobre a mesa invisível, e à volta da mesa invisível quatro cadeiras invisíveis que conversavam com quatro parvos invisíveis que subiam lentamente até aos pulmões do céu,

 

E todos eles,

 

Acreditavam que Angola era nossa,

 

Angola é nossa,

 

E que nunca o foi…

 

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:06

Porque amanhã é sábado

As perdizes deitam-se na almofada da noite

E do rio que corre para o mar

Levantar-se-á uma tulipa na alvorada,

 

Um canganho é cuspido pela geringonça

E abraça-se ao chão lavrado da manhã

As horas adormecem no mostrador embaciado…

E porque amanhã é sábado,

 

As sandálias das ervas daninhas

Mergulham nas sombras de cigarros acesos,

O vento vem e traz sementes de girassol

E crescem sorrisos junto ao néon,

 

Levantar-se-á uma tulipa na alvorada

Em cada cansaço de mim

O mar que acolhe o rio…

Do mar que olho o jardim,

 

Porque amanhã é sábado

As perdizes deitam-se na almofada da noite,

E nas minhas mãos embrulhadas em papel de cetim

Um papagaio suspende-se no teto das nuvens…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:58

Hoje

Apenas uma simples palava

Poisada na minha mão…

Hoje

Não cresceram palavras em mim,

Hoje

Apenas uma simples palavra

Poisada na minha mão…

 

E o meu corpo que voa dentro de ti,

E do meu corpo se libertam andorinhas,

 

Hoje

Uma simples palavra

Poisada na minha mão,

 

Hoje

Não olhei as flores,

Hoje

Esqueci-me dos socalcos,

 

Hoje

Apenas uma simples palavra

Poisada na minha mão…

 

E o rio abraçado à lua,

 

Hoje

Só consigo escrever;

Amo-te!

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:19
tags: , ,

Setembro 2011
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3

4
5
6
7
8
9





Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

subscrever feeds
Posts mais comentados
mais sobre mim
pesquisar
 
blogs SAPO