Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

06
Out 11

A minha irmã Teresa sentava-se no sofá e esquecia-se que existia, e pela janela vinham as lágrimas das roseiras que choravam no canteiro junto à porta de entrada,

A minha irmã Teresa ancorada à almofada que a minha avó Margarida levou noites de insónia e horas de inferno agarrada à agulha do croché e a um finíssimos fio de lã enrolado nos dedos,

Batiam à porta e ela cerrava os olhos e com meia dúzia de palavras suspensas nos lábios,

- Se vens pedir-me desculpa é melhor dares meia volta e descres a calçada, e continuava com o mesmo discurso de sempre que não admitia traições e que era mulher de amar um só homem, e era sempre assim que batiam à porta,

Truz truz truz,

- Deixa-me em paz e vai-te embora,

E do lado de fora junto às roseiras que choravam o senhor Alberto e carteiro de profissão admirado com as palavras que lhe chegavam de dentro da casa seminua e caquética virada para o rio,

- Se vens pedir-me desculpa é melhor regressares e desceres a calçada e mergulhares no rio, cansei-me das tuas mentiras esfarrapadas como silêncios de árvore quando a geada lhes poisa no inverno, cansei-me do sofá que coxeia durante a noite, cansei-me das roseiras que choram e não me deixam adormecer, e cansei-me de quando bates à porta no meio da noite,

A minha irmã Teresa uma parvalhona e menina mimada,

- Sou eu menina Teresa o Alberto,

E ela numa busca rápida a todos os momentos passados nos quartos de pensão nenhum Alberto, lembrava-se do Rui e do João e do Pedro,

- Alberto qual Alberto?

Tinha saudades do Manuel e trazia junto ao seio esquerdo uma tatuagem do Carlos mas Alberto… nenhum Alberto na sua vida,

- Alberto qual Alberto?

Ela cansada do sofá e cansada da vida e cansada da almofada da avó Margarida, ela cansada do sofá que todos os dias encolhia e adormecia debaixo da mesinha onde brincava um crocodilo,

- O carteiro menina Teresa,

E o crocodilo lançava bolinhas de sabão contra as sombras do rodapé,

- Ai… desculpe,

E o crocodilo com os dentes de marfim saltitando entre as bolinhas de sabão e a minha irmã Teresa sentava-se no sofá e esquecia-se que existia, e pela janela vinham as lágrimas das roseiras que choravam no canteiro junto à porta de entrada,

- Não faz mal respondia com voz amorfa o carteiro,

Ai… desculpe mas cansei-me do sofá coxo e das fendas da parede da sala que me olham como se fossem o espelho do meu guarda-fato e quando passo por ele cerro os olhos, e quando passo por ele sinto que me acaricia nas lágrimas das roseiras que choram no canteiro junto à porta de entrada,

- A minha irmã é uma parvalhona desabafava o crocodilo antes de baixar as persianas da noite e deitar a cabecinha sobre uma almofada de penas de avestruz,

- Não faz mal menina Teresa, não faz mal,

E cansei-me da vida e cansei-me do sofá coxo e cansei-me do crocodilo e cansei-me,

- Cansei-me de mim,

E cansei-me das palavras que saem das minhas mãos,

A minha irmã Teresa levanta-se e ouve-se um estalinho que saltava da garganta do sofá e abre a porta e o Alberto diz-lhe,

- Tenho carta para si menina Teresa,

Ela agacha-se e com um lenço de seda limpa as lágrimas do rosto das roseiras que viviam no canteiro junto à porta de entrada,

E cansei-me das palavras que saem das minhas mãos,

- Cansada das tuas mentiras esfarrapadas,

Cansei-me de mim e do crocodilo com dentes de marfim.

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:24

Porquê chorar

Se nos meus olhos habitam sargaços,

E nas minhas mãos as ondas do mar

À procura dos teus braços,

 

Porquê sofrer

Se as estrelas são construídas de papel,

 

Porquê chorar

Se nos meus lábios adormecem beijos de mel,

Porquê as ondas do mar

Que não se cansam de procurar

 

Os teus braços no amanhecer,

 

Porquê chorar

Se nos meus olhos habitam sargaços,

E dos silêncios de amar…

O desejo dos teus abraços,

 

Porquê sofrer

Se as estrelas são construídas de papel,

 

Porquê chorar

Nas pétalas de uma flor,

Porquê escrever

Versos na sombra de um cordel,

Versos de amor…

Em folhas de papel,

 

Porquê chorar,

Porquê sofrer,

 

Se nos meus sonhos de sonhar

Existe um rio a correr

 

Que se abraça ao mar.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:15

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