(desenho de Luís Fontinha/MiLove)
Não passas de um rio confuso
Olho-te
E sentado na rocha da noite enterro as minhas palavras nas tuas águas
Olho-te e não passas de um rio confuso
Frio
Ausente e que corres para o mar
Olho-te e peço-te que me leves até ao mar
Peço-te
Olho-te e não me ouves
Porque és um rio confuso
E curvas e curvas e curvas às voltas dos socalcos
E frio
E não consigo alcançar-te debaixo das nuvens
E tu prisioneiro a um cordel
E baloiças e baloiças no céu
Olho-te
E não me ouves
Olho-te e desistes de mim
E eu
Olho-te e não me ouves
E eu peço-te e não me levas a ver o mar
Sabes? Nunca abracei o mar…
Consegues desenhar na minha mão o mar?
Claro que não… porque não passas de um rio confuso
E frio
E que não me ouves
E eu
E eu peço-te que me mostres o mar
Como fazes quando me desenhas na testa
O pôr-do-sol…
Sei que hoje é sábado
Porque vi-te ontem poisado sobre a estante dos livros
(Nunca Mais é Sábado – Antologia de Poesia Moçambicana)
E como foi ontem que te vi Hoje certamente é sábado
E sabes
Não me interessa o dia da semana do mês ou do ano
Nem tão pouco que não tenho trabalho
Sei que hoje é sábado
E o meu desejo é simples
Que deixes de ter dores e que cessem as lágrimas do teu rosto
Sei que hoje é sábado
E sabes
Com dinheiro ou sem dinheiro vai-se vivendo
E ninguém morre por ser miserável
E ninguém morre porque hoje é sábado
Porque amanhã certamente voltará a ser sábado
E será sempre sábado enquanto ficares poisado na estante dos livros
Até que um dia eu me chateie e te queime numa fogueira…
E terminarão os sábados e terminarão as tuas dores e cessarão as tuas lágrimas
Sei que hoje é sábado
Porque vi-te ontem poisado sobre a estante dos livros
(Nunca Mais é Sábado – Antologia de Poesia Moçambicana)
E como foi ontem que te vi Hoje certamente é sábado
E sim
Hoje é sábado
Hoje é sábado porque não ouvi os homens do lixo…
Hoje é sábado
E sim
Hoje é sábado porque estavas ontem sobre a estante dos livros
E olhavas-me
E olhavas-me
E nem me avisaste que hoje era sábado… seu maroto.
Nem sei como começar, Pelo princípio Rapaz pelo princípio, então é assim e nem sei como devo tratar-te, deixa lá o tratamento Rapaz o tratamento não importa o importante é o que tu tens para me dizer, e tanta coisa que tenho, então começa, meu deus ou simplesmente deus ou amigo?, isso não importa, está bem Meu deus às vezes fico sem perceber a razão da tua existência, Como assim Rapaz?, Não sei… é tudo tão estranho…, continua, quando penso fico com a sensação que existes apenas para te divertires à nossa custa, Estás a ser injusto Francisco Não é verdade o que afirmas, está bem Desculpa, mas é tudo tão estranho, Estranho?, Sim estranho Repara Desculpe Repare quando penso em si parece que desde que nasci nunca quis saber de mim Nunca e que nunca está ao meu lado Nunca e que eu não sei explicar mas é tudo tão estranho meu amigo Tão estranho e Desculpe-me mas parece que nunca quis saber de mim.
Muito injusto Francisco Muito injusto E quando estiveste a morrer quando eras bebé quem julgas que te segurou na mão e não deixou que vacilasses, Porquê Porque não me deixaste morrer?, Porque Rapaz a minha função não é salvar nem matar A minha função é segurar na mão de quem sofre e acompanhá-la, Só isso? E achas pouco?, Parece-me pouco!
Às vezes acredito que está sentado num trono de oiro a olhar-nos A divertir-se à nossa custa e a contar as estrelas do céu, E voltando à nossa conversa Quem pensas que esteve ao teu lado quando mais precisaste E já sei que me vais responder, Os meus pais, E só eles?, que eu saiba Só, E eu? Acreditas que nunca estive ao teu lado?, Sim acredito, Mas não é verdade Sempre estive ao teu lado Sempre, É tudo tão estranho… meu Amigo.
Parece-me que a missão dos seres vivos é continuarem a vida para que você sentado num trono de oiro possa olhar-nos e divertir-se à nossa custa e a contar as estrelas do céu, porque se não for assim qual é o sentido de Nascer Crescer Morrer?
Nem sei como começar, Pelo princípio Rapaz pelo princípio, então é assim e nem sei como devo tratar-te, deixa lá o tratamento Rapaz o tratamento não importa o importante é o que tens para me dizer, e tanta coisa que tenho para lhe dize que cruzo os braços e finjo que não acredito em si…
(texto de ficção)
Acordo e olho-me ao espelho da manhã
E pergunto-me
Pergunto-me – Porquê?
Não serei eu também filho de deus?
Ou deus é pai de uns
E padrasto de outros…
Acordo e olho-me ao espelho da manhã
E pergunto-me
“ (Na sequência da sua inscrição para emprego, informamos que ainda não nos foi possível satisfazer o seu pedido de emprego. Se continuar interessado, queira devolver-nos este postal devidamente preenchido, no prazo de 10 dias a contar da data do correio. Se não responder procedemos à anulação da sua inscrição.)”
E é para isto que serve o Centro de Emprego?
Enviarem-me um postal de X em X meses…
Se estou interessado em trabalhar
E não foi para isso que me inscrevi?
Acordo e olho-me ao espelho da manhã
E pergunto-me
Pergunto-me – Porquê?
Pergunto-me porque o senhor do Centro de Emprego
Loirinho…
Apontou o meu nome na pasta das reuniões da Barragem Foz-Tua…
Apontou
Apontou
E de X em X meses apenas subscritos RSF
Está interessado em trabalhar?
Claro que sim seus parvalhões…
Porque se não estivesse não me inscrevia
E apontou
Acordo e olho-me ao espelho da manhã
E pergunto-me
Pergunto-me – Porquê?
E é para isto que serve o Centro de Emprego?
Apontar apontar apontar e enviarem-me subscritos RSF de X em X meses…