Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

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Dez 11

 

Dogma House

Leeuwarden, Netherlands

 

Um dia perceberás que esta casa não me faz feliz, que o dinheiro também não me faz feliz, um dia, um dia perceberás,

- Porquê Frutuoso?,

E tenho Insónias no casebre na montanha junto à ribeira como as terei certamente nesta casa, e um dia, um dia perceberás que cresci assim,

- Assim Miserável?,

Miserável dizes-me tu quando vem a noite e o silêncio ausenta-se de mim e não há dinheiro que chegue nem esta casa para trazerem-me de volta o barulho das palavras contra a mesa-de-cabeceira, ou quando abro a janela do casebre e ao longe vejo as nuvens docemente e sem pressa na minha direção, e ao longe o acenar de um petroleiro que desce o tejo até às profundezas da noite, a minha garganta abre-se e sinto o cheiro do inverno a degolar-me antes de adormecer, Percebes?

- Não Frutuoso Não percebo,

Um dia perceberás que esta casa não me faz feliz, que o dinheiro também não me faz feliz, um dia, um dia perceberás,

Que cresci habituado a meia dúzia de moedas na algibeira e com a cabeça recheada de sonhos, e com a cabeça sempre suspensa nas árvores quando caminho,

- Sim Frutuoso Quando caminhas…,

Quando caminho desesperadamente só e sobre o meu peito escrevem-se as lágrimas da solidão, e o sorriso das mangueiras não me deixam adormecer, e o meu triciclo às voltas e às voltas e às voltas na sombra das mangueiras,

- Porquê Frutuoso?,

E o meu quintal começa a inchar e ergue-se em direção ao sol, e chove, descem piedosamente finíssimas gotas de suor de um corpo mergulhado em desejo, o algodão doce que um cigano tenta impingir a miúdos distraídos evapora-se entre as sandálias do vagabundo e os anéis de um miserável,

- Um daqueles peneirentos que acredita que ter dinheiro é ter tudo?,

Acreditar não, É a verdade e tu sabes isso Um dia perceberás que esta casa não me faz feliz, que o dinheiro também não me faz feliz, um dia, um dia perceberás,

- E o que te faz feliz?,

Só o saberei depois de me explicarem o que é a felicidade, quando caminho desesperadamente só, às voltas na sombra das mangueiras e o cigano às apalpadelas nas sandálias do vagabundo quando percebe que o peneirento lambe o algodão que sobejou junto aos anéis,

- Não Frutuoso Não percebo,

O miúdo distraído choraminga ao imaginar o petroleiro que desce o tejo até às profundezas da noite, a garganta do miserável abre-se e o cheiro do inverno a degolar insónias antes de adormecer, Percebes?

- Não Frutuoso Não percebo,

Nem eu.

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:24

 

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:05

 

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 17:32

Há um barco estacionado no infinito

Pacientemente à minha espera

Há um barco com asas

E sorriso nos lábios para me levar

 

Há um barco zarolho

E com os braços a sangrar

Desejos nas paredes de vidro

Impaciente para me levar

 

Há um barco estacionado no infinito

Com âncoras de madeira

E pedras preciosas nos dentes

Um barco pacientemente à minha espera

 

Há um barco mendigo

Sentado à porta da igreja

Um barco para me levar

Até aos confins do invisível

 

Há um barco com asas

E sorriso nos lábios para me levar

 

Um barco fantasma

Doido nos corredores da enfermaria

Que passeia e passeia e passeia

Num cubículo de miséria

publicado por Francisco Luís Fontinha às 14:03
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59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 13:20

Dezembro 2011
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