Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

23
Jan 12

Há coisas que nunca devem ser feitas na vida,

Não me refiro à noite em que me passei da cabeça e queimei a grande parte dos meus desenhos e textos e poemas numa lareira do Bairro do Hospital quando tinha vinte e poucos anos e mais tarde percebi que Nikolai Gógol tinha feito o mesmo com “Almas mortas”,

Mas refiro-me a uma carta de amor E já sinto nas vossas cabecinhas a pergunta pertinente Porquê uma carta de amor?,

Porque numa noite de copos na Ajuda onde seis marialvas bebiam e comiam, incluindo eu, um dos presentes, bom rapaz e muito honesto e muito simples e coitado…  que carregava nos ombros uma história de abandono por parte da mãe e um pai todos os dias embriagado com uma ninhada de irmãos, e de instrução quase nenhuma porque abandonou a primária nos primeiros anos para ganhar para a casa

- Porquê uma carta de amor?,

Para ganhar para a casa as letras para ele pareciam os carris da linha férrea Pinhão-Régua em assobios dentro dos socalcos do Douro, e com ele guardava religiosamente uma carta da namorada que tinha chegado nessa tarde, e pensava ele que dos cinco eu era o que tinha mais juízo, e juro que quando me olhava ao espelho acreditava ser um menino de igreja que depois da solene deixou de frequentar, não incluindo as faltas à catequese da Benigna, mas adiante, pede-me

- Podes ler-me esta carta se fazes favor E eu cá para mim Já te lixaste,

Pede-me e já a carta poisava nos seios da minha mão, começo silenciosamente a despi-la e aos poucos pela janela do envelope começam a acordar corações desenhados a marcador encarnado e a palavra Amo-te a todo o comprimento do lençol e milhões de beijos,

- Na Ajuda onde seis marialvas bebiam e comiam,

E amor eterno até que a morte Até que a morte nos separe,

- Então Fontinha o que diz?,

Respondo-lhe que era melhor ele não saber, Porque eu precisava de tempo para inventar uma estória, e fazendo o papel de leitor de uma carta de amor disse-lhe os maiores disparates incluindo o fim do namoro e ao cair do pano um par de cornos, e claro que nada daquilo existia na carta, mas ele acreditou,

- Não chores pá Gajas há muitas Dizia-lhe um dos marialvas,

E chorava e chorava e chorava,

E foi muito difícil convencê-lo que tudo não passava de uma brincadeira de cinco gajos que bebiam e comiam… e estavam fartos das noites da Ajuda,

- Então Fontinha o que diz?,

Que há coisas que nunca devem ser feitas na vida, uma delas, gozar com os sentimentos dos outros…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:31
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E que pegasses na minha mão e me levasses a ver o mar e com os teus lábios escrevesses nos meus lábios

- Amo-te e estou apaixonada por ti,

Escrevesses nos meus lábios o encanto da noite quando todas as luzes dormem, quando todos os barcos sonham, quando todos os pássaros voam,

E era tudo o que eu queria ouvir de ti, Hoje.

 

23/01/2012

Francisco

publicado por Francisco Luís Fontinha às 01:11

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