Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

29
Jan 12

 

59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:55

 

59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:48

O poema acorda pela manhã sem perceber que antes de acordar foi destruído pelo senhor Todo Jorge que durante a sesta entrou dentro da cabeça do escritor,

- O poema é uma merda tal como a minha vida Lamenta-se o escritor enquanto sentado sobre o xisto da tarde, os cigarros evaporam-se entre os lençóis invisíveis que escondem o desejo e o desejo é uma farsa embrulhada em pedacinhos de mangueira,

O poema destrói-me por dentro e por fora As palavras do poeta quando olha o rio e acaba de morrer antes de chegar ao mar, os barcos de Luanda também morreram e os machimbombos sinto-os na algibeira do avô Domingos antes de regressar a casa,

-O negro dos meus quadros

A manhã que se dissipa sobre a Bedford amarela poisada junto ao portão de entrada,

- A noite entra nos meus quadros como se fosse uma tarde em Belém solitariamente sentado numa esplanada a olhar o rio e sempre à espera que um paquete vindo do outro lado da rua me levasse, peço um café e uma bola de Berlim, como a bola e sinto a chávena mover-se até desaparecer,

Oiço o senhor Todo Jorge dentro da minha cabeça, oiço a morte de mão dada com deus, oiço os pássaros poisados na janela da claraboia sem que do relógio de pulso venha até mim a claridade da tarde, oiço-te e amo-te,

O poema,

O teu corpo nas minhas mãos antes de eu tombar e evaporar-me, o teu corpo embrulhado no loiro cabelo da manhã e tu,

- Bom dia amor,

E eu Bom dia amor,

E o poema,

- O poema nas mãos do senhor Todo Jorge,

E o poema precisa de mim e eu preciso do poema,

- Só sou poema porque tu me escreves enquanto dormes,

E se eu deixar de te escrever? E se eu assassinar as tuas palavras e deita-las na algibeira do avô Domingos juntamente com os machimbombos?

(estou farto deste texto, estou farto destas palavras)

- Morrem os machimbombos?

E das ruas de Luanda, e das ruas de Luanda deus sentado numa cadeira de praia junto à baía e finalmente percebo que não gosta de mim, e finalmente percebo que nunca gostou de mim, porque se gostasse

- O poema nas mãos do senhor Todo Jorge,

Mas sei que não gosta, as manhãs de inverno deitado no chão sem cama, sem nada, os vidros todos estilhaçados, a fome entrava pela porta de entrada e saia pela janela, eu vinha à varanda,

- Porquê mãe,

Amo-te sussurra-me o poema, amo-te quando te escrevo Respondo-lhe, amo-te nas tardes de verão junto ao tejo e tu olhas-me como se eu fosse uma candeia acesa na noite solitária de dezembro, e recordo-me que comecei a odiar o natal quando em regresso de Carvalhais o pai natal desprezou-me, visitou todas as crianças do bairro do hospital,

- O pai natal passou em Carvalhais, E eu perguntava-me Como este filho da puta sabe se estou em Carvalhais ou em Alijó, e não sabia, e nunca soube,

Tenho medo mãe,

E eu amo-te e eu sempre te amei, Porquê pai natal?

O poema acorda pela manhã sem perceber que antes de acordar foi destruído pelo senhor Todo Jorge que durante a sesta entrou dentro da cabeça do escritor,

O escritor ama-a mas será que ela está disponível para amar o escritor? Pergunto-me todas as noites antes de adormecer, e não precisas de fingir poema, o senhor Todo Jorge recordar-me-á todas as rimas, todas as dores, todos os sofrimentos,

- Morrem os machimbombos?

E morreram os machimbombos e morreram todos os barcos de Luanda, e hoje, e hoje apenas o teu sorriso plantado na minha secretária que me olha e me recorda,

- Eu amo-te,

E eu percebi que me amavas quando te deste conta que eu não passava de um miserável, entalado ente o setembro de Luanda e o inverno de Alijó,

- Tenho medo mãe,

Do mar do Mussulo.

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 02:49

28
Jan 12

 

84,1 x 59,4 – Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:14

Amar uma pedra

Que da poeira se constrói a noite

Não uma pedra qualquer

Não uma noite igual a tantas outras noites

Eu só

Amar uma pedra

Onde vão escrever as minhas palavras

Numa noite sem estrelas

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:59
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84,1 x 59,4 – Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:09
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Todas as viagens têm um fim, partimos de um ponto A para chegarmos a um ponto B, mas quando percebemos que o ponto B não existe, nada a fazer, porque só um louco continua a caminhar para um destino inexistente.

E ainda não estou louco, acredito eu.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 01:10

28
Jan 12

 

59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:26
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Desceste as escadas e atravessaste a porta da madrugada, não corri atrás de ti, adormeci junto à janela sem olhar para o rio, e quando acordei procurei o teu perfume na saliva da noite, e a noite tinha desaparecido, e tudo desapareceu…

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:00

Desliga-se o meu corpo

Das luzes da noite

Cessam todas as palavras suspensas em mim

Quando à janela do meu olhar sorri a tempestade

O mar jamais voltará a ancorar nos meus braços

E todos os rios desistiram de correr para o mar

E todos os mares morreram dentro de um sonho

Desliga-se o meu corpo

Das luzes da noite

E caiem pedacinhos de solidão

Do teto do meu quarto

E percebo que estou só

 

E percebo que a vida deixou de sorrir

E percebo que dentro de mim apenas silêncios

À beira de um cais

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:14
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