Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

05
Mai 12

Deixei de perceber

as manhãs de primavera

deixei de olhar as plantas

e os pássaros de meu jardim,

 

deixei de escrever

palavras nas paredes do meu quarto,

cerrei a janela,

a porta,

 

e destruí a lâmpada de halogéneo

suspensa no tecto da insónia.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 10:48

04
Mai 12

Conheci um diário com o coração partido, pequeníssima fenda, mas para um coração dois milímetros é gravíssimo, desastroso,

Ouvia-lhe o ruído das engrenagens junto à fechadura, ouvia-lhe o tilintar de suspiros na tempestade da tarde, ouvia-lhe

 

as palavras derramadas no papel de parede, desenhos abstractos misturados com pedacinhos de poeira, e fumo de cigarro que embaciavam as lentes dos óculos do diário com o coração partido,

 

Hoje acordei cedo, abri a janela e a madrugada tinha desaparecido, evaporou-se no interior da alvorada antes da iluminação pública cerrar-se hermeticamente na chávena de café com leite, as torradas sonâmbulas dentro da minha boca recusaram-se à destruição maciça por parte dos meus dentes e o comprimido para deixar de fumar entrou garganta abaixo e possivelmente em sorrisos parvos, e possivelmente, sentou-se junto ao mar,

 

dois milímetros de uma janela no coração do meu diário, 4 de Maio de 2012, sete horas e trinta minutos,

 

Chove torrencialmente no meu quintal, um casal de melros a todo o custo protege as crias que adormecem no ninho pendurado na cerejeira sobre a casota do meu cão, pais e filhos estão felizes e o meu cão que detesta chuva está melancólico, triste, ausente, chove torrencialmente no meu quintal e pergunto-me ao olhar a janela de dois milímetros no meu coração se amanhã é sexta-feira ou quinta-feira ou domingo, é que com tanta chuva deixei de perceber os dias, as horas, os minutos e os segundos,

 

dois milímetros de uma janela no meu coração sem vista para o mar, chove torrencialmente no meu diário e lá fora, e lá fora o coração partido aos pulos como se fosse um pugilista ou um canguru nas margens de um qualquer rio encalhado na Austrália, talvez no Tua, talvez no Douro, talvez no jardim onde brincam plátanos e barcos de papel, talvez na minha mão

 

Conto os segundos, e oiço através da pequeníssima ranhura do coração do meu diário que hoje é sexta-feira, e se hoje é sexta-feira amanhã é sábado, dia de Antologia de Poesia Moçambicana, finalmente, finalmente as palavras do meu diário a boiarem dentro da chávena de café com leite, finalmente posso terminar o dia porque hoje, porque hoje recuso-me a escrever mais palavras nas suas páginas, nem que o coração me implore,

 

nunca mais vi o mar, e junto à fechadura o tilintar de suspiros na tempestade da tarde, ouvia-lhes as sílabas assassinas da noite antes de chegar a noite, ouvia-lhes as vogais embriagadas das estrelas antes de a noite ser noite e muito antes de encerrar o meu diário, muitos antes de saber o significado de mar,

 

Nem que o coração me implore.

 

(texto de ficção não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 16:10

O que é o amor?

Nuvem

pássaro

avião

uma gaivota sem asas?

Uma pedra sem coração

ou uma mão?

Não

 

será o amor

uma flor

e uma flor

o desejo do amor?

 

E uma pedra?

Ama

é amada

desejada

ou simplesmente contemplada...

 

(O que é o amor?

Nuvem

pássaro

avião

uma gaivota sem asas?

Uma pedra sem coração

ou uma mão?

Não)

 

o limite do amor de X é infinitamente grande

quando o X tende para o desejo.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 10:57
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03
Mai 12

Conheci uma mulher que dançava em cima de uma mesa,

- Olho o cadáver do cigarro prisioneiro nos pergaminhos das acácias da tarde, aos poucos uma nuvem cinzenta em pequeníssimos voos desaparece na fotografia onde me escondo junto ao Tejo, e percebo

E percebo que a mulher que dançava sobre a mesa está apaixonada pela fotografia onde me escondo, e que em todas as palavras que escrevi existe uma palavra invisível que só a mulher da fotografia consegue ler, que só eu consigo ler, SOLIDÃO,

- SOLIDÃO com feijão, SOLIDÃO com pão, SOLIDÃO de cabidela porque Não?

Peço ao cadáver do meu último cigarro que tenha paciência com o meu desespero, e que não faça mal à fotografia onde me escondo e aparece a mulher que dançava sobre a mesa, lembro-me como se fosse hoje, lembro-me de ver os cigarros embalsamados no cemitério de um bar em Alcântara, lembro-me de olhar para as nuvens suspensas no tecto e o tecto em pedacinhos de lã desaparecia em direcção ao rio, lembro-me da mulher vestida de negro a dançar em cima de uma mesa envelhecida e que de tempos a tempos, que em cadências malignas, rangia em desejos de orgasmo com sabor a Vodka,

- Lembro-me da SOLIDÃO dentro de um copo com três pedras de gelo, e desde então, tudo parece dormir em cima da mesa de madeira, restos de saliva pertencentes aos lábios da mulher vestida de negro aparecem e desaparecem no céu, depois de apagar a luz do quarto sem acesso ao telhado, lembro-me de sonhar com o acesso ao telhado,

Eu, a SOLIDÃO e a Vodka, os três em cima do telhado e três pedras de gelo, e lá de cima pintávamos os passos da mulher vestida de negro a dançar sobre a mesa de madeira, eu escrevia nas nádegas do silêncio os sussurros da mulher vestida de negro, a SOLIDÃO acariciava as mamas da Vodka com três pedras de gelos junto ao púbis, e os cigarros morriam

- É hoje,

Deus queira que seja hoje.

 

(texto de ficção não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:07

Serei capaz

de atravessar a rua

sem olhar para trás?

 

Diz-me querida lua...

publicado por Francisco Luís Fontinha às 18:32
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publicado por Francisco Luís Fontinha às 17:43

Precisa-se de inspiração. Boa apresentação, disponível 24 horas por dia.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 10:22

02
Mai 12

E o navio se esconde

e o navio se abraça,

 

e o navio sem nome

procura outro navio ou barcaça,

 

e o navio com fome

na cidade da desgraça

sem nome

sem graça.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 11:43

01
Mai 12

Limito-me a quatro paredes

de ardósia

e ao cheiro do mar,

 

limito-me às palavras de argila

semeadas nas tardes imaginárias

sem mendicidade

sem saudade

na cidade,

 

Limito-me a quatro paredes

de ardósia

e ao cheiro do mar,

 

sentado

não sabendo

que sendo amado

vou lendo...

um livro cansado,

 

ao acordar,

 

e ao cheiro do mar,

 

limito-me sofrendo não sofrer

sem perceber que a noite é como a morte

sem sorte

dentro de um corredor profundo

o mundo

ao adormecer.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 13:00

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