Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

14
Out 12

As lágrimas das árvores

brincam no silêncio da tarde sem nome

na penumbra viagem do vento

acariciam-se os sorrisos das pedras

nos lábios do poema

fingindo orgasmos abstractos

que uivam dentro do cubo de vidro

e o homem com o chapéu construído de sonhos

leva na algibeira a moeda finíssima

para atravessar o rio da morte

quando chovem os teus cabelos

sobre a eira de Carvalhais,

 

oiço o sino da igreja

a enrolar-se nos pinheiros de papel

colados no muro da insónia

as palavras

as palavras dos pássaros voadores,

 

dentro do céu

as escadas que me transportam para o sótão de sombras

onde o candeeiro a petróleo

dorme vagarosamente no tecto da aldeia,

 

e cessam as sílabas

de todas as portas e de todas as janelas

que fervilham antes de cair a noite

em desejo.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:57

13
Out 12

As manhãs eram de líquido cambaleando dentro da noite

no vidro do cansaço

o dardo das tuas palavras contra o meu peito

a singela e triste árvore dos sonhos

na proa de um paquete sujo e nu

obeso como as rochas aprisionadas no tecto das coxas tuas lua de cor,

 

amanhã vou sentar-me sobre as sombras húmidas que os ponteiros do relógio

constroem nas asas de um moinho de vento,

 

cai a chuva imaginada pela boca

a tua boca em gritos herméticos

a tua boca nas carícias dos lábios perpendiculares ao beijo

da aranha de vinte e cinco patas,

 

(amanhã vou sentar-me sobre as sombras húmidas que os ponteiros do relógio

constroem nas asas de um moinho de vento),

 

e o círculo do desejo

em movimento circular e uniforme...

em abraços

de aço

os barcos e os paquetes

quando o púbis das sílabas

dorme sobre o mar

e as manhãs solidificam.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:30

O mar a enrolar sorrisos

nas mortalhas dos lábios adormecidos

cansados,

 

às vezes

esquecidos,

 

e nos silêncios perdidos

caminha a noite sem destino

porque nas mãos de um menino

vive e cresce a madrugada,

 

cansadas

às vezes,

 

as equações diferenciais

suspensas no desejo das matrizes compostas

que o dia constrói

e a tarde alimenta,

 

o mar

e os cigarros em migalhas

antes de fumados,

 

o mar a enrolar sorrisos

nas mortalhas dos lábios adormecidos

cansados,

 

cansados

às vezes,

às vezes cansadas,

 

as vozes dormentes da Primavera.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:31

12
Out 12

A lua

tua

minha apaixonada lua

nua

 

a lua dos silêncios que habita nas profundezas da tua dor

despede-se a noite

com beijos curvilíneos

ou não

as ardósias das esplanadas junto ao rio

 

o sol incandescente alimenta a tua voz cintilante

apaixonada

lua

a tua

janela acorrentada às luzes fictícias do orvalho

nua às vezes habilmente só

 

e tão bela

 

connosco o mar é enorme

enormemente infinito

o amor às palavras

com as tuas palavras

nua

a lua

tua

dentro do poema adormecido.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:01

Pela pequeníssima fissura do meu peito

entra sorrateiramente o sol

e os pássaros da madrugada,

 

oiço-lhes os uivos rangidos da geada

caindo a noite sobre os cobertores da insónia

deixo de sonhar

e começo a ver desenfreadamente os soluços das palavras

em constante borbulhar de solidão

que os beijos constroem sobre as nuvens do mar,

 

descem dos teus doces lábios de desejo

as cancelas da dor embrulhadas em papel de incenso

e mirra

oiro

na mão vazia de um barco clandestino

moribundo

e oiro

às vezes quando do cansaço acordam os gritos dos homens embalsamados,

 

os meninos

deles

coitados

à janela do ciume.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:54

11
Out 12

Vivo numa casa assombrada

com uma cama cansada

vivo numa casa transformada pelos verbos difíceis de conjugar

onde as flores de amar

dormem docemente no centro da madrugada

 

vivo numa casa com uma eira despenteada

uma casa sem janelas

uma casa sem portas

sem telhado

uma casa desgovernada

cansada

assombrada

nos telegramas sem resposta que a noite envia para o meu leito

o rio não passeia na minha rua

e as mulheres que vendem palavras em quilogramas disfarçados de migalhas

chamam as gaivotas poisadas no oceano

que saboreiam a fome da manhã

 

a cidade extingue-se no pensamento das cigarras

e as formigas

coitadas

à espera das metralhadoras apontadas

ao pôr-do-sol

(enquanto existe pôr-do-sol e é grátis)

com a ordem inventada de fuzilamento de todos os livros

e de todos os desenhos

nas ruas enfeitadas com lágrimas de borboleta

 

hoje descobri a beleza da saudade

e brinquei nas esplanadas de Belém

não vi o mar

porque cerrei os olhos

não me apetecia olhar os barcos

 

porque na minha casa assombrada

vive a madrugada

brincam as flores da extinta Primavera

bebericando o pólen de amêndoa das sílabas abandonadas

pelos relógios da inocência.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:21

10
Out 12

Posso ser o sabonete que voa sobre a tua pele cansada

meu querido amor suspenso na madrugada

do silêncio o teu corpo emagrece lentamente

como as pálpebras das árvores no Outono

posso ser a caneta desgovernada

com que escreves as palavras que vivem nos meus olhos

os verdes

os teus

os braços encardidos da rua que dorme na cidade

ou as janelas com vidros de cetim

e estrelas brilhantes

o céu onde poisa o teu peito cintilante

 

posso ser as arcadas escurecidas do templo em ruínas

as músicas que recusas ouvir

ou simplesmente os livros

posso ser os livros que nunca irás escrever

(por falta de tempo

porque não tens vontade)

quando pensas em mim

vagueando pelo corredor da casa sem velas para navegar

 

sem rumo

ou cais para aportar

 

posso ser meu querido amor

o banco onde te sentas no final do dia

as palavras

semeadas nas nuvens do desejo

 

sem rumo

ou cais para aportar

 

a mulher simples enrolada na clandestinidade da maré

quando o mar entra na algibeira

 

posso ser meu querido amor

os poemas que me escreves

sem nexo

sem sentido

simplesmente porcarias

com asas de pétala

e sorrisos de sílaba abandonada

em pequeníssimos movimentos de vento

 

se quiseres... posso ser o beijo disfarçado de sol

sem rumo

ou cais para aportar

a mulher simples enrolada na clandestinidade da maré

quando o mar entra na algibeira

quando o mar deixa de sonhar.

 

(A. Alexandra – Lisboa)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:54
tags: , ,

09
Out 12

Húmus meu cansaço

alegremente apaixonado

das árvores com braços de chocolate

a mão madrugada em flor

o cheiro

entre lábios e beijos da cidade do sofrimento,

 

absorvia-se a noite nos cigarros inventados

por um louco à janela do poema

vem do mar a claridade húmida das palavras

deitadas sobre os lençóis de linho

coitadas

as palavras

sem madrugada

sem carinho,

 

escrevia e deixou de escrever

nas paredes da inocência

brincava alegremente com os ossos de papel

a que chamavam esqueleto de livros

duzentas e seis páginas indesejadas pela boca doente

dos homens que lutavam contra a ditadura do aço inoxidável,

 

a garganta da morte mergulhava nas pequeníssimas gotículas de sémen

que das estrelas do sonho

acordava a aldeia encalhada no cais da solidão

e a janela do poema

partilha as flores que a terra alimentou

com cinco palavras ilegíveis.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:01
tags: , ,

Numa tela vazia

nasce a noite vestida de azul

descem do céu os anzóis clandestinos do sorriso

 

numa tela vazia

vou construindo a minha vida de nada

e no rio cansado que dorme à minha porta

brincam as sombras semeadas pela tua mão perfeitamente cintilante

que a noite vestida de azul ilumina

e transforma em corpo de mulher

 

azul

perfeitamente cintilante

a noite onde escreves os gritos de revolta

na areia fina e escura

o meu nome alicerça-se nos silêncios de Angola

azul

a noite

fina e escura

em corpo de mulher

numa tela vazia

sem cor

os teus olhos.

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:51

08
Out 12

Um dia vou esquecer-me das palavras

um dia os livros deixarão de me olhar

como todos os dias

nasce a luz em finíssimos fios de neblina

 

um dia a espada da morte

entra no meu peito

e deixo de ouvir a musicalidade das manhãs

um dia os livros

esquecerei os centímetros de solidão

e os milímetros de desejo

 

sem perceber que um dia

as palavras

um dia dos livros

 

os lábios doces da Lua apaixonada

viverei desacorrentado

sentado

esperando por ti no cais do amor...

 

(poema não revisto)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:34
tags: , ,

Outubro 2012
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4
5
6

7
8
9





Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

subscrever feeds
Posts mais comentados
mais sobre mim
pesquisar
 
blogs SAPO