Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

24
Dez 12

Achas-te superior

indigente

com falta de amor

como muita gente,

 

achas-te superior

rainha das coisas boas

montanha de luz

achas-te uma flor

uma simples flor

com pernas de cansaço

e braços

aos abraços

oiço o balançar da porta de entrada

truz truz truz

ninguém será certamente para me dar nada

nem uma simples corda de aço,

 

um prato com sopa de legumes encarnados

vinho do porto velho como os pássaros com asas de mar

(achas-te superior

indigente

com falta de amor

como muita gente)

e às vezes

multiplicam-se as manhãs de inverno

cresce o inferno

maré de marinheiro

quando eu sentado no barbeiro

penso solitariamente nas nuvens de barbear,

 

sinto-te em espuma no meu rosto envelhecido

e das saudades

as pequenas saudades

correr amar correr livremente

e voar

e amar

voar até cair nos teus braços

abraços

uma corda de aço

do tão construído cansaço

a espuma de ti mergulhada no meu simples desenho da alvorada

e tão triste e tão só tudo aquilo que foi esquecido,

 

achas-te superior

indigente

com falta de amor

como muita gente,

 

mas continuarás a ser uma resma de palavras

sem nexo

moribundas quando a mergulhada canção de amor

não é uma flor

é uma canção

que sofre

que dói

e mói

as pedras finas da calçada dos amores proibidos

e dói

mói

a doçura tristeza do desejo.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:47

Suicidou-se nos meus braços,

 

Quatro filhos, um marido alcoólico, o amante constantemente com as primeiras cinco insónias da madrugada, um cão, um pássaro, que mais ela podia desejar?

 

Saía de casa por volta das 04:30 horas, ainda não tinha acordado o dia, levitava-se pela casa em bicos de pés, beijava na face cada um dos filhos, rogava uma praga ao marido embriagado e pensava nas primeiras cinco insónias do amante, pegava-lhe na fotografia ao de leve, e beijava-o docemente

 

Nos meus braços,

 

O cão sabia ler, o cão sabia escrever, e o pássaro

 

Nos meus braços,

 

Fazia a contabilidade da casa, organizava os jantares de família, digamos que ele era a governanta lá do sítio, cabisbaixo, de asas poisadas sobre a lareira dos sonhos, fazia contas, e quando chegava à prova dos nove

 

Foda-se a conta está errada,

 

Nos meus braços, os fósforos que a morte come quando de deita o dia, chega a casa cansado, desinteressadamente infeliz, faltava-lhe tudo, os rebuçados, as guloseimas, as amêndoas de chocolate e o caramelo Espanhóis que o contrabandista do zarolho oferecia todos os anos pelo Natal, felizmente já faleceu, e vimos-nos livres dos caramelos

 

O meu pai sempre disse, isto um dia vai acabar mal, nos meus braços, O cão sabia ler, o cão sabia escrever, e o pássaro

 

Enfaixado nos caramelos de Luz, chovia, o meu pai acordava todas as manhãs embrulhado em vómitos e crateras de sulfato de amónio nos lábios, acendia o cigarro da desgraça, o cão impaciente, o pássaro fodido, e a minha triste mãe de lágrimas nos olhos a escrever as queixas nas faces rosadas do amante, faltava-lhe qualquer coisa

 

Nos meus braços, suicidou-se ao entardecer,

 

E o meu pai sempre disse, isto um dia vai acabar mal, nos meus braços, o cão sabia ler, o cão sabia escrever, e o pássaro não resistiu aos salpicos das garras do gato do vizinho que aproveitando a janela da cozinha entreaberta, zás..., fodeu-lhe o pescoço

 

Enfaixado nos caramelos de Luz, chovia, o meu

 

Foda-se a conta está errada,

 

Docemente a beijava, sem perceber que a casa ardia na fogueira da paixão, os meus queridos irmãos

 

Suicidou-se nos nossos braços,

 

Eu

 

Caminhava com quatro filhos, um marido alcoólico, o amante constantemente com as primeiras cinco insónias da madrugada, um cão, um pássaro, que mais posso desejar?

 

A morte,

 

O gato constrói um arroto que todo o prédio presenciou sonoramente, na Antena 3 desenhava-se o Planeta 3 nas falsas palavras dos livros dele, os uivos, os gemidos, os milagres concedidos à minha querida mãe, e que hoje partilha uma assoalhada bem lá no alto

 

A morte de um orgasmo,

 

Bem lá no alto, No céu?

 

Os meus três irmãos os estúpidos de sempre, engasgados nas asneiras da literatura vendida no vão de escada, subia-se, subia-se

 

No sexto andar seus parvalhões,

 

Subia-se até que chegávamos ao céu,

 

Eu, três irmãos, a minha querida mãe melancólica, o meu paizinho sempre embriagado, o amante da minha mãe constantemente à procura das cinco primeiras insónias da madrugada, um cão, um pássaro, que mais eu podia desejar?

 

A morte de um orgasmo

 

Na cabeça da lua, nos braços

 

Bem lá no alto, No céu?

 

Suicidou-se nos meus braços sem perceber que eu era um cadáver ensonado que de jardim em jardim, que de embarcação em embarcação, que de autocarro em autocarro (riscar autocarro porque estão em greve), que de papoila em papoila

 

Bem lá no alto, No céu?

 

A morte de um orgasmo depois do suicídio das lâmpadas de néon que todos eles utilizam no Natal,

 

A morte de um orgasmo

 

Na cabeça da lua, nos braços

 

Bem lá no alto, No céu?

 

Sim, no céu, os dias deixaram de ser dias, os dias, pequeníssimas folhas de papel voando sobre um ninho de cucos...

 

(texto de ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:01

Festas Felizes

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:02

Todas as noites me afundo num oceano de saudade, mergulho, indefeso, procuro a sombra marítima que brinca dentro do meu peito, sem jeito para alguma coisa, todas as noites me afundo, de saudade, na saudade, viver sem saber o que é o medo, viver, sem saber... o que é

 

algum dia, qualquer dia, ouvirás as vozes que deixaram dentro da gaveta dos sonhos, as tuas mãos,

 

o que têm as minhas mãos pai?

 

as tuas mãos mergulham, todas as noites, de saudade em saudade, de peito em peito, foge-te o fôlego, as coisas belas morrem, afogam-se no oceano de saudade, às vezes, outras, nem por isso, e procuras-me dentro dos pinheiros mansos da floresta das mães abandonadas, as flores, as árvores, e todos os filhos das manhãs de inverno, aqui, agora, procuras-me e eu escondo-me

 

o que têm pai?

 

olhas-me no espelho curvilíneo da melancolia absorvida pela pele esbranquiçada de um esqueleto sem sono, penso

 

desfaço, não desfaço, e acabo por concluir que a barba é um acessório desnecessário, o cabelo tomba no jardim com os canteiros alinhados, o tapete, a carpete, alguns dos tacos devido à humidade levantaram-se, de pé, em tesão, e às vezes, e às vezes

 

o que têm pai?

 

tropeço, linearmente vou de encontro frontalmente contra as flores de cetim junto aos cortinados de linho, hesito

 

o que têm pai? Penso, e às vezes

 

pareço um pedaço da pano com remendos e buracos, como o telhado do palheiro, telhas em perfeitas condições, e telhas

 

o que têm as telhas pai?

 

e telhas com os membros inferiores fracturados, moribundas, que deixam passar as lágrimas do céu, as tuas mãos mergulham, todas as noites, de saudade em saudade, de peito em peito, foge-te o fôlego, as coisas belas morrem, afogam-se no oceano de saudade, às vezes

 

todas as noites me afundo num oceano,

 

todas pai?

 

todas, todas as noites.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:07

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