Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

17
Mar 13

O que tem o mar que tu não tens

tem seios de oiro e sorrisos de prata

tem abraços e manhãs sem cansaços

tem olhos verdes

e cabelos de vento

tem prazer

dor

tem amor

e tem letras para escrever

o que tem o mar que tu não tens

tem viagens tem barcos tem paixões

escondidas nos lábios do pôr-do-sol,

 

Tem saudade

e bairros de lata

tem perfume tem rosas tem ciúme

o que tem o mar que tu não tens

tem gemidos tem vogais

e sílabas mórbidas entaladas na madrugada

tem camas salgadas

com lençóis de sémen

tem corações

e pernas de cristal pintadas à mão

tem ondas

espuma e um enorme canção,

 

O que tem o mar que tu não tens

queres mesmo saber?

tem sombras tem desenhos tem muros em suspensão

tem um papagaio de papel

e um cordel

tem cheiros tem pedras de muitas cores

e tamanhos

tem flores

tem silêncios tem demónios e esqueletos com ossos à deriva

o que tem o mar que tu não tens

tem livros tem poemas tem cinema

e mulheres vestidas a preto e branco,

 

Tem dança

e asas de voar

tenho pena de este mar

ter tudo o que tu não tens

o que tem o mar que tu não tens?

tem as lágrimas tem o ombro tem o peito

onde encosto a cabeça

ai... que este mar tem tudo mas tudo aquilo que tu não tens

tem submarinos e sepulturas de vidro

tem árvores de fingir

tem loiras cansadas noites de Primavera

e tem... tem doidas palavras...

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:37

(Domingo)



Temos de terminar isto, fiz-te sofrer durante duzentas, trezentas... não mais de quatrocentas páginas, mas hoje, juro, hoje vou matar-te, deixar-te em pedaços, destruir este e os outros pedaços de papel para que nada, absolutamente nada sobre de ti,

Chamei-te Zizi,

Como podia apelidar-te de Maria, Teresa ou Marilú, e quando penso em ti

Marilú,

Recordas-me o incenso em brasa e o cheiro a mar quando ele vive a mais de duzentos quilómetros de mim, recordas-me as caves misturadas na noite, recordas-me a literatura travestida de orvalho abraçado a um cais de embarque, cortaram-te as correntes que te prendiam à terra achatada e agora navegas desesperadamente como o vento sem rumo, como as pessoas de mim

Sobre as árvores à espera que regresse a segunda-feira, hoje serás o último dos textos, quer queiras quer não, porque me cansei de ti, das tuas mãos e das tuas tristes palavras, também me cansei dos teus lábios, da tua boca

Zizi: - Odeio-te quando não fazes amor comigo, odeio-te quando te finges de espelho e estaticamente pareces um fio suspenso por um fio de nylon,

E tu sabias que era essa a minha vida, ou não?

Mas hoje morrerás, hoje deixarás de ser texto, palavras, imagens a preto e branco, hoje, Domingo,

Fato, cansado

De ti

Do cheiro do papel e dos livros,

Das tintas,

E das histórias,

Pareço, pareço um vagabundo numa paragem de eléctrico, vestido de negro, confundo-me com a chegada da noite, mas fico com a sensação que vão cair gotinhas de água com perfume de incertezas, dores musculares, e uma estrutura óssea quase em ruínas, doem-me os pilares, doem-me as vigas, doem-me os alicerces inventados por um engenheiro desgovernado, escrevia palavras nas coxas de Zizi, e levava-a a passear, quando

O Tejo já dormia e quase nem se via com as luzes reflectidas nos olhos da madrugada, chegavas tardíssimo a casa, chamavas por mim, eu dormia, outras

Fingia dormir,

Tínhamos sobre as almofadas de linho os quatro cubos de areia com cinco esferas de aço, tínhamos três janelas sem vidros, sem esquadria, apenas o buraco com imagens de

Matar-te-ei com com uma caneta de tinta permanente, e imagino-te a derramares-te pelas folhas do caderno como um pente nas faces do xisto antes de acariciado pelas mãos de um feliz travesti

Marilú,

Com imagens de manhãs brancas e noites cinzentas, como fotografias penduradas num cordel, e de mangueira a mangueira, olhavas-me

Olhava-te na vida de silêncio que inventaste para mim, e sobre mim, e depois de mim, e

Matar-te-ei hoje,

E deixarei de escrever-te, morrerás ao som de “The Enlightement” The Ratazanas, e depois fazer-te-ei descer as íngremes escadas da melancolia, até que desaparecerás nas ondas híbridas do oceano em cio, e eu queria tanto abraçar-te, e eu queria tanto beijar-te

Antes de poisar a caneta e escrever sobre a noite

FIM,

E não sabias que um barco vinha buscar-me aos cais dos acorrentados, e nunca soubeste que uma gaivota vinha a mim, como vieram todos os soluços das manhãs quando acordava e do outro lado do espelho

Apenas

Do outro lado do espelho um vazio chamado círculo, com olhos verdes, com pernas e braços e coxas e púbis, um círculo trigonométrico encaixado no crucifixo que a parede segurava com as mãos da insónia, e dizias-me

Odeio-te quando não fazes amor contigo...

Zizi?

Sim, amor

Não percebes que é propositadamente

O quê amor?

Que eu

Tu o quê amor?

Quero que me odeies...

Como se odeiam os poemas ainda não escritos dentro da minha cabeça de abobora, lembras-te do homem com cabeça de abobora? Talvez um dia, quando leres estas palavras, percebas

Quero que me odeies...

Que das minhas pobres palavras nunca vão nascer coisas para encantar os espelhos, as ruas, as ruelas e tristes casas de pasto, sobre uma pobre mesa de madeira vestida com uma pobre toalha de plástico, um copo e uma garrafa de vodka, tu preferias vinho, tinto, a empregada, já de idade avançada tinha acabado de deixar uma travessa com peixe frito, pão, azeitonas, dispensamos tudo, excepto as bebidas, não tínhamos fome, mas comíamos palavras

E sussurravas-me baixinho

Amor,

Sim Zizi,

Odeio-te quando não fazes amor comigo,

(e não percebias que era propositadamente).



(ficção não revisto)

Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:40

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