Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

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Abr 13

foto: A&M ART and Photos

 

(ao Rei dos Sonhos)



Sabia-te quando terminavas nos sonhos e caminhavas no corredor da saudade, ouvia-te dançar sobre o mosaico porcelana da piscina em forma de rua, perdida, tu, corrias em direcção às escadas de acesso da rua dos pequenos beijos de porcelana, dormias entretanto, profundamente, pensava eu, quando olhava nos teu olhos cerrados as imagens reflectidas de uma louca e antiga máquina de slides, o picotado desenhado numa fina película de plástico retirada a um saco incolor de supermercado, finíssima, ela não maior do que um carro de linhas, que servia de carreto que com uma manivela de arame fazia rodar as imagens em frente de uma lâmpada, dormias, dormias, ainda dormes, e eu, permanentemente às voltas com a manivela a inventar imagens picotadas numa tira de plástico com uma agulha esquecida juntamente com o dedal da minha mãe,

a inventar imagens desde 1976,

Fundiam-se-lhe lâmpadas que só posteriormente percebíamos a escuridão das equações diferenciais que tínhamos para resolver, elas, como eles, poisavam sobre a mesa da sala de jantar, ficavam lá, perdidas, fazíamos-las esquecidas, e às vezes, poucas, só com a ajuda de drageias, elas, as equações (macho e fêmea) acordavam do sono incrédulo que Deus nunca acreditou e aos berros

preguiçosos,

preguiçosas,

Sabia-te quando terminavas, acordavas, abrias as janelas do teu corpo, e deixavas entrar a luz que o espelho do guarda-fato absorvia da velha máquina de slides, havia imagens dentro de ti, e só quando te acariciava os seios, e só quando te beijava os lábios de sonâmbulo cravo vermelho, e só

que desenhos mais esquisitos, como corredores, pássaros, migalhas de aço e sobras de vento,

E só quando deitava a minha cabeça nas tuas coxas, sentia eu, sentias tu, as imagens todas, as de ontem, as de antes de ontem, e as imagens de infância, saíam do espelho do guarda-fato, sentavam-se um pouco sobre a mesa-de-cabeceira, apenas para nos contemplarem, e só depois, começavam a entrar em ti, e no fim, eu entrava também, e tinha como missão, encerrar a porta, hermeticamente, e dentro de ti, saltava, brincava, dormia, como tu

a inventar imagens desde 1976,

Como tu, dentro de uma piscina, caminhando a passos apressados como se a rua estive quase a fechar-se, e a carapaça de tartaruga aos poucos, em pequeninos milímetros de cada vez, até todo o tecto baixar, e tu, desapareceres, em corrida, dentro de água com o cheiro a saudade, com o silêncio dos cobertores suspensos nas pálpebras tuas, que dormias, sossegadamente como um anjo louco, de caligrafia como pequenas mandíbulas de areia, como eu, desesperado procurando por ti, dentro de água, dentro de uma caixa de sapatos

onde funcionava uma pequena máquina de slides,

Com refrigeração,

a fundir lâmpadas desde1983,

E tubos de néons sobre a porta de entrada, “sabia-te quando terminavas nos sonhos e caminhavas no corredor da saudade, ouvia-te dançar sobre o mosaico porcelana da piscina em forma de rua, perdida, tu, corrias em direcção às escadas de acesso da rua dos pequenos beijos de porcelana, dormias entretanto, profundamente, pensava eu, quando olhava nos teu olhos cerrados as imagens reflectidas de uma louca e antiga máquina de slides, o picotado desenhado numa fina película de plástico retirada a um saco incolor de supermercado”, e uma campainha de serviço, um gajo feio, como eu, devidamente fardado a preencher os impressos para a atribuição de subsídios para a construção de máquinas de slides, e eles

apenas com uma caixa de sapatos, uma lâmpada, duas pilhas de volte e meio, alguns fios eléctricos, um pedaço de vidro que fazia de lente, e cerca de cinquenta centímetros de plástico com cerca de seis centímetros de largura, e um carrinho de linhas, e claro, a manivela em arame... e um pedaço de pano que apelidamos de lençol,

Com refrigeração?

e desenhos pacientemente desenhados com uma agulha,

A fundir lâmpadas desde1983,

pacientemente eu, a perder parafusos desde Janeiro de 1966.

 

(não revisto; parte deste texto não é de ficção e aconteceu com o meu amigo de infância - infelizmente já falecido - JÚLIO)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:25

foto: A&M ART and Photos

 

Há fogo nos teus olhos minguados pelo silêncio da chuva

quando o meio-dia de um suicidado relógio

cai sobre as pequenas lágrimas de granito

como se os amargos poemas da morte

tivessem vida e começassem a transpirar sílabas furtivas,

 

Há fogo nos teus olhos

como janelas cristais dentro de hipercubos

como lábios de areia

da lareira dos sonhos

as tristes paisagens dos teus seios de amêndoa,

 

Há tanta coisa dentro de ti

meu cansado amor sem teres a destemida coragem de me olhar

escrever ou pintar no muro recheado de ervas e sanzalas imaginárias

os poucos sonhos que as minhas mãos deixaram no teu rosto argamassado

pelas geadas marés do vidro em planícies embalsamadas pelo desejo da paixão,

 

Há fogo nos teus olhos minguados pelo... da chuva

que te esqueces das poucas palavras que ainda vivem dentro de mim

como uma roseira bravia e ensanguentada pelas nuvens em demanda...

há meu amor

madrugadas fingidas em noites acordadas tuas fantasias,

 

E que não sabias

que há árvores à nossa espera num jardim invisível

onde passa um rio em corridas apressadas

adormece no mar

do fogo teus olhos minguados pelo silêncio da chuva.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 14:36

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