Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

01
Mai 13

foto de: A&M ART and Photos

 

Incansáveis, inanimados, desiludidas, porquê tantos e tantas ou sem sabermos, de ti, quando sobes as escadas, bates-me à porta, e em palavras acabadas de mastigadas pelo vento, dizes-me

amor, tens um pedacinho de salsa que me emprestes? Não, respondo-te intransigentemente, claro que não, porque não sei o que é salsa, porque se soubesse, não, não te emprestava salsa, e também...

E depois, não sou, nuca o fui, o teu amor, provavelmente, outro o é, outro que tem salsa, hortelã e pimenta, é calvo, tem olhos escuros e orelhas pontiagudas, é lindo, e vive num rés-do-chão com vista para o cemitério da aldeia, é aparvalhado, como eu, em imaginar-te um dia sobre as nuvens vestida de cinzento prateado, usavas um vestido desenhado por mim, calçavas uma sandálias também elas, desenhadas por mim, e nos lábios, nos lábios era suposto trazeres palavras açucaradas, em ponto de rebuçado, e no entanto, apenas te imaginava, e tu, sem saberes que eras apenas um sonho, que não passavas de desenhos, riscos, palavras mortíferas na boca de uma serpente, e de nada serviam as clarabóias despidas, nuas, nuas as duas, o tecto, o sol, e as noites depois das tempestades de areia sobre a tenda lona com estrelas aqui, ali... e acolá, sei lá, enfim, a vida a retalhos, em movimentos tortos, inclinados sobre o silêncio,

subsidiado, tu, sobre as grades de um paquete em movimento,

“Incansáveis, inanimados, desiludidas, porquê tantos e tantas ou sem sabermos, de ti, quando sobes as escadas, bates-me à porta, e em palavras acabadas de mastigadas pelo vento, dizes-me”, Resolvi esquecer as palavras que todos os livros entranharam no meu corpo antes de ele ser dilacerado pelo bisturi plastificado, mumificado, desaparentado, que os pregos de aço deixam nas searas de trigo, de cá até lá, meia dúzia de pássaros, algumas espigas de milho, rosas, poucas, poucos, os alimentos desventrados das paredes em gesso envenenado, desobediente, vai prisioneiro por se revoltar, ou por fazer outros revoltarem-se, luta de galos, lutas de burros, e depois, às vezes, os sexos entranharam-se-lhe nas mãos coloridas pelos cartazes que dois ou três jovens colavam nas paredes envelhecidas de um prédio em decomposição, cheirava mal, cheirava a

Puré de batata, a cebola, ou a alho,

caraças, nada disto está nos livros, e

Amor?

amor, qual, eu, ou os esqueletos que dormem dentro do meu guarda-fato?

Só precisava de um raminho de salsa...

e claro que fico chateado, furiosíssimo, quando me chamam de amor só quando precisam de mim!

Só precisava de um raminho de salsa..., que desses olhos lágrimas têm em demasia, como elas, que inventam noites sem estrelas para adormecerem mais cedo, desequilibrados, equilibrados, falhados, furiosos, como todos, todas, insignificantes envergonhados torrões de açúcar depois de partirem das esplanadas as gaivotas embriagadas, voam, caiem, levantam-se, e tropeçam na calçada...

 

(não revisto, ficção)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:53

foto: A&M ART and Photos

 

Sobre o caleidoscópio da tua fina pele

meu amor em rosa amarela

minha púrpura manhã em seda silêncio

pegar na tua mão de flor adormecida

como se fossemos duas penas suspensas nas gotas de orvalho da insónia,

 

Como é lindo o amor das palavras

escritas e pensadas

fingidas

e sonhadas

como nós meu amor a clandestina migras madrugadas,

 

Se tivéssemos uma janela com pedras preciosas em formato de envidraçado

livros compactos

sons melódicos

ruas debaixo de nós preguiçosamente envenenadas pela paixão

dos desejos viciados pela medusa carícia tua mão,

 

Sobre nós meu amor

o caleidoscópio da tua febre cambaleando entre mortalha e cortinados de suor

entre odores e línguas de marinheiros vadios

com barcos emagrecidos

nossos corpos vaiados e perdidos,

 

E perdidamente eles em prazer

à lua alegria no leito da melancolia

as nossas bocas fuziladas pelos orgasmos inventados

por um poeta louco

com palavras loucas entre esquinas de areia e mão de ti meu amor...

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:25

foto: A&M ART and Photos

 

As cerejas de Deus que nos teus lábios comem as minhas palavras

que das tuas mãos Deus colocou sobre o meu rosto de pergaminho

as sílabas transparentes dos degraus impossíveis de transpor

pelos teus sonhos em silêncios azuis

como as pétalas da rosa esquecida no muro em frente à tua alegre casa,

 

Tínhamos um telhado

onde nos escondíamos nas tardes de solidão

e depois de alicerçares nos teus braços os cadernos de nós

ficávamos assim livres a olhar as nuvens

e a inventar histórias que um jornal de província nos comprava,

 

Tínhamos dinheiro para o pão

e para comprarmos novos cadernos

tinta

e às vezes

sobrava-nos algumas moedas para fingirmos que fumávamos flores enroladas em marés de Inverno,

 

Víamos os barcos a morrer como gente desesperada

cansada de trabalhar

cansada... de viver

as cerejas de Deus... comem as minhas palavras

e deixam os caroços sobre a terra semeada,

 

Víamos os barcos em círculo na janela da solidão

barcos que escreviam histórias

nos corpos amarrotados como o papel higiénico da pastelaria

entre migalhas de torradas e o cheiro a chá de hortelã...

vivíamos felizes sem percebermos que éramos miseráveis.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 14:34

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