Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

27
Mai 13

foto: A&M ART and Photos

 

Sentia os rosnares engasgados dos automóveis ensanguentados pela paixão que em noites de escuridão, descia, solenemente, tristemente, às vezes, digo-o, alegremente, Porque não? Se o meu peito era o porto de abrigo dos teus braços de arame fingindo fileiras de madrugadas sobre as sobrancelhas antes de acordarem as manhãs, depois, o mesmo de sempre, a tempestade de sempre, a vida, sempre a vida em vida, completa, complexa, imunda, desperta como as flores do teus olhos, meu amor, meu amor das árvores envelhecidas, e do mostrador de um relógio, tu, a tua pele, os teus ossos em plasmas de fim de tarde, as rugas, os teus medos, o aço do teu peito quando o poisavas em mim, entre nós, réstias de insónia, angústias que provocavam os cigarros depois de fumados, havia no tecto do desejo, uma linda colorida lâmina de luz, camuflada, como tu, escondido entre o zero e o mil novecentos e oitenta e oito, nove vezes nove, atravessávamos o rio, olhávamos a ponte enferrujada pelos beijos das gaivotas sobrepostas nas rimas que sobejavam dos loucos poemas que tu inventavas, e sentias-me dentro de mim, e sentia-te deitado no perfume que atravessava a ruela entre gemidos e assobios do amolador de tesouras,

Eras tu?

O sangue, o teu, o meu, sabia-nos a poemas envenenados pela neblina de uma cidade flutuante, cacilheiros de ossos procuravam lânguidas línguas de prazer, comíamos coisas esquisitas, frágeis, como corpos acabados de nascer, tínhamos o prazer guardado dentro da gaveta da mesa-de-cabeceira, sobre nós, uma pilha de livros, e nervos, e plantas que eu, tu, que nós nunca percebemos para que serviam, apenas viviam, como nós, simples sombras, complexas manhãs de iodo, a areia fundia-se e filmava-nos como um espelho de luz a absorver os orgasmos das palavras esquecidas na ardósia que havíamos suspendido na parede da sala de jantar, amar-me-ias?

E eu sentia, as plumas do teu peito deambularem nas janelas gradeadas que escondiam o sofrimento das nossas almas, não, não consigo recordar os Sábados entre feiras de velharias e as idas à feira da ladra, ouvia-te numa roleta de casino clandestino, apostava-te todo, e saía-me um par de ases, porra, fico teso, uma semana, um mês, dois, três meses de miserabilidade, e no entanto, sabia-me feliz, subia cambaleando as escadas que me levavam aos teus braços de roseira bravia, indomável, e trazia na boca as sombras do hálito do vodka misturado com sumo de laranja, deixa-te sobre a mesa um bilhete de despedida, “regresso dia 23”, e sabias que eu, jamais regressaria, porque a minha vida é como uma roleta do casino clandestino,

Sempre, sempre saem asses, e sempre que eu perco, e no entanto

Contente, feliz, ausente, sou uma roleta em círculos em busca de uma par de ases, apenas um, um só,

Tinhas a certeza que era eu?

Diziam-me que sim, e no entanto, tu, e no entanto, eu, e no entanto, nós, dois corpos misturados na penumbra solidão procurando uma, apenas um, par de ases,

Pouca, coisa, a nossa triste história,

Tinhas a certeza que era eu?

Nem eu, nem eu,

Regressamos a nós.

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:53

foto: A&M ART and Photos

 

Sabia que te escondias na sombra de uma locomotiva louca

entre carris imaginários

e praias de incenso sobre tingidas nuvens amarguradas

sabia e não fazia nada

deixava-te sombrear nas planícies rebeldes da solidão,

 

Inconstante este amor que os comboios deixam nos socalcos ao rio doirado

milagrosamente só como sandálias de couro e pingos de espuma

e o mar transpirava

e quase me levava até à pedra onde te sentavas

só como eu só nas locomotivas loucas,

 

Sabia que te escondias... louca

entre cartas invisíveis nas palavras famintas

sabia-o e nada fazia para te resgatar da ausência que a saudade constrói nos sorrisos de amendoeira

e olhava-te como uma louca locomotiva em movimento

procurando sombras que o rio Douro vomitava...

 

Tínhamos um mala simples com objectos simples com destinos diferentes

eu sabias que me transportava para Sul

e tu

tu fingias transportares-te para Sul obliquamente sabendo-o que irias para Norte

opostamente de mim como uma serpente envenenada,

 

Hoje somos apenas dois cadáveres de areia que o tempo

semeia sobre a água salgada onde se escondem os teus seios de cereja

e brincam as tuas coxas como livros em poesia depois de lidos relidos e transcritos

pela louca locomotiva

de uma imagem a preto-e-branco...

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:40

26
Mai 13

foto: A&M ART and Photos

 

Mostra-me onde fica o mar, sussurra-me poemas como quando sinto os cortinados da minha janela, porque acorda o dia, a cintilarem, dançam entre vidros e sombras de luar, mostra-me, se não tiveres medo, onde fica a casa do amor, o silêncio do desejo, mostra-me, sem pudor das imagens, o mar, as palavras do mar, fica, não vás agora para a distante solidão dos desejos de amar, mostra-me, mostra-me o que é o amor, e eu, oferecer-te-ei este desenho, este desenho das minhas mãos, quando eu, ainda tinha mãos, e tu, vagueavas dentro da minha cabeça como os peixes no aquário da paixão; amar-me-ás? E se eu confessar-te entre murmúrios e sons melódicos que te amo... zangar-te-ás como fazem os pássaros quando lhes retiramos os cobertores nocturnos da geada? Guarda-o, e não tenhas medo, deste, dos outros, de tantos e tantos... desenhos meus, porque teus fantasmas são,

o branco negro da solidão, precisarei de lágrimas como tormentos meus para perceberes que a minha pobre embarcação, velha, cansada, começa, aos poucos de nada, a meter água, enche-se de medo, desassossego, e eu, espero-te desde ontem na ponte dos camuflados soldados de chocolate, lembras-te de mim, ainda?

São, todos teus, os tristes desenhos meus, porcarias sem nexo, e avança sobre mim a vergonha, a língua de fogo que a manhã transforma em dor, em poeira,

ai a poeira...!,

E não, não o digas mais, que a culpa foi dos morcegos, das equações de Einstein... porque não, não são os tectos da relatividade os culpados pela ausência de barcos na nossa cama, se ainda temos cama, sono, tempo para abraços, não, não foram os cansaços, culpados, prendam-me se for necessário, acorrentem-me a um cais de embarque, que eu, eu lanço-me ao mar, rio, onde vocês quiserem, mas... não culpes o Einstein

havíamos construído um casulo circular na profundidade do silêncio da areia, vestias-te de encarnado, a blusa, e das tuas velhas calças de ganga, ouviam-se-lhes ainda os gemidos da noite anterior, tínhamos medo, nós éramos o medo disfarçado de poesia, e inventávamos poemas nas descamadas conchas perfumadas dos moluscos envenenados por algas, ruídos de automóveis em confrontos desnecessários com os vizinhos do rés-do-chão, e tu, dizias-me

Amo-te,

eu, parvamente, engolia palavras, comia-as, como hoje almoço os livros que leio, como ontem dormíamos sobre os lençóis de seda com desejos prometidos, Amo-te, dizias-me tu, eu, e nós acreditávamos no largo das palmeiras, e enquanto te sentavas junto ao lago víamos os cisnes a dançarem nas encostas socalcos do Douro, havíamos

Amava-te, digo-o hoje, e comia-as, alimentavas-te de pequenas gotas de suor que o teu finíssimo corpo transbordava quando as minhas mãos

escrevias no meu corpo palavras, desenhavas-me e dizias-me que a tela dos meus seios, pequenos, ínfimos, tinham sussurrado o teu nome enquanto esperávamos pelo comboio para Alcântara, havia barcos estranhos nas nossas costas, crestados abraços, milímetros quadrados de tristeza, a saudade, escrevo-te, escrevo e peço-te que,

As minhas mãos, inventávamos sonhos e Primaveras, que

peço-te que não culpes o Einstein...

Que, e dizias-me, onde ficava o mar, sussurravas-me poemas como quando sinto os cortinados da minha janela, porque acorda o dia, a cintilarem, dançam entre vidros e sombras de luar, mostra-me, se não tiveres medo, onde fica a casa do amor, o silêncio do desejo, mostra-me, sem pudor das imagens, o mar, as palavras do mar, fica, não vás agora para a distante solidão dos desejos de amar, mostra-me, mostra-me o que é o amor, e eu, oferecer-te-ei este desenho, este desenho das minhas mãos, quando eu, ainda tinha mãos, e tu, vagueavas dentro da minha cabeça como os peixes no aquário da paixão; amar-me-ás?

peço-te que não culpes o Einstein... , e havíamos de cruzar os Oceanos arbustos que Belém aconchegava, e um rio,

Chorava,

tu choravas ensanguentando os meus braços de cinzentas lágrimas...

E choravas, sentia-te dentro dos lenços de papel.

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:27

foto: A&M ART and Photos

 

Estás tão triste querida melancolia tarde de Domingo

o vento levanta-se dos teus anseios cabelos

como o mar se acorrenta nos teus abraços

dos belos castanhos beijos

e os medos vaiados pelos poemas teus olhos

que alimentam a tua boca em desejo,

 

Tão tristes as paredes ruínas que encobrem as tuas melodiosas canções de amar

sabendo tu que o amor é um Sábado disperso e cansado

comendo amêndoas recheadas com chocolate e pequenos versos

e grandes nadas

tão triste querida palavra que não sou capaz de pronunciar...

porque hoje é Domingo,

 

Porque hoje é melancolia adormecida

luz em pequenas lâminas de silêncio

sobejantes janelas sem os cortinados do dia...

uma ardósia encolhe-se-te no centro dos teus seios

e todas as palavras de amor

choram como crianças arrependidas...

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 18:49

foto: A&M ART and Photos

 

Percebiam-se-te cansaços que o tempo alimentava

flores dispersas como sandes de solidão

sobre uma cama encharcada

fina distância a janela da paixão

que a noite alicerçava,

 

E a fome

meu amor madrugada

que nuvens vorazes galopavam nas searas abandonadas

e a fome das coisas prometidas

dos livros murmúrios palavras,

 

Amor... lâminas de vidro que a espuma do mar recordava

entre a loucura e as lâmpadas do silêncio encardido dos candeeiros cadáveres

amor só como areia dispersa na imensidão da poesia

de dia

o amor... amor que não amava,

 

E desejava

sabia-te adormecida nos confins sulcos que o estômago rejeitava

vogais sílabas e imagens do teu corpo imprimido no céu petroleiro

e sobejava sabia-te dorida pelas mãos das ilhargas madeiras da Primavera

que o meu coração imaginava,

 

Chorava-te como lulas grelhadas

dentro da barcaça da alvorada

percebiam-se-te cansaços e limonadas

como este maldito zumbido da esplanada criança tristemente apaixonada

tristemente... recheada nos lábios teus finos beijos que as pétalas do amor o vento transportava...

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:43

25
Mai 13

desenho de: Francisco Luís Fontinha – Alijó

 

Mostra-me onde fica o mar, sussurra-me poemas como quando sinto os cortinados da minha janela, porque acorda o dia, a cintilarem, dançam entre vidros e sombras de luar, mostra-me, se não tiveres medo, onde fica a casa do amor, o silêncio do desejo, mostra-me, sem pudor das imagens, o mar, as palavras do mar, fica, não vás agora para a distante solidão dos desejos de amar, mostra-me, mostra-me o que é o amor, e eu, oferecer-te-ei este desenho, este desenho das minhas mãos, quando eu, ainda tinha mãos, e tu, vagueavas dentro da minha cabeça como os peixes no aquário da paixão; amar-me-ás? E se eu confessar-te entre murmúrios e sons melódicos que te amo... zangar-te-ás como fazem os pássaros quando lhes retiramos os cobertores nocturnos da geada? Guarda-o, e não tenhas medo, deste, dos outros, de tantos e tantos... desenhos meus.

 

Francisco

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:45

foto; A&M ART and Photos

 

O escritor não sou eu, os cigarros terminaram quando ainda pertenciam-me coisas pequenas, pássaros e poemas, secretárias que vomitavam palavras, cidades que flutuavam entre manchas de sémen e flores de pétala encarnada, o escritor morreu, não me pertencem as palavras que escrevo, que ele escrevia para mima, e eu, amava-o loucamente como quem ama uma árvores, um pedestal sem estátua, ou... escrevia-me nas costas enquanto eu, dormia, imaginava-me dormir dentro dos teus braços, hoje partiste definitivamente de mim, acabaram-se-me palavras e cores e os riscos desordenados das noites de Sábado, hoje

escrevia-te palavras vãs em teus olhos verdes, poisava os cotovelos sobre a secretária, mal educado, ouvia eu da tua triste boca, eu, sem sentido, não me importava que de ti acordassem glândulas e células onde eu guardava as palavras para ti, meu amor, e sinceramente, aos poucos fui desistindo dos teus lábios, ficaste confuso, tu, o homem que veste o meu corpo, me transportas para as imagens longínquas de uma cidade que ainda hoje, não Sábado, não consegues pronunciar, e da minha Luanda infinita com o mar arregaçado até aos tornozelos, tu, desististe de me transportar, de me amar, e assim, perderam-se-me todas as palavras que te escrevi...

Odeio-te como odeio as chuvas tempestades sobre os rios de brincar,

flutuávamos como alicerces de edifícios em ruína, éramos aço que cobria o esqueleto dorsal de um paquete não baptizado, levianamente, desaparecias durante a noite, provavelmente, vestias-te de peixe, e voavas sobre o capim ruidoso que os mabecos rosnavam antes de adormecerem, esperava-te na cama mergulhada em livros, papeis velhos e canetas de tinta permanente, perguntavas-me qual era a minha terra e eu respondia-te que sinceramente, ou

Provavelmente,

ou...

Não tenho terra, aqui não me conformo, não me revejo, e lá, lá não me querem como cidadão Angolano, portanto, além de te perder, além de perder as tuas palavras, os teus abraços, os teus doces lábios, perdi também a Pátria, e considero-me um apátrida, nem pertenço ao mar, nem pertenço à terra,

ou,

Odeio-te como sabias que todos os calendários inventam dias, e que todos os relógios, os pobres, e os ricos, todos, comem horas, minutos e segundos, e subíamos a um coqueiro com asas de vidro, e sentia-te em mim, e sabia-te disfarçado de sebenta com palavras, e palavras, palavras...

a quem pertenço eu? A que corpo pertencem os teus lábios que saboreiam o meu pescoço? Às palavras não ditas, por medo, covardia, Qual é a minha Pátria?

Quem diria, que eu, um dia, procurasse nos caixotes de cartão a tua fotografia, quem me diria, se eu te odeio, desde que morreste-me nas mãos em palavras,

vãs,

E nunca, pára de mentir-me, porque nunca vivi na Vila Alice, porque, nunca, vivi no Bairro Madame Berman, e

vãs, sãs, e nunca, nunca te esqueças, meu grande sacana, que o teu querido corpo, é meu e pertence-me, leva as tuas palavras, leva-as, mas deixa-me o teu corpo para eu brincar no espelho do guarda-fato enquanto não regressa o Inverno...

 

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:21

foto: A&M ART and Photos

 

Voávamos entre as gaivotas assassinas

que todos os finais de tarde

acordavam

voávamos como livres pensadores

sentados debaixo de um qualquer plátano que o tempo esqueceu em nós,

 

Havia um mar desenhado nas rochas que brincavam no teu peito cerâmico

e os barcos nossos que laçamos em viagens circulares

ouvíamos-los pacientemente chegando ao pôr-do-sol

que do teu corpo

aconchegava a maré dos vértices de luz,

 

Voávamos entre... assassinas

que das tuas mãos se erguiam quando encerravam o sol numa caixa de vidro

e os lábios oiro que construíam sorrisos nas margens do rio

voavam como nós

voávamos sobre as lápides como crânios selvagens vivendo na montanha dos lápis de cor,

 

Sem percebermos que éramos sibilantes palhaços de pedra

procurando as nuvens inventadas pelas loucas tardes tuas

que o prazer acorrentava nos teus finos braços de crisântemo envelhecido

voávamos

voávamos às viagens de cartão em redor de um pilar de areia,

 

Voávamos de mão dada entre gaivotas assassinas

e noites de literatura

esquecíamos as tardes de poesia e subíamos as escadas em caracol

que nos levavam até ao telhado silêncio da cidade das algas tuas coxas

e ficávamos... assim... como hoje... à espera que terminasse o dia.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:11

foto: A&M ART and Photos

 

O preto ambíguo semeado em lábios de chumbo

como a poesia melancólica das paredes de uma livraria

sentia-te dentro de mim em flores de inverno

das tuas guelras se transformam as palavras

e as tuas palavras

simples gargantas ao abismo térreo,

 

Sentir-te no meu peito que procura nas sombras o desejo

lágrimas e pequenas voláteis sílabas mergulhadas nos teus seios cereja adormecida

o preto transformar-se-á em dia

e do branco tua pele sedosa e meiga

acordará a noite

em prazeres de insónia,

 

Sentir-te como pedaços de papel

ainda virgens os livros por escrever

e folheias páginas brancas

céus crispados na língua suspensa no meu pescoço imensurável

ausente como as canções que a Primavera deixa cair sobre as árvores...

e afugenta os pássaros da paixão.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 14:29

24
Mai 13

foto: A&M ART and Photos

 

O corredor encastrado nas rochas sobre lâminas pulmonares que sobejavam das cansadas manhãs de sobriedade, o corredor, altíssimo como o abismo, e aos poucos deixava de ver-se o tecto, dando a terrível sensação de claustrofobia, parecendo ao olhar do simples comum que as duas paredes se uniam no infinito, evidentemente que não, e a largura do tecto milimetricamente igual à largura do pavimento térreo, onde as tuas sombras mergulhadas em asas de pequenos tecidos réstios, recordando-me paisagens da África do Sul ou Austrália, recordando-me silêncios submersos em canções melódicas em roda de uma fogueira, quando recheada a noite, vinham até mim, sem perceberem que eu os desejava, os esperava, vinham até mim pequenas lascas de vento, saboreava-as, e claro que quando adormeciam debaixo de ti os recusados orgasmos matinais que dos cortinados do medo remexiam páginas e pequenas folhas dispersas sobre a mesa em fórmica barata que tinha adquirido numa das minhas visitas à feira da Ladra, apetecia-me comprar uma pistola, munições de argila, e brincar como as crianças, imaginando alvos, imaginando vidros, na escola, quando pontapeava uma bola em borracha, e a milhas da baliza, quebrava um dos grandes vidros da janela onde hoje habita a biblioteca municipal,

coisas de putos,

E de “Putas”,

coisas de gajos como eu, desajeitado, imprimido numa madrugada em mil novecentos e sessenta e seis, pior do que isso, um belo domingo de Sol, era verão, e era Janeiro, havia flores em redor da maternidade algures esquecida na cidade dos sonhos, para uns, desejos, para mim, pesadelos, e para ela

A cidade da vaidade, da arrogância, uma cidade em pedras comendo as lâminas pulmonares dos homens com janelas quebradas por um miúdo desajeitado, um miúdo, estúpido, um miúdo que depois de crescido, ficou palhaço, o circo entra cidade adentro, o miúdo esconde-se nas catacumbas do desassossego, porque sempre que o corredor aumentava em altura, notava-se, que, não sei... mas parece-me que aumenta também em comprimento,

cumprimenta o senhor General, Margarida Armanda,

Bom dia, senhor General,

coisas de putos,

E de “Putas”,

uma fogueira, quando recheada a noite, vinham até mim, sem perceberem que eu os desejava, os esperava, os comia mesmo antes de entrarem em mim, (bom dia, senhor General), e ele fazia-a acreditar que a lua era redonda, e que das nuvens, depois do prazer aconchegado das mãos do senhor General, eram de algodão, porco, filho da puta, e dizia-se que era normal, as meninas, mandadas pelos pais, cumprimentarem o senhor general,

Bom dia, senhor General,

e o prazer transformava-se em dor, e as pedras da parede do corredor, algumas, transformavam-se em pequenas bonecas, bonecos, e estrelas

E de “Putas”,

que ficavam no céu até acordar o dia, deitávamos-nos quando os machimbombos começavam as alegres caminhadas palas ruas da cidade, havíamos de conquistar as sanzalas com meninas que diziam ao acordar

Bom dia, senhor General,

palhaço, o circo entra cidade adentro, o miúdo esconde-se nas catacumbas do desassossego, porque sempre que o corredor aumentava em altura, notava-se, que, não sei... mas parece-me que aumenta também em comprimento, e a tristeza na proporcionalidade de cinco para um, desfaz-se em pequenos grãos de areia, ela agachava-se para espantar o medo

Bom dia, senhor General,

e o medo sabia a lágrimas como capim enrolado na ferocidade dos mabecos que durante a noite, entravam nas casas, e subiam à cama das meninas, e numa voz dilacerante, ouviam-se-lhes

Bom dia..., bom dia, senhor General.

 

(texto de ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:44

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