Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

25
Ago 13

foto de: A&M ART and Photos

 

hoje és um mendigo igual a mim

uma pérfida folha de papel não correspondida

hoje és um cadáver envergonhado deitado na minha sombra

uma triste e cansada sombra debaixo dos lábios do púbis incenso

hoje és um sexo amargurado

triste como as sílabas empapadas dos livros de nada dizer

como as noites a arder

dentro de ti o comestível prazer

 

hoje finges que não te pertenço

que sou um muro em xisto

balançando sobre a encosta

atiro-me e encontro o rio

hoje és um mendigo igual a mim

fugindo da claridade

e dos beijos zangados em cinzentos fios de sémen...

e dizes-me que sou um palhaço

 

um voador corpo com asas em papel

hoje desperdicei os abraços sobre a lua em fúria

que deus deixou na mão da madrugada

hoje não sou nada

como ontem

como amanhã

hoje és...

apenas uma defeituosa maré de linho com coloridos olhos em verniz...

 

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 25 de Agosto de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:54

foto de: A&M ART and Photos

 

Porquê?

Os navios em fúria de apitos, amontoavam-se à porta de casa, lá dentro, eu e ele, tentávamos esconder as amarras dentro da gaveta da cómoda, eles cá fora, gritavam

Porquê?

Marinheiros famintos, procuravam qualquer objecto que servisse para derrubar a frágil porta, escondemos-nos junto ao corredor que dava acesso à casa de banho, o peitoril fumegava, alguém já nos tinha lançado algo de combustível, algo de destruidor, abracei-me a ele, e com toda a minha força

Porquê?

Fiquei não sei quantas noites pensando que nunca mais terminaria a sangrenta guerra de palavras da cidade dos desejos, multipliquei abraços, dividi beijos, e hoje

Porquê?

Hoje pareço um íngreme cavalo de areia correndo sobre o mar,

E com toda a minha força apertei-o como quem aperta o único filho, e pela madrugada, não sei qual delas, ele partiu, consegui desembaraçar-se dos meus abraços, e

Nunca mais o branco fumo dele nos meus lábios,

Nunca mais

Porquê?

O silêncio pergaminho das suas mãos no meu rosto,

Nunca mais a voz desajeitada dele no espelho da casa de banho, irritava-me

Vens jantar logo, meu querido?

Irritava-me

Três torradas chegam, meu querido?

Assim não, assim sentia dentro de mim uma escada rolante em direcção ao poço profundo da tristeza, irritava-me

Querido

Sim, diz?

Querido, logo chegas cedo a casa?

E apetecia-me gritar, não regressar, nunca, irritava-me

Sim, diz?

Que coisa... a tua...

Os navios em fúria de apitos, amontoavam-se à porta de casa, lá dentro, eu e ele, tentávamos esconder as amarras dentro da gaveta da cómoda, eles cá fora, gritavam

Porquê?

Eles cá fora pareciam um exército de mendigos, procuram-nos como quem procura o vento antes de levantar âncora, o veleiro poisava-se sobre um banco de areia, rodopiava em pequenos círculos... e dali não zarpava nunca,

Porquê?

Os marinheiros famintos, o azedume dos versos que o poeta louco tinha deixado sobre a mesa-de-cabeceira no quarto da amante voavam porque o vento que antes se fazia sentir no corredor começou aos poucos a avançar em direcção ao quarto, a amante tinha desaparecido, ele e o amante, também desaparecidos, apenas os famintos marinheiros enrolados em poemas de “merda” que o louco poeta ante de suicidar-se tinha esquecido, tal como a janela aberta

Porquê? Esta chuva de papeis com pequenas palavras...

Os marinheiros

Porquê?

O poeta louco

Onde está ele?

A amante do poeta louco

Irritava-se com as palavras do seu amado, algo de destruidor, abracei-me a ele, e com toda a minha força

Porquê?

Porque hoje é Domingo, porque hoje há quitetas e cerveja Cuca...

Porquê?

Porque uivam os navios quando estão em sossego?

 

 

(não revisto – ficção)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 25 de Agosto de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:22

foto de: A&M ART and Photos

 

Tinhas-me prometido o sono

o sossego

e o negro

que alimenta a noite de ti,

 

tinhas-me prometido o silêncio

e as pequenas árvores do bosque

perto

antes do amanhecer acordar e levar-te,

 

Tinhas-me a mim

e trocaste-me por um velho espelho recheado de ranhuras...

tinhas-me prometido o desejo

e apenas cacos e pedaços de beijos sobejaram sobre a mesa da sala,

 

tinhas-me e nada de ti era a verdade

nunca tivemos manhã

nunca existiu em nós alegres madrugadas...

tinhas-me e deixaste-me fugir pela fechadura do medo,

 

tinhas-me prometido o prometido

as palavras que escrevo

que tenho medo de escrever e

as palavras vorazes como um rio em ti perdido,

 

tinhas

tinhas-me prometido o sono

o sossego

o desejo,

 

(e o negro

que alimenta a noite de ti)

 

tinhas-me prometido o fogo

e todas as lareiras de todas as bibliotecas das casas abandonadas

tinhas-me

e deixaste-me suspenso no tecto da insónia...

 

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 25 de Agosto de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 14:19

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