Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

07
Set 13

foto de: A&M ART and Photos

 

não sei como são as tuas manhãs de solidão

quando acordam os vidros embalsamados pela escuridão do corpo suspenso no tecto da paixão

não sei como és quando descem sobre ti as mandíbulas ensanguentadas do orgulho

quando o mar entra na tua mão

e no peito

uma âncora de prata alicerça-se como um cogumelo encarnado

voando sobre os cinzentos teus seios de flor apaixonada

não sei como são as tuas tristes manhãs de solidão

se és branca

escura

alegre abelha de silício

procurando a colmeia do púbis em madrugadas embriagadas

 

não sei como são os barcos onde nasceste

viveste

brincaste com os meus olhos debaixo das mangueiras de papel

e tínhamos dentro de nós

o frio congelado dos beijos nunca dados

inventávamos tardes numa sanzala de cartão

e chapinhávamos nos charcos de incenso

as doces pernas da infância

brincávamos

e em beijos

ouvíamos os meninos que dormiam sobre um colchão de palha castanha...

e chovia e dormiam e choviam coloridas imagens de triângulos equiláteros

 

eu procurava nos teus seios ainda por descobrir o cosseno dos teus abraços

e tu

calculavas a tangente do sémen que um dia apareceria nas equações húmidas diferencias

que de um caderno quadriculado saltitavam como pigmentos de resina depois da despedida noite em lençóis de Aspirina derretida

éramos tontos vagabundos de areia

apaixonados loucamente e literáriamente vestíamos personagens magoadas pela ausência do Pôr-do-Sol...

não sei como são as tuas manhãs de solidão

porque a noite rende-se à porta de entrada

onde moram as tuas loucuras fantasias dos telhados em zinco

uma sanzala chorava

eu chorava...

e tu dizias-me que o cacimbo tinha levado o meu triciclo e eu e eu acreditei

 

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 7 de Setembro de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:34

foto de: Francisco Luís Fontinha

 

(dedicado ao amigo Zeca Gaspar)



Se sentes a pulsação do sol não digas que estás triste, inventa riscos traçados nas paredes das nuvens envergonhadas, inventa desassossegos nos cansaços das caravelas teus olhos, hoje, encerrados como quatro paredes de uma cela com meia dúzia de grades em papel colorido, inventavas traços nas costas dos morcegos, inventavas sílabas na língua dos socalcos inclinados descendo o Tua... e ao longe, o verdadeiro apito da vida, as tuas mãos que seguravam as escadas em direcção ao Céu, as tuas mãos, iguais às minhas, iguais às de tantos outros camaradas... acreditávamos que era possível vencer a insónia, o cansaço e a fome, como tantos outros, tudo demos, e tufo fizemos, se sentes a pulsação do sol, tu, amigo, não fiques triste pela ausência da luz vestida de marinheiro, não fique triste amigo

(prisões de chocolate com sabor a melancolia)

E no entanto, tu, eu, acreditávamos no sonho, na saudade, na literatura e nos automóveis com nomes esquisitos

Dizias-me... Isto é um Lada... e

E nas árvores com pássaros coloridos por diversos artistas, por diversas mãos, como as de há pouco, pequenas, silenciosas, e meigas, em chocolate, em porcelana, em...

E subíamos e descíamos, ruas e becos e montanhas, e nunca, e nunca

Adormecíamos, e nunca, e nunca

Éramos vencidos pelo cansaço, pela vergonha, ou

Dizias-me... Isto é um Lada... e ao longe, o comboio subindo o Douro, ofegante, na mala do carros a propaganda misturada com inocência, misturada com a saudade, misturada com os sonhos, os mesmos sonhos que ainda hoje, uns mais do que outros, acreditam, acreditamos, e tu? Onde estarás agora, logo, e pela madrugada? Andarás a segurar as escadas sonâmbulas onde eu timidamente, como medo de tombar sobre as pedras íngremes do medo... eu... subia, subia

Não tenhas medo pá, ninguém nos bate!

Claro que não, claro que não, respondia-te sempre com todo o respeito que merecias, mereces... e continuarás a merecer, como continuará suspenso na parede da minha biblioteca o quadro que me ofereceste, autografaste... e quando te encontrar, talvez

(prisões de chocolate com sabor a melancolia)

Se sentes a pulsação do sol não digas que estás triste, inventa riscos traçados nas paredes das nuvens envergonhadas, inventa desassossegos nos cansaços das caravelas teus olhos, hoje, encerrados como quatro paredes de uma cela com meia dúzia de grades em papel colorido, inventavas traços nas costas dos morcegos, inventavas sílabas na língua dos socalcos inclinados descendo o Tua... e ao longe, o verdadeiro apito da vida, as tuas mãos que seguravam as escadas em direcção ao Céu, as tuas mãos, iguais às minhas, iguais às de tantos outros camaradas.. porque a vida é isto, entramos uns dentro dos outros... e depois...

Depois...

Simplesmente... partimos.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 7 de Setembro de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:09

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