Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

24
Ago 14

Da hirta saudade que a terra entranhou,

a embrionária canção de amar nos braços da tempestade,

a planície se afunda no húmus cansaço do amanhecer,

um olhar se perde,

uma palavra se reinventa na ardósia sangrenta da tarde,

uma árvore se deita,

e uma janela se encerra...

as ranhuras do corpo embalsamado são transparentes anzóis de metal,

e a chuva miudinha cai sobre as pálpebras pinceladas do amor,

uma ravina revoltada,

deixa afundar o cadáver da flor desgovernada,

da hirta saudade... a terra que me deixou partir!

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 24 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 18:57

23
Ago 14

Procurava nas penteadas espigas de milho,

o sabor amargo de amar,

deitava-me sobre o chão frio do granito ensanguentado da eira,

pincelava o luar de madrugada,

e procurava...

adormecia sem o perceber,

porquê?

e se era aquele o momento de o fazer!

o sino ouvia-se ao longe,

o horário deixou de fazer sentido,

tal como o calendário,

procurava... e nunca as encontrava...

 

As chaves do espigueiro telintavam numa algibeira furada,

que servia de esconderijo a um corpo emagrecido,

cansado,

e ferido...

 

Havia lágrimas nos olhos das frestas do espigueiro,

a madeira envelhecida... rangia... parecia um homem desiludido com a vida,

acordavam-me para o jantar,

e fazia de conta que não ouvia...

nem sentia...

o vento soprar,

e eu procurava... e ele em pequenos círculos... me abraçava,

acreditava que das pálpebras dos pinheiros fugiam as estrelas em papel,

acreditava que à resina regressavam as plumas fluorescentes das meninas de cartão...

e nunca vi o mar acorrentado ao granito ensanguentado da eira,

nem os barcos, nem os marinheiros com odor a sexo,

e no entanto... havia uma mulata que dançava na eira só para mim,

 

O zinco da sanzala gritava,

e um menino em calções chorava grãos de pólen,

não havia abelhas para me consolarem...

nem... nem mangueiras sombreadas nas mãos dos mabecos enfurecidos com o meu sorriso,

 

Bufunfa...

o kimbundu poético da paixão dos pássaros,

o voo silencioso dos dentes de marfim sobre a mesa da sala de jantar,

uma ténue luz que iluminava o capim que jazia nas bermas da estrada,

caminhava, caminhava... e não tocava no granito ensanguentado da eira,

brincava com os papagaios de papel inventados nos seios de um coqueiro,

cintilavam em mim as gazelas, os elefantes... e ao meu lados os entristecidos marinheiros...

e procurava...

adormecia sem o perceber,

porquê?

e se era aquele o momento de o fazer!

Levantar-me do chão frio do granito ensanguentado da eira.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 23 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:33

22
Ago 14

Há uma janela neste jardim da insónia,

um coração de palha com braços de aço,

um pássaro com vontade de amar,

há um vidro em estilhaços,

uma parede que ruiu...

há no olhar do amanhecer um falso sorriso,

uma rua em lágrimas,

em mim,

há uma janela, há uma janela com lábios de mar,

um paquete desgovernado...

tão triste, tão triste que não consegue olhar as amendoeiras em flor...

que habitam esta cidade enfeitada de amor,

 

Há uma janela com cortinados de dor,

uma cama suspensa nos rochedos de amar,

há um homem prisioneiro nas gaivotas de voar...

 

Há um solstício...

um cadáver vestido de sofrimento,

um velório, um velório de alegria,

há uma janela neste jardim da insónia,

um corpo mergulhado nas ervas daninhas...

uma multidão que grita,

e vomita...

palavras, frases, e árvores caducas,

há um jardim pertença de uma fotografia,

há um solstício...

em monotonia,

na janela da insónia...

 

 

Francisco Luís Fontinha - Alijó

Sexta-feira, 22 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:24

21
Ago 14

Amar-te,

simples como és,

bela,

que vagueias entre as nuvens e o sol,

que transportas nos lábios uma fina película de desejo,

bela,

simples como és...

onde habita no teu corpo uma caravela,

esperando as minhas mãos de vento,

amar-te,

simples... simples como és,

mulher, amante... companheira,

 

Bela,

dos jardins roseirais com plátanos de papel,

Amar-te,

simples como és...

 

simples como eu sou!

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 21 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:10
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20
Ago 14

Perdi todas as imagens que o cansaço foi poisando nos meus ombros,

Destruí as fotografia onde habitavam os meus cabelos,

Perdi-me na escuridão, fiquei por aí…

Como um sonâmbulo invisível,

Vestiram-me de palhaço,

Fui trapezista…

E de circo em circo,

Construí no meu olhar os fios de seda do amanhecer,

Quis voar… quis ser avião, pássaro…

E hoje sou um cubo de granito,

Com correntes de aço,

Com boca de palhaço…

 

 

Perdi todas as imagens que trouxe num caixote em madeira,

Sem destinatário,

Sem terra para aportar…

Acreditei ter nascido no mar,

Sou um apátrida, sou uma sanzala de algodão,

Com dentes de marfim…

Sou capim,

Cacimbo,

Embondeiro…

Sou… sou tudo aquilo que nunca quis ser,

Marinheiro,

Paquete, poeta… poeta com as calças na mão!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 20 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:01

19
Ago 14
publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:50

Cintilava na fragrância manhã o beijo desassossegado,

Tinha na algibeira alguns grãos de pólen,

Quatro ou cinco abelhas…

E um sorriso nos lábios pincelados com o desejo,

Havia no seu olhar uma pequena cabana,

Junto a ela… uma ribeira, e uma cama,

Cintilava na fragrância manhã o beijo…

Quando da montanha começaram a ouvir-se os sons poéticos da madrugada,

Toda a aldeia iluminada,

O beijo desassossegado… dançou, brincou…

E quando a mulher onde ele habitava foi à janela…

Viu… viu outros beijos iguais aos dela, correndo para o mar…

 

 

E,

E ela percebeu que todos os beijos desassossegados,

São caravelas,

São a saudade entranhada na fragrância manhã,

(Cintilava na fragrância manhã o beijo desassossegado,

Tinha na algibeira alguns grãos de pólen,

Quatro ou cinco abelhas…)

E um sonho para acordar!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 19 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:45

18
Ago 14

Imagino o teu corpo uma límpida folha de papel,

Lapidá-lo com as minhas mãos todas as palavras,

As possíveis…

E as impossíveis,

Meus Deus…! Tenho tanto onde escrever…

Imagino os teus lábios ao acordar,

(Húmidos, tranquilos como um veleiro à deriva no mar),

Suspensos nos meus, como se fossemos dois triângulos interlaçados no infinito,

Imagino os teus seios fundeados no meu peito,

Sem pressa de zarparem,

Esperando que regresse o amanhecer,

Esperando que eu termine de escrever,

 

 

(só… só não consigo imaginar,

O que tu imaginas com as minhas mãos de brincar…!)

 

 

Imagino o teu olhar,

Escondido na sanzala dos gritos,

Uns dias quer voar…

Outros…, outros deseja poisar no silêncio nocturno dos pássaros,

 

 

(só… só não consigo imaginar,

O que tu imaginas com as minhas mãos de brincar…!)

 

 

Imagino os teus gemidos dançando na seiva embainhada,

Como uma jangada,

Como uma palavra…

Imagino os teus cabelos suspensos na alvorada,

Livres,

Tão livres como o pensamento…

 

 

Imagino o teu corpo uma límpida folha de papel,

Lapidá-lo com as minhas mãos todas as palavras,

As possíveis…

E as impossíveis,

Meus Deus…! Tenho tanto onde escrever…

(só… só não consigo imaginar,

O que tu imaginas com as minhas mãos de brincar…!)

Imaginar…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 18 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:02

17
Ago 14

Há nesta árvore nua e ensonada,

uma vida sem alma,

um corpo fusco com odor a embriaguez,

há nesta árvore um sorriso,

uma varanda com fotografia para o mar,

o silêncio é contagioso,

doença que invade o alicerçado enforcado...

o homem que inventa tristezas,

o homem que escreve insónias,

há nesta árvore estórias,

madrugadas sem nome,

o homem...

o homem das asas negras,

esperando o regresso da jangada de granito,

ele não resiste,

e insiste...

desenhar na tempestade o infestado grito,

há...

há nesta árvore nua e ensonada,

um poeta em chamas..., um poeta que arde na fogueira...!

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 17 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:29

Embrulhados em pura lã virgem,

acordam os lábios do entardecer,

há uma estrela que finge viver...

há uma estrela amarga voando em direcção ao mar,

uma mão que se esconde na neblina,

uma mão com olhos de menina,

embrulhados,

acordam...

os fictícios beijos de papel,

uma sombra que se esquece de adormecer...

na cidade dos coqueiros envergonhados,

nos lábios..., nos lábios embrulhados!

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 17 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 17:54

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