Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

31
Out 14

Olho-te como se fosses um falso espelho

semeado no centro da cidade

olho-te e no teu silêncio há um poema embrulhado em tristeza

sofres

sofres sem dizeres nada

olho-te e não sei a cor do teu sorriso

se tens dores

se...

se preferes sentir o mar

como fazíamos no Mussulo

davas-me a mão e eu sonhava...

hoje... hoje sentes a minha mão e tu constróis lágrimas em papel...

lá fora dança o vento e tu voas como voam os suspiros invisíveis

geme uma árvore

ouve-se o rosnar fervoroso dos automóveis embalsamados

ouvem-se as migalhas de dor correndo montanha abaixo...

lá fora as minhas veias são cinza de cigarro

após cigarro

olho-te... olho-te e não me canso de te olhar

como nunca me cansei dos teus lamentos

olho-te e percebo como eram lindas as sanzalas de Luanda...

e os barcos acorrentados a braços de gesso

sofres

sofres sem dizeres nada...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 31 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:18

Com a participação de Francisco Luís Fontinha.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:44

30
Out 14

Toco-te sem saber que não sentes o meu silêncio

toco-te sem perceber que há dia nos cortinados do teu olhar

sentamos-nos

e descubro que na tua mão de lágrima

vive uma abelha

triste

e cansada

toco-te fingindo que no teu corpo existe uma cidade por descobrir...

deserta, só

toco-te sem saber que não sentes o meu silêncio...

que a minha ausência vestida de negro

é apenas um pedaço de cansaço semeado no teu ventre...

 

O veneno

o veneno que há em ti

comestível nas tardes de solidão, à janela

desenhando o que é impossível de desenhar...

porque os círculos da paixão se evaporam nas pedras em combustão

e na geometria... o amor não tem significado

é absorto

é... é mais uma ruela sem saída

o veneno

o veneno que se alicerça aos teus seios

e...

e não te deixa adormecer,

 

Toco-te sem o saber

porque deixei de observar as tuas algas

e esqueci que nesse rio onde andavas...

ninguém hoje sabe que o teu corpo lhe pertenceu

foste abraçada

foste... foste amada

pensavas que havia rochedos de insígnias

quando apenas...

nada

quando apenas uma quadriculada palavra... invadiu as tuas coxas

absorveu-as... e hoje são um esqueleto de vento

em pequenos quadrados suspensos nos lábios de um marinheiro...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 30 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:45

Este Outubro de desengano

como um rio sem cidade

os pássaros felizes

os pássaros... os pássaros sem vaidade

poisados nos teus ombros silenciados

este Outubro desgraçado

que vive nos meus cabelos

voando

voando...

voando sob o tecto da saudade

este Outubro sem palavras ou versos

este Outubro suspenso na cárcere invisível

que não sabe

e ignora

o outro Outubro cinzento

aquele que mora

no bairro banhado de lata

este Outubro que se entranha em mim

como um tentáculo de espuma...

este Outubro... foi assim...

comi flores de papel

pintei lágrimas no teu olhar

este Outubro que chora

e nunca viu o mar.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 30 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:49

29
Out 14

Esqueci o meu nome enquanto dormia nesta seara de insónia,

levemente me batia,

o vento inanimado...

cansado de trabalhar,

esqueci o meu nome nos livros da paixão,

desenhei corações nas entranhas da solidão,

esqueci o meu nome nas ruas de uma cidade,

também ela,

também... também eu...

sem nome,

sem... sem idade,

na calçada da liberdade,

 

Caminhei sobre o amarfanhado mar,

como um vampiro em chocolate,

deitei-me no chão,

dormi na seara da insónia...

esqueci o meu nome nas estrelas de cartão,

não sei se estou vivo...

não sei... não sei se hoje há vertigens na minha mão,

enquanto embriagado me encosto ao xisto muro,

não seguro,

o perfume silêncio em volta dos teus seios de rochedo cinzento,

não me calo...

não... não me contento,

 

Esqueci o meu nome nas andorinhas de veludo,

voei como voaram os meus sonhos...

hoje... apenas pedaços de sombra,

e aço enferrujado,

não me calo, não... não tenho medo do amor impossível,

esqueci o meu nome,

esqueci...

nas arcadas do infinito,

não seguro,

não... não me contento...

e no entanto,

sou feliz sem nome... sou feliz sem estória...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 29 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:46

Esta espingarda de amar

que vive sem matar

não há bala nem canhão

que se alicerce no teu coração,

o amor travestido de socalco

descendo a montanha do adeus

o rio... longe

o rio come

e alimenta

este corpo descalço

um desenho pintado no ar

um suspiro... um suspiro pronto a disparar...

esta espingarda de amar

que vive sem matar

esta paixão quadriculada

sempre pronta para voar,

voar... voar na madrugada.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 29 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:49

28
Out 14

Os relógios enferrujados

encolhidos nas tristes alvenarias

as janelas escondidas...

no olhar da serpente

 

as estilhas adormecidas

nos pregos dentados

os relógios... os relógios encalhados

em rochedos rendilhados

 

o pólen de um olhar

semeado na escuridão

e os relógios sem fôlego

e os relógios... e os relógios sem pão

 

e a paixão?

matriculada nas putas avenidas

correndo

saltando... os muros embriagados dos ossos embalsamados

 

os relógios...

escrevendo na pele da solidão

horários enlouquecidos...

sem vontade de sonhar

 

sonhar a paixão?

há cadáveres perdidos

na eira da infância...

colchas de linho... suspensas nas árvores tombadas no chão.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 28 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:45

cínicas palavras de aventura

estas

que se suicidam nas árvores da madrugada

mendigas folhas em papel colorido esvoaçando sobre a cidade

estas

de ternura

encurraladas na negra sanzala

corpo crescente em rochedos húmidos

quando do cansaço acorda a gente

e na gente...

um punhado

de trapos...

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 28 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:44

27
Out 14

Sem pressa de caminhar sobre as nefastas palavras de chorar

o fogo das tuas mãos que iluminam esta cabana de chita

o teu sorriso... impregnado no meu silêncio...

enquanto me recordo em frente ao espelho da solidão

sou um vadio navegante

deixei de saber como era

quem era

apenas recordo algumas das imagens

muito sombreadas

como uma nuvem de carvão

voando em direcção ao mar

sem rumo... sem... sem luar,

esta esplanada de incenso

que durante anos arde no meu peito

o odor da tua pele nas paredes em lágrimas

a janela amortalhada

quase a esquecer-se da minha existência...

permaneço neste barco

em círculos

em quadrados imperfeitos

gaguejando

às vezes

às vezes sem perceber porque o meu corpo se evapora ao anoitecer

sem rumo... sem... sem luar,

sem palavras para escrever...

sem pressa de caminhar

vivo e habito nos teus lábios prateados

vivo e habito nos teus seios... como desejos parvos

sem cigarros no tecto da insónia

vivo e habito

em círculos

em quadrados imperfeitos

em parábolas moribundas

e cansadas...

como eu

sem rumo... sem... sem luar!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 27 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:37

26
Out 14

Habito este túnel íngreme dos ossos argamassados

pareço um sonâmbulo diplomado

sem braços

sem pernas...

sem... sem sonhos

habito esse teu corpo desgraçado

sobrevoando a minha sanzala

sombreando o pecado,

habito este túnel desgovernado

galgando as montanhas da solidão

gritando

gritando... “o amor é uma roda dentada com dentes enferrujados”,

ai estes sons que se entranham nas minhas asas de plátano envelhecido

este túnel sem luz

ou... saída para o infinito

habito

em ti

como se fosses uma gaivota poisado junto ao Tejo

me olhando

me dizendo... “o amor é uma roda dentada com dentes enferrujados”.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 26 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:22

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