O triste enigma dos oceanos de cartão,
o vulcão da saudade mergulhado numa áspera lâmina de solidão,
espera-se o regresso, e o viajante sem destino... nos aplausos do silêncio,
há um circo de esperança rodopiando sob o tecto de lona da insónia,
pergunto-me porque choram as árvores de papel,
percebermos que há no seu coração uma enxada de silício,
uma roda dentada em putrefacção, perdidamente... percebermos a sinfonia dos horários obscuros,
há um Deus com esqueleto de xisto...
e de socalco em socalco,
desassossegado... suspensas as mãos em corpos de espuma, grita comigo,
absorve-me como se eu fosse um travestido cansaço com dentes de marfim,
no telhado de uma camponesa com saliva nas pálpebras,
sei que há na cidade dos pequenos charcos de doirado sangue,
uma menina com duas rectas paralelas procurando o infinito,
e sinto,
o pulsar das laranjas rochedos abaixo,
alguém escreve nos meus braços os rancores de uma tarde inexistente,
uma carta secreta com desenhos abstractos... ainda permanece na minha algibeira,
existe nela um estranho perfume com odor a dor,
o viajante desalojado carrega os livros do sofrimento,
entra num bar, senta-se... senta-se à minha frente e dou-me conta que ele é apenas um espelho fusco, negro... alguém escolhido pelo comandante do navio das indolores pinturas.... diz que me ama,
não amo, não quero amar... e não desejo que me amem,
preciso de fugir desta sanzala com olhos de incenso,
deitar-me dentro do vulcão da saudade, sentindo nas minhas veias o palpitar dos azulejos pintados à mão,
tenho medo de ti quando entras no meu quarto e me perguntas pelos malmequeres,
e não tenho coragem de dizer-te que os perdi, destruí-os pensando que eram soníferos indefesos,
pensando que eram apenas sombras de água...
como tens passado, enigma dos oceanos de cartão?
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 17 de Outubro de 2014