Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

08
Jan 15

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

 

 

Entras-me em casa

e aposentas-te nos meus braços

escrevo palavras nos teus olhos

vagueio sobriamente nos teus seios

entras-me em carta como se fosses uma carta

lembras-te?

daquelas onde desenhavas corações

flores

e eu?

círculos e quadrados,

equações,

a cidade arde no sexo desejado

o amor alicerça-se à sombra do teu corpo

e eu?

um acorrentado,

morto.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 8 de Janeiro de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:45

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

 

 

O lavatório permanecia triste, havia uma sombra ensanguentada de lágrimas,

Não percebi,

No espelho, o meu rosto desintegrava-se como se eu fosse um cometa, um pedaço de cartão, ou... ou uma caneta escondida numa mão, um muro sólido, robusto... um pulmão quase a rebentar, e os cigarros dançavam sobre os meus ombros, e as palavras atrapalhavam os meus sonhos,

Não percebi, as ratazanas nos cinzeiros de prata, esqueletos de cigarros esperando a chegada do cangalheiro, e no cemitério alguém perguntava

Morreu de quê?

Porra,

E no cemitério alguém perguntava se as cidades são os esconderijos do amor, se as ruas são os sorrisos de uma qualquer flor, e que não, pode lá ser, respeitadamente respondi-lhe

Morreu,

Morreu enquanto olhava a tristeza do lavatório e tentava conversar com a sombra ensanguentada de lágrimas, nada mais do que isso,

Isso... o quê?

Trazia um casaco bordado com lantejoulas, durante a noite sentia-me o palhaço mais pobre do circo da minha aldeia, nunca tinha poisado a minha mão na neve,

Mãe... o que é a NEVE?

Morreu de quê?

Porra,

No espelho, os alicates da saudade suspensos no olhar da madrugada, uma canção voava sobre os telhados de silêncio, não,

Medo?

Nunca tive medo...

Não, nunca tinha tocado na neve, não, nunca tinha sido aliciado pela geada em plena madrugada, e o feiticeiro dos barcos plastificados gritava

Morreu...

E o barco não flutuava, lançava-me ao tanque público... e mergulhava para salvar o meu barco plastificado, e percebi

Não

E percebi que tinha sido enganado, este maldito barco nunca sairá deste tanque sem nome, nómada, anónimo

Como eu?

Sim como eu,

Sim... sim como tu,

E hoje, sinto saudades do lavatório de ferro... e rangem as suas tenras pernas recheadas de reumático, como rangiam os meus dentes quando a geada comia a madrugada,

Medo?

Não, nunca tive medo...

Mãe... o que é a NEVE?

Morreu de quê?

 

 

(texto de ficção)

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 8 de Janeiro de 2015

 

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:38

uma caneta no silêncio da noite

vagueia na mão da liberdade

beija palavras

e abraça-se aos desenhos que só as paredes de um olhar

conseguem projectar

na madrugada de uma cidade…

não há covarde

ou idiota

… ditador

cabrão…

que com uma espingarda

ou canhão

consiga amedrontar

a palavra

disparada

pela caneta no silêncio da noite!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 8 de Janeiro de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 18:41

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