Vivíamos como dois círculos
Descendo a madrugada
Tínhamos no olhar
Todas as palavras do Universo
O corpo
Teu
Fervilhava entre duas rectas transversais
As paralelas sombras dos teus seios
Em cubos de medo
Quando a mão te acariciava
E da mão
A húmida esfera de sémen
As gaivotas pinceladas no teu ombro esquerdo
Voávamos nas montanhas do abismo
O exílio da luz
Que as tuas coxas absorviam
Nas imagens prateadas
Encarceradas num cinzeiro de vidro
Escrevia-te uma carta
Esquecia-me das palavras
Respondias-me
Nada
Como poderias responder-me
Se a cidade se tinha transformado em morte
Camuflada nas ruas e avenidas dos teus gemidos
O carteiro dizia-me…
Respondias-me
Nada
O carteiro respondia-me que hoje
Nada
Como poderias responder-me
Se deixaste de ter alvorada
Secretária onde escrever
E papel
Ardeu
Na tua boca em baloiços beijos
A loucura atravessava a cidade
Vivíamos entre cartas
E
E desenhos de chocolate
Em finas películas
Dormindo na tua pele
Domingo
A cancela do desejo
Encerrada
Reabrimos amanhã
Hoje
Nada
Papel
De parede
Com olhos de centeio
O vento abraçava-te e tu
E tu Domingo
Sem fala
Escondida nos barcos clandestinos da saudade
A água nas pétalas do teu sorriso
Tínhamos
A vida na vida
E a vida em papel
Hoje
De parede
Enferrujados poemas no púbis da maré
A casa inanimada
Dói-lhe?
Sem resposta
Nada
Sem fala
E tu Domingo
Suspensa no calendário da solidão…
Uma criança de luz
Nos teus braços
Fim.
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 3 de Abril de 2015