Nada me resta neste condomínio fechado,
Esculpido nos muros com esqueletos de xisto,
Brinco com uma bala em direcção à morte,
Sinto o peso da tua mão poisada no meu ombro,
Pareço uma janela sem cortinado dançando ao som do vento,
Este navio em pequenos círculos,
Quadrados,
Parábolas loucas na ardósia da tarde,
Imagino-te vestida de rosa doirada,
Imagino-te sentada na clareira da madrugada,
Triângulos de insónia
Adoçando o teu olhar de andorinha,
E nada, nada me resta nesta montanha suicidada…
Perdi as árvores, perdi as rochas e a sombra das árvores,
Tenho dentro de mim um hipercubo doente…
Não tem coração,
Tenho dentro de mim os fios de nylon das redes transparentes do sonho,
E não tenho sonhos para te descrever,
Invento sonhos,
Invento personagens nas finas lâminas do desejo,
Invento, imagino-te sem nome, e nada… me resta… e nada me resta neste condomínio fechado,
Não me interessa se tens no sorriso um lençol de linho, não me interessa se tens nos lábios os socalcos afogados no Douro,
Não me interessa se navega no teu ventre um barco Rabelo…
Ou uma bandeira sem Pátria,
E nada,
Deixei de amar os livros, deixei de pertencer aos tristes mendigos da cidade em combustão,
Deixei de amar o amor, deixei de amar o mar… e as palmeiras filhas do mar,
Agora, sento-me numa velha esplanada, escrevo o Tejo sobre a simples mesa de plástico,
Pego num café, puxo de um cigarro envenenado pela tua boca,
E escondo-me da luz, e escondo-me das imagens prateadas projectadas nos alicerces da memória,
Fujo, escondo-me, e nada…
Apenas lágrimas confusas descendo o meu rosto de granito,
Grito,
Grito como se eu fosse uma noite de luar,
Grito como se eu fosse um comboio desgovernado…
Contra a carruagem da saudade.
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 26 de Agosto de 2015
(Francisco Luís Fontinha – Agosto/2015)
Conheci-te numa noite de aniversário,
Percebi que havia uma janela no teu sorriso
E uma clarabóia no teu olhar,
Depois… depois perdi-me nesta cidade apaixonada,
Vesti copos de uísque,
Bebi vestidos de chita,
Fumei poemas junto aos teus seios,
Mergulhava na plataforma irracional dos teus braços,
Escrevia nos teu beijos as palavras que nunca consegui escrever no papel amarrotado,
Desenhava no meu espelho as gotículas ínfimas do teu suor,
Afagante desejo,
Descerrava a porta dos teus cabelos,
Lapidava as tuas coxas no meu silêncio…
E acordava junto aos teus lábios,
Tão feliz… tão feliz meu amor,
Este poema sem nome,
Ouvindo a tua voz esquecida dentro de um livro,
Agachada na madrugada,
Este poema pobre,
Mendigo…
É a réstia das carícias fabricadas dentro de um rio,
Esquecia-me de ti, meu amor,
Sonhava com melódicos sons que apenas a morte sabe descrever,
O último grito,
Gemido…
A dor
Do teu prazer.
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 26 de Agosto de 2015
Desenho o sono na almofada do sofrimento,
Pego nos sonhos…
E espalho-os sobre a areia límpida da terra queimada,
Que saudade do cheiro da infância
Correndo no Mussulo,
Que saudade da chuva e do cacimbo…
As mangueiras voavam sobre mim,
Inventava palhaços de pano e triciclos de papel,
O vento embrulhava-se neles,
Eu acorrentava-me às mãos do silêncio,
Desenho,
Desenho o sono na almofada do sofrimento,
Pego nos sonhos…
E escrevo-te estas palavras que roubei às tuas fotografias,
Depois veio a tempestade,
O sono que era apenas um desenho, hoje, hoje é um amontoado de destroços baloiçando no mar,
O barco que nos trouxe morreu,
Os marinheiros, alguns, alimentam-se da sombra num qualquer engate na cidade das gaivotas,
Os cigarros do Tejo… esperam o meu regresso,
E um dia, e um dia regressarei aos teus braços, meu amor.
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 25 de Agosto de 2015
Palavras para o amor
Que ama as palavras,
Os beijos incendiados nos lábios das estátuas,
Os cabelos dançando no jardim coberto de espuma,
Os bancos em madeira sentados sobre os meus joelhos,
E ao longe, o silêncio do desejo construindo lágrimas de algodão…
Sinto nas minhas veias a esfera da saudade
Caminhando sobre uma lâmina de cartão,
É tão triste esta cidade,
É tão triste a solidão,
Palavras para o amor
Que ama as palavras,
As belas, as belas e todas as outras… belas,
São palavras,
São elas que me alimentam e iluminam quando regressa a noite do teu olhar,
São elas que me abraçam quando o vento bate no meu peito…
Alicerçam-se a mim,
E eu, e eu fico sem jeito,
Só, só neste jardim,
Eu, os bancos em madeira e as estátuas de alecrim…
E no final da tarde tudo é embrulhado no mar,
Zarpamos em direcção ao infinito,
Bebemos copos de sofrimento
Para não enjoarmos…
E esta ondulação enlouquece-me,
E faz deste barco uma jangada de tédio…
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 24 de Agosto de 2015