A álea manhã ensanguentada
Fugindo da madrugada,
Das sílabas amargas do poema inacabado
Suspenso na esquina da avenida na cidade inseminada,
O cansaço coração repatriado
Descendo a montanha salivar,
O visitante perdido
Procurando os lábios da paixão
Que só ele sabe desenhar,
O poder da morte brincando no mar
Arrastando barcos para a destruição…
Um cigarro esquecido na mesa-de-cabeceira,
O silêncio à volta da ribeira…
Correndo para o rio dos murmúrios,
Um pedaço de terra que chega
E sobra
Para cobrir o olhar da serpente,
A álea manhã ensanguentada
Fugindo da madrugada,
As fotografias da solidão
Dentro de um pequeno livro,
Procura-se o alívio
E o repouso do tempo monstruoso…
E a álea manhã
Sentada à janela,
Em gritos espasmos
Revolta-se contra o desleixo da noite,
O ciúme envergonhado
Na lápide do artista,
As palavras ternas na mão do viajante,
Fugindo da madrugada
E da gente,
Como nós defuntos
Abraçados aos rochedos da saudade…
Outro cigarro,
Outra morada anónima,
O machibombo engasgado nos alicerces da picada,
Não me apetece olhar-te,
Não me apetece alimentar-me da tua ausência,
E a álea manhã
Sempre pronta para me acorrentar
Ao peito da madrugada…
Francisco Luís Fontinha
terça-feira, 9 de Fevereiro de 2016