Ausento-me tantas vezes do meu corpo que até me esqueço que existo, verdade, tenho dias que não me pertenço, sou o nada, sou a sonâmbula madrugada vestida de ressaca, o triângulo equilátero suspenso na ardósia do medo, permaneço incrédulo, pasmo, ausento-me tantas vezes…, e nunca regresso ao ponto de partida,
Assim, então, és um desgovernado transeunte disfarçado de mendigo, assim, então, és a poesia trazida dos Oceanos do sono, porra, ignoras-te, sentes na pele a derradeira separação, o frio, a geada, as tardes enganadas em Vila Real, esperando tu, o quê?
Sete dias sem dormir, um bar quase a encerrar, e não tenho para onde ir…
Assim, então, és uma ratazana de esgoto, literatizes-te menino da geringonça, amordaçado pelo tempo,
Fui,
Fazes bem,
Ausento-me tantas vezes
Ontem veio a carta para pagar a electricidade, não tenho dinheiro para a pagar…, foda-se. Quarenta euros? Nem TV tenho, só se for a insuflável boneca que cá deixaste,
Parvo,
Parva,
Ausento.me tantas vezes, dias horas, minutos e segundos, são apenas palavras, palavras, palavras de nada…
Parvo,
De nada.
Francisco Luís Fontinha
Sábado, 5 de Março de 2016