o relógio nunca cessa de chorar
as lágrimas do mar parecem pálpebras envenenadas
nos socalcos da saudade
o rio esconde-se nas umbreiras do silêncio
como se fosse a fera amestrada do vento
sem sorrisos de vida
nas espalmadas marés do sono
o relógio vive
escuta os meus lamentos
enquanto lá fora alguém sofre
levemente andando pela cidade de algodão
e inventa sonhos
e pede-me pão
nunca se cansa de chorar
este triste relógio de corda
não sente a dor
não sente a morte
daqueles que partem e deixam de ouvir a Primavera…
e levam no coração uma pedra
do infinito abismo de habitar uma calçada
um corpo estranho
imbecil
e velho
o relógio nunca cessa de chorar
alegre
nas noites sem dormir
abre a janela amar
toca no cortinado amor
e envelhece esperando que o tempo o venha buscar
até que uma qualquer tempestade o obriga a parar…
Francisco Luís Fontinha
quarta-feira, 23 de Março de 2016