É noite. Todas as correntes de aço que aprisionam os teus cabelos estão suspensas num simples suspiro, oiço as palavras, lá longe, o enigmático silêncio das janelas de vidro, regressa a noite, a cidade arde nas mãos do sem-abrigo, uma nota de cinco euros voa nas esplanadas da solidão,
Tem lume?
Os candeeiros da paixão, emagrecidos, com fome, as ruas desertas antes de acordar a manhã,
Não. Não tenho lume!
As pedras enraivecidas, o ódio dos pilares de areia que abraçam os barcos da madrugada, os poemas famintos no corpo do poeta, está morto, esquelético, e sem palavras…
Lume não tenho. Cigarros não tenho.
É noite.
O chá e as torradas vulcanizadas nas montanhas das crateras ensanguentadas dos rochedos nublados, é noite; e sinto-me completamente colorido com o arco-íris das sílabas entre pássaros e vinhedos, e ao fundo, o magnifico rio da saudade,
Os cigarros,
As esmeraldas na algibeira do sem-abrigo, a barba quase toca no luar, o cheiro nauseabundo das ruelas sem sentido, os automóveis sibilados nos corredores da morte, e nada te desejo.
Francisco Luís Fontinha
Alijó, 27 de Janeiro de 2018