João espera e desespera a chegada de Sofia, a cama encostada ao fogão na cozinha, os pássaros, os pássaros sob o céu cinzento da quinta, a casa despede-se da manhã,
- “ faço tudo o que elas querem mas nunca tiro o chapéu da cabeça para que se saiba quem é o patrão”,
E Sofia não vem, nunca ao meu lado, desço à garagem e olho o barco que estou a construir e logo que pronto e logo que chegue a Sofia zarpamos pelos terrenos de Palmela em direção à noite,
Ela nunca ao meu lado,
- conto os pássaros da quinta, e hoje não quinta e hoje não pássaros,
E hoje,
Hoje não Sofia,
João espera e desespera,
O pai do João estacionado na clinica,
- “ faço tudo o que elas querem mas nunca tiro o chapéu da cabeça para que se saiba quem é o patrão”,
E percebo que nunca existiu nenhuma Sofia, e percebo que nunca existiram pássaros na quinta de Palmela, e percebo,
- “ faço tudo o que elas querem mas nunca tiro o chapéu da cabeça para que se saiba quem é o patrão”,
Eu sei pai, eu sei,
João espera e desespera a chegada de Sofia, a cama encostada ao fogão na cozinha, os pássaros, os pássaros sob o céu cinzento da quinta, e um livro a que A. Lobo Antunes chamou O Manuel dos Inquisidores…espera e desespera pela chegada de uma Sofia, espera e desespera pela chegada de um João…
Ao cair da noite.
(Inspirado e baseado no livro de A. Lobo Antunes “O Manual dos Inquisidores”)