84,1 x 59,4 – Francisco Luís Fontinha
A cidade tem os seus medos
Tem a noite
E portas e muitas portas
De saída
De entrada
Na garganta da cidade
As escadas para o sótão
A claraboia com vista para o tejo
Vão e vêm as sombras cansadas com as mãos na algibeira
Entram nas portas de entrada
Fingem que dormem
E os sexos embrulhados em papel de parede
Descem e mergulham no pavimento encharcado
À porta de saída
Uma minissaia presa a um candeeiro
À porta de entrada
Um magala à espera de um cigarro
E na rua junto ao rio
Um automóvel abraçado aos silêncios de Belém
Olha com desdém para a minissaia
E sorri ao magala
O magala entra e senta-se
E os silêncios de Belém
Acariciam-lhe as pernas até que a noite poise neles
E os misture num fumo branco de medo
E sémen
A cidade tem os seus medos
Tem a noite
E portas e muitas portas
De saída
De entrada
A cidade é uma merda.