(21 de Dezembro de 2012, 02:35 horas)
Não sobrou nada para nós, dizias que ele era um oceano de luz entre quatro paredes de vidro, mas ela não queria acreditar, o fim do mundo?
existe o mundo? Perguntava a minha avó quando subia connosco ao cimo da montanha, e olhando em redor,
tão grande o mundo,
e apenas uns miseres quilómetros quadrados, depois, o mar dentro das jangadas de xisto que deambulavam em circunferências concêntricas até desaparecerem no limite do pôr-do-sol quando o olhar da mulher que vivia no rés-do-chão direito, da rua da alegria, tendia para zero, confundia-se às vezes
mais ou menos infinito,
o fim do mundo espelhado no tecto da igreja abandonada pelas pessoas da aldeia, mentias-me quando chegavas a casa de dizias-me que vinhas da missa, eu, fingia acreditar e pensava
mas ele não é Ateu?
Não, sobrou nada para nós, ouvias-me fingindo que acreditavas em mim, perguntava-te
não acreditas em mim? Sorridentemente dizias-me Claro que sim meu querido amor, claro que sim, tão grande o mundo, as palavras, as azeitonas sobre a mesa da cozinha, completamente sós, abandonadas pelas mãos da minha avó, que subia connosco ao cimo da montanha, e olhando em redor
tão grande o mundo,
tão azul, tão, como diria o meu grande amigo, tão clandestino como as asas dos plátanos, ninguém, entre noites e muros de vedação, ninguém acreditava
acaba agora o mundo...
mas ele não é Ateu?
Claro que é, mas para efeitos normativos, para enganar a mulher, enquanto ela o espera
será que o espera?
Ele faz o sacrifício de todas as noites ir à missa deita-se de barriga para o céu e começa a contar as estrelas, e quando as fotografias da amante começam a colarem-se-lhe no corpo esbranquiçado de incenso, parte, para longe, e chega a casa
desculpa amor, o sacerdote chegou atrasado, e ela não queria acreditar, o fim do mundo?
acaba agora o mundo...
mas ele não é Ateu?
Não é, foi, agora é de todas as crenças, talvez alguns dos outros deuses lhe valham, e o fim do mundo
não acabou, vês meu amor querido,
e sinceramente eu não via nada, pesava-me a cabeça, cambaleava quando entrava em casa, ela esperava-me, ele esperava-me,
só agora, eles para mim,
e logo agora
e sinceramente eu não via nada, pesava-me a cabeça, cambaleava quando entrava em casa, ela esperava-me, ele esperava-me, e logo agora que fiquei sem cigarros, e logo agora
só agora, eles para mim,
a mulher, a amante da mulher, o sacerdote, o sacristão, e eu
Não sobrou nada para nós.
(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó