Roubas-me o sono, os sonhos, a vida de um miserável caminheiro, roubas-me as mãos e as palavras de pergaminho que o meu querido avô deixou ficar em cima da mesa na sala de jantar, gritavas comigo, roubaste-me as sanduíches de atum que estavam embrulhadas em papel de alumínio, a nota de cem escudos transformada em tubo com acesso ao centro da terra, roubaste-me
Roubas-me a clareza das imagens a preto e branco, pego nos óculos, abro-o e cessa em mim a transpiração, deixo de ter voz, deixo de ter cabeça com cabelos castanhos, deixo de ter olhos verdes, roubaste-me o sono, os sonhos, as imagens,
Um livro de atum,
E começava a pingar um líquido castanho, espesso,
Ouvia as tuas garras de aranha nos meus braços de arame quando o esqueleto da morte rondava a janela da sala de jantar, pegava nas sanduíches de atum, retirava-lhes religiosamente o papel de alumínio, e começava a pingar um líquido castanho, espesso, frio, vómitos, cansaços muitos, poucos, espesso
As imagens de ti,
Roubaste-me e roubas-me o sono, os sonhos, a vida, roubaste-me o jardim onde ela ao final da tarde se sentava, pegava num livro, folheava-o e estava ali até que caísse a noite, acordassem as estrelas, e todos os sorrisos da aldeia,
O nosso querido avô deixou ficar em cima da mesa na sala de jantar, gritavam connosco, roubaram-nos as sanduíches de atum que estavam embrulhadas em papel de alumínio, a nota de cem escudos transformada em tubo com acesso ao centro da terra, roubaram-nos
Os livros com sabor a uvas Moscatel,
As imagens de ti,
Espesso, áspero, cinzento, e notava-se uma saliência esquelética
Um livro de atum,
Nas pálpebras da lua, roubaste-me e roubas-me o sono, os sonhos, a vida, roubaste-me o jardim onde ele ao final da tarde se sentava, pegava num cigarro, acendia-o e estava ali até que caísse a noite, acordassem as estrelas, e todos os sorrisos da aldeia,
Amo-te sabes?
E nunca soube que os livros de atum eram embrulhados em papel de alumínio, espesso, castanho, pingava, ao cair a noite sobre nós, abríamos todas as janelas do jardim, sentíamos os plátanos de braços abertos à procura dos tentáculos de xisto com pequenas rosas encarnadas, roubei rosas para ti, escondeste-as
Dentro do livro de atum, era tarde, descias as escadas do sonhos, e tinhas acabado de perder o sono nos rochedos junto aos correios, pegavas-me na mão e
Gosto de ti sabes?
Nunca soube, espesso, castanho, a nota de cem escudos transformada em periscópio, e percebi que era isto o verdadeiro amor, transformada em tubo com acesso ao centro da terra, roubaste-me
Os livros com sabor a uvas Moscatel,
As imagens de ti,
Espesso, áspero, cinzento, e notava-se uma saliência esquelética
Um livro de atum, que deus o tenha, Amo-te sabes? Gosto de ti sabes?
Um livro de atum,
E começava a pingar um líquido castanho, espesso, e juro que não sabia, e juro que deixei de acreditar nas palavras embriagadas, deixei de acreditar nas sanduíches de atum que o nosso avô deixava ficar na sala de jantar em cima da mesa de vidro, um homem gordo dentro de uma caixa de madeira sorria-nos, tu
Tenho medo,
Amo-te sabias?
Nas pálpebras da lua, roubaste-me e roubas-me o sono, os sonhos, a vida, roubaste-me o jardim onde ele ao final da tarde se sentava, pegava num cigarro, acendia-o e estava ali até que caísse a noite, acordassem as estrelas, e todos os sorrisos da aldeia,
Amo-te sabes?
Espesso, áspero, cinzento, e notava-se uma saliência esquelética
Nas faces da lua.
(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó