Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

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Jun 13

foto: A&M ART and Photos

 

Um, depois dizes-me que adormeço enquanto ficas sentada a olhar-me, porque sabes que eu detesto que me olhem, porque eu detesto que se comportem comigo como se eu fosse uma estátua sobreposta entre a luz e multidão, entre homens e mulheres, em delírio, revoltos os cabelos semeados na planície obscura da sangrenta sinfonia em palavras ainda não escritas,

Gostas de mim?

Talvez, e um dia acordamos, e a noite deixa de padecer aos movimentos corporais das amendoeiras em flor, a cerejeira do quintal sem os significativos sinais vitais, deixamos de a ouvir durante a noite, e de queixume em queixume, optou pelo silêncio,

Não sei!

Gostas? Gostas... vá lá, diz-me?

Não sei o que são janelas quando aprendi em miúdo que das janelas só vinham bichos, ou serviam, nem sempre, para imaginarmos o mar pintado nos vidros, alguns deles, quebrados, outros, já tinham partido para longínquos lugares, apenas resistiram as escadas em granito, e todo o resto, morreu, a porte de entrada, sucumbiu numa noite de Inverno, cessou a respiração e daí em diante ficou entreaberta, nunca mais ficou de boa saúde e a fechadura em recusa pelas drageia receitadas pelo senhor Armindo, aos poucos... trocá-mo-la por um cordel que de baixo custo tinha tudo e de nada no servia gritarmos contra as paredes do compartimento dividido por meia dúzia de metros quadrados de chita, de uma lado ficava a sala de jantar, e do outro

Não sei...

E

Do outro

Gostas?

O meu quarto, com uma porta meio envidraçada, meio esburacada, com vista insuflável como os pneumáticos dos roncos automóveis quando regressava a gripe, quando eu ia à varanda, e nada, nem sombras rompiam pelas árvores que eu imaginava existirem, e que nunca passaram da minha imaginação, e do outro, do outro, um pequena torradeira servia-nos de aquecedor, e o Janeiro foi tão frio que quando acordei pela manhã, as escadas de granito eram lâminas de gelo, o o céu aprecia cinzento, e não nuvens hoje pela manhã, e aos poucos, descobri que até novas ordens estava acorrentado ficticiamente a uma mesa e a quatro cadeira, velhas, tão velhas que ouvíamos o caruncho mergulhar aos peixes do chafariz também ele, congelado, também ele, como eu, acorrentado, ficticiamente...

Não, não sei se gosto de persianas, também eu, ficticiamente existente, chorando, rindo, vomitando alimentos que não me recordo de os ter algum dia ingerido, tudo, e apenas, milagres da vida, da fé, e da alegria de viver numa casa acabada de morrer, e desde a morte da cerejeira, não sei

Talvez!

Penso que nunca mais comi cerejas, e hoje, sei que elas existem, porque oiço da tua bocas soníferos sons saboreando pratos vazios que imaginas estarem cobertos de coloridas encarnadas cerejas de papel, e sim, talvez não, sei lá..., os significativos sinais vitais, deixamos de a ouvir durante a noite, e de queixume em queixume, optou pelo silêncio, porque falar muito provoca hemorróides como depois viemos a confirmar, quando eles se levantaram da cadeira almofadada, com rodinhas, e meu Deus... o cheiro intenso a madeira de putrefacto cadáver de lata; e há pessoas com uma tal lata..., mas que lata, das grandes.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:22

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