Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

12
Mai 11

Dentro dele um electrão percorre-lhe o corpo e esconde-se no peito juntinho ao coração, sente uma picadinha, não dor, caminha até à pedreira, deita-se no chão e adormece.

 

A casa transpira e vê-se o suor impresso nas janelas, e nas cortinas, as cortinas sem fôlego com uma mão a segurar-se ao tecido para se proteger das ondas, quando nas rochas ele em criança quase a afogar-se, escorrega lentamente e desaparece no olhar de um petroleiro que passa lá longe, muito longe, dentro do corredor estreito e infinito, e das imensas portas, umas do lado direito, outras, do lado esquerdo, os olhos abrem-se.

 

Fechar os olhos, chamar os braços que andam em círculo junto ao rio e enrolar-se na tarde que começa a acordar, juntar os joelhos ao peito, dormir eternamente, e o electrão após várias tentativas de fuga começa a erguer-se até às nuvens, e as nuvens lá, construídas de silêncios de algodão e sorrisos de linho, a tarde desprende-se do corredor onde portas caminham junto ao rodapé, e do pai emerge a voz que em pedacinhos de palavras o chama, mas ele não acorda, dorme, sonha,

 

- eu deitado na areia, eu já sem corpo, eu sem nada, eu deitado na areia a sorrir aos albatrozes que caminham apressados pelas ruas da cidade, fumam cigarros compulsivamente, passam por mim, passam por mim como se eu fosse um contentor de lixo, e talvez eu um contentor de lixo esquecido na praia, eu deitado, eu a sonhar.

 

Ele dorme eternamente e sonha, ele a casa que transpira e nas janelas o suor impresso, as cortinas sem fôlego com uma mão a segurar-se ao tecido para se proteger das ondas, e a mão começa a dançar, e a mão deixa de se ver, mistura-se com as ondas, e desaparece do olhar, o corredor vazio, e na casa, na casa apenas as janelas com saudades do electrão…

 

 

(texto de ficção)

Luís Fontinha

12 de Maio de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:09

06
Mai 11

Nas tuas mãos líquidas de esperma, uma rosa saltita de alegria, contente, nas tuas mãos líquidas, o silêncio da alvorada travestido de nada, coloca na mesinha de cabeceira toda a sua história de vida, todo o seu passado, o projecto para o futuro, alguém, é indiferente, alguém abre uma janela da escuridão, e eis que todos os papéis, inclusiva o projecto para o futuro, voam literalmente, despedem-se uns dos outros, agarram-se ao cansaço de quando o muito era pouco, era nada, nas tuas mão liquidas, um sorriso agarra-se ao meu pescoço, com cio, que me faz corar de vergonha…

E o silêncio da alvorada fica com nada, perde tudo em segundos, tudo se pode perder em segundos, e fica refém do vento, será levado na tempestade, porta fora, e sempre na alçada do relógio que há muito deixou de dar horas, nas tuas mãos líquidas, a sombra, a minha sombra, não quer saber dos papéis que acabam de sair janela fora, indiferente, não quero saber, tens medo de mim, claro que não, porque devia ter medo de ti, sei lá…,

O medo faz parte do ser humano, talvez do ser vivo, essa não acredito, de que terá medo uma árvore, uma lindíssima flor do teu jardim, ou… as minhas mãos liquidas de esperma, não têm medo, provavelmente não, provavelmente sim, e o medo alimenta-se da dor, do sofrimento, quando uma criança chora porque tem fome, e eu caceio-me com o fumo do meu cachimbo, indiferente às tuas mãos liquidas, eu, indiferente. Quero lá saber.

As tuas mãos líquidas cheiram mal, cheiram a sexo de ocasião, faço desconto, pode pagar em suaves prestações, e o silêncio da alvorada fica contente, não tem nada, é feliz, para que quero alguma coisa, tenho tudo, estar vivo… é tudo. Enquanto as tuas mãos líquidas se despedem do meu rosto, escondo a minha tristeza no teu armário, um simples pretexto para voltar novamente às tuas mãos, regressar.

Regresso a ti, todo-poderoso, criador do céu e da terra, das coisas visíveis e invisíveis, mesmo dos neutrinos, sim, mesmo desses, regresso ao ponto de partida, quilómetros feitos, para nada, para voltar ao mesmo ponto, um qualquer referencial, em X ou em Z, tanto faz, regresso às tardes tristes de inverno, à lareira, à leitura, à escrita, regresso ao medo que tens de me perder, e já me perdeste, andas distraída, ou num qualquer referencial em Y, tanto faz, é-me indiferente que as tuas mãos líquidas tenham medo de mim, da minha sombra dispersa na janela do teu quarto, onde repousam as tuas mãos líquidas de esperma.

 

 

 

(texto de ficção)

Luís Fontinha

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 17:06

21
Abr 11

Em mim as tuas mãos de seda

Poisam no meu rosto em flor

As tuas mãos de abelha

No meu corpo em dor

 

Do meu corpo em silêncio

Despedido na madrugada

Em mim as tuas mãos de seda

Das tuas mãos de nada.

 

 

FLRF

21 de Abril de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 11:57

12
Abr 11

Da luz reflectida nele, ela sonhava abraça-lo, brincar com as suas mãos, levá-lo talvez a passear onde ela se escondia à tardinha, depois de o silêncio adormecer na tarde, depois de ela cansada, quase noite, ela a despedir-se do dia, ela a desejar o luar. E ele, desejoso de alcançar o mar, e ao fundo, a foz, o fim. Um petroleiro indiferente, e de soslaio, refugia-se na âncora que o prende ao fundo, aprisiona-o, e de olhos abertos, uma mão acena para ele.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:57

03
Abr 11

As minhas mãos, um líquido esquisito,

Que do rio, aos poucos, acordam,

As minhas mãos, enxovalhadas de sangue,

A saliva do marinheiro,

 

O cansaço de deus.

As minhas mãos, o cérebro do nada,

Plumas nos meus ombros nas noites de loucura,

Ele, eu, nós adormecidos num só corpo

 

Filhos do rio

Enteados do silêncio,

Amantes do mesmo corpo desvairado,

Louco, cheiramos a sexo,

 

Nos nossos corpos o líquido das minhas mãos,

O plasma que dentro das veias se enfurece

Com o pôr-do-sol…

A janela que depois de aberta… se cansa

 

E os nossos corpos seminus deitados no cansaço

Coberto pelo líquido das minhas mãos,

As minhas mãos, um líquido esquisito,

Que do rio, aos poucos, acordam,

 

Que no rio, aos poucos, se afundam…

 

 

FLRF

3 de Abril de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:24

31
Mar 11

Amanhã as tuas mãos hoje de seda

São húmus dilacerado

São sonhos de infância

Amanhã.

 

Amanhã as tuas mãos hoje de seda

São o meu cansaço

A Galáxia onde nasci

E hoje

Tão distante estou…

Amanhã

São o infinito

São electrões, positrões, e tudo que termine em ões…

 

Amanhã.

 

Amanhã as tuas mãos hoje de seda

São o Outono

Triste

Cansado…

 

E será que amanhã

Estarei vivo

Para ver as tuas mão hoje de seda

Serem húmus dilacerado?

 

Possivelmente, não…

 

 

Luís Fontinha

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:05

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