Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

06
Dez 14

As migalhas do teu suor

quando há nuvens com fome

e esqueletos sem nome...

os tentáculos da tua dor

mergulhados na calçada do Adeus

há uma rosa

há uma flor

que a noite alimenta

e não quer

na lareira da solidão

mas só as estrelas conseguem

desenhar na tua mão,

há uma paisagem sem amor

no sorriso de um caixão

há jardins embriagados esquecidos na escuridão

as migalhas do teu suor

quando há nuvens com fome

e esqueletos sem nome...

há ossos de papel voando na madrugada

que só o amanhecer consegue parar

há barcos infelizes

e há barcos apaixonados...

mas as migalhas do teu suor

são os alicerces da cidade dos pássaros aprisionados.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 6 de Dezembro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:35

21
Mai 14

foto de: A&M ART and Photos

 

Os teus olhos no espelho que poisa no meu rosto,

do cansaço adormecido das palavras anónimas,

tu, meu amor, sussurras-me baixinho que serei eternamente tua,

acredito,

acredito que há no teu jardim rosas envergonhadas,

acredito,

acredito que os olhos que habitam no meu espelho,

um dia serão as minhas estrelas vadias,

 

Os teus olhos que dormem nos meus lençóis,

sós,

a aldeia escapa-se entre os dedos da tristeza...

e acredito...

 

Ofereço-te o meu corpo embrulhado em poemas de miséria,

eternamente tua, eternamente... ausente de ti,

regresso ao espelho e descubro os teus braços na sombra dos meus seios,

afago os teus cabelos enquanto a noite se veste de menina desajeitada,

de menina... de menina de uma outra cidade,

ofereço-te o meu corpo como se eu fosse a tua flor preferida,

a árvore sob a qual te deitavas quando se inventavam em ti os sargaços da manhã,

e partiam os barcos para o luar como pássaros em busca dos filhos em voos infinitos,

 

Os teus olhos que dormem e sonham nos meus lençóis,

tão distante, tu, homem sem local para aportares...

ofereci-te os meus abraços,

e tu,

e tu fingiste não ouvir,

disseste-me que o cais serve apenas para a partida,

e partiste,

sem regressar nunca,

 

Como as palavras,

depois de extinta a fogueira da paixão,

ouvia o silêncio dos teus livros...

e nada mais tenho a acrescentar a ti e de ti,

 

Os teus olhos que nunca me pertenceram,

os teus olhos que brincavam nas minhas coxas antes de eu levitar em direcção aos sonhos,

cerravas-os e partias como uma tempestade de areia...

a ti e de ti,

as conversas inacabadas,

as palavras não escritas, e não ditas,

os teus olhos, os teus malditos olhos que iluminavam um cubículo de papel...

e tinham tentáculos que conseguiam beijar o mar.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 21 de Maio de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:07

24
Fev 14

foto de: A&M ART and Photos

 

Sou um pássaro sem gaiola de aço

um rio sem pontes

sou um barco sem leme sem velas sem vento...

sou uma árvore dentro dos finos abraços

escondido nos montes

saboreando o sofrimento,

 

Sou uma nuvem envergonhada

correndo os corredores da dor

sou uma rua esquecida na cidade

sou uma sombra desenhada

do jardim em flor...

sou... sou um homem construído pela saudade,

 

Sou um pássaro sem poiso um pássaro fingindo amar

sou um esqueleto invisível caminhando junto aos rochedos do amor

sou... um pássaro conversando com pequenos livros de porcelana

sou uma janela virada para o mar

esperando a morte vestida com cor

esquecendo a vida em noite escura que a toda a hora me proclama,

 

Sou o Inverno das madrugadas em geada

o patamar dos vadios pés revestidos a azulejo

sou um pássaro voando nos sonhos inventados

uma ribeira gelada

sou... sou um pássaro em desejo

comendo corações apaixonados.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 24 de Fevereiro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:53

29
Dez 13

foto de: A&M ART and Photos

 

Não tínhamos sabão para lavarmos os pecados cometidos durante a noite, da torneira do lavatório, um objecto quase em putrefacção devido ao estado de abandono a que foi submetido durante os últimos anos de permanência do habitante caquéctico a que dizem ser meu tio, apenas um fino fio de ferrugem, abria-a, fechava-a, e na esperança que de pequeno fio se transformasse em grande novelo..., mas... nada, sempre pingos de ferrugem, e mais nada,

Vida desgraçada, dizem alguns de vocês,

Vida alegre e de felicidade, acho-o eu, porque feliz feliz é aquele que não sabe o que diz, como eu, e voltando ao sabão, em falta dele temos sempre a fé para nos redimirmos, e claro, começamos a rezar, rezamos tanto que quando terminamos... tinham passado quase trinta e cinco dias, sem comer, sem beber, sem beijos, sem abraços... apenas rezávamos e de vez em quando...

Vida desgraçada, dizem alguns de vocês,

Olhávamos a torre da velha Igreja e sentíamos o vento baloiçar nos corpos nossos caídos no soalho da solidão, dizias-me que

Amanhã tudo será melhor,

E hoje, que é o teu amanhã, não tudo melhor, mas... da torneira do lavatório apenas um pequeno fio de ferrugem e sabão, não sabão para lavarmos os pecados cometidos durante a última noite, perguntei à ferrugem se sabia quando tínhamos água

Que

Não o sei, nada percebo disso e apenas respondo ao senhor seu tio, e eu respondia-lhe que

O senhor meu tio foi-se, esfumou-se... voou enquanto dormíamos... como dois lençóis embebidos em sémen e gemidos roucos dos cigarros acabados de fumar,

Que, ainda fumas?

Que

Não o sei, não o sei..., Amanhã tudo será melhor, Amanhã tudo será melhor, Amanhã tudo será melhor, Amanhã tudo será melhor, Amanhã tudo será melhor, Amanhã tudo será melhor, Amanhã tudo será melhor, Amanhã tudo será melhor... que

Não, deixei de fumar e pecar,

Não preciso de sabão, não preciso da água do lavatório nem dos lençóis embebidos em sémen e velhos gemidos, o senhor meu tio?

Foi-se,

Que..., que bicho mordeu ao seu namorado?

Saudades, apenas,

Ciumes?

Da

Da vida desgraçada, dizem alguns de vocês, ou...

Ou da noite em que tínhamos a certeza que nunca mais terminaria, perguntei à ferrugem, sentei-me na sanita e pasmei-me em perceber que dentro de nossa casa habitava uma comandita de trombudos deambulantes clandestinos pássaros que nos habituamos a apelidar de ferrugem e de ferrugem

O quê?

E de ferrugem nada tinham, sempre asseados, sempre penteados, sempre..., APRUMADOS,

Não tínhamos nada, parecíamos dois voyagers em busca dos caminhos perdidos, perguntava-lhe se ainda se recordava da tarde quando caiu sobre nós uma gaivota encharcada e com pequenos pedaços de

Ferrugem?

Lama, madeira da Índia e tílias falidas depois da tempestade lhes derrubar todo o telhado em zinco, a palhota a descoberto destruiu os poucos tarecos que sobraram do regresso a casa, e num caixote semelhante a uma pequena caixa de sapatos conseguíamos meter o que tínhamos de tão pouco o ser...

Algumas da cabras deixámos-las no pasto, lá ficaram, por lá ainda devem andar, quantos às vacas, essas, já devem ter morrido, passou tanto tempo meu querido filho

Tempo demais mãe, tempo é muito e às vezes é tão pouco,

A não ser que alguém nos empreste uma barra de sabão e um alguidar com água limpa, talvez a vizinha do quarto esquerdo

Essa não, essa não... tem a mania que é rica... todo cheia de coisas, não, essa não,

Então esperamos pelo regresso do barco que à quase quarenta e dois anos ficou de vir, e ainda não veio, e quem nos garante que ainda exista?

Ninguém, ninguém...

Tempo demais mãe, tempo é muito e às vezes é tão pouco, não tínhamos sabão para lavarmos os pecados cometidos durante a noite, da torneira do lavatório, um objecto quase em putrefacção devido ao estado de abandono a que foi submetido durante os últimos anos de permanência do,

Do VELHO?

Do minguante espelho com lábios rosados e seios de neblina, hoje sabemos que tudo foi uma mentira, mas ontem

Amanhã tudo melhor, meu filho, tudo melhor...

E não melhor, e não melhor, porque a ferrugem nunca cessou de crescer em nós, porque o lavatório ainda hoje chora as lágrimas negras das noites frias de Inverno, porque

Do VELHO?

Porque o VELHO... o VELHO era em aço laminado... a quente, a quente.

 

 

(não revisto – ficção)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 29 de Dezembro de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:18

03
Nov 13

Foto de: A&M ART and Photos

 

acreditava que eras em pedra maciça e que tinhas no cabelo uma seara de trigo

havia nuvens de poeira que envolviam o teu olhar

e sempre que chovia

uma janela acordava no teu peito

acreditava que não choravas porque as flores não choram

e eu

acreditava

que eras em pedra maciça

e eu

acreditava

que eras uma flor

com perfume de desejo

 

acreditava que pertencias às gaivotas de asas em papel

que vivias no mastro dos barcos doentes

e que amavas os homens como eu

esqueletos vadios

rolando as calçadas em direcção ao Tejo

acreditava que tu eras diferente

e que a escuridão da tua pele sangrava espinhos de chocolate...

doces desenhos no suor cuticular da vaidade solar

e tinhas na boca as palavras de vento que vomitavam bandeiras brancas em dias de tristeza...

acreditava

que eras uma flor

acreditava

 

que eras... um desejo

um corpo

um beijo de sílabas enlouquecidas numa tarde de Sábado

e no entanto

a tua escura pele adormeceu nos agrestes desenhos do Baleizão

que eras uma flor

lábios pintados de encarnado

beijos doirados

acreditava

e tudo parecia a mão da Inquisição sobre o púbis da saudade

havia ruas da cidade submersas em ti

como cordas de nylon aprisionando pêssegos carcomidos dos pássaros pretos

 

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 3 de Novembro de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:29

30
Jun 13

foto: A&M ART and Photos

 

Acreditava que voavam os pássaros

como voavam as tuas mãos nas janelas do meu peito

fingia-me de morto

apenas para perceber a cor das tuas lágrimas

acreditava que voavam as flores

como voavam os teus lábios nos meus lábios

acreditar

acreditando que as noites são pedacinhos de pano

com beijos em papel...

acreditava que voavam seios teus

em minhas mãos de sílaba adormecida

eu, eu acreditava,

 

Acreditando

acreditar que todas as manhãs acordavam as minha antigas sandálias em couro

esquecidas debaixo das mangueiras

acreditava que dormias em pé e te enrolavas no cacimbo

acreditava que voavam os pássaros

como voavam as tuas coxas sobre o trapézio da madrugada...

 

acreditar eu acreditava

mas não te amo como amo o voo dos pássaros

mas não te amo como amo as minhas pobres sandálias em couro

acreditava que voando como os pássaros

eu poderia voar como o amor sobre o mar ao cair a noite

acreditava que vias nas minhas palavras as fotografias de ontem

enquanto brincávamos sobre as bananeiras do teu quintal...

acreditava que voavam os pássaros

como voavam as palavras em versos esfomeados

distorcidos

infelizes como eu por acreditar nos pássaros voando não voando como nós

eu, eu acreditava.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 18:32

16
Jun 13

foto: A&M ART and Photos

 

Se dançávamos? Tínhamos acabado de regressar da longínqua sanzala de vidro com cubatas revestidas em saudade e pedacinhos de medo, aquém e além, uma voz fria gritava-nos, e arremessava-nos pedras invisíveis, e eu criança, envergonhado porque não entendia os orgasmos em sombras de café que os adultos deixavam esquecidos nos bancos do jardim, uma penumbra manhã perdi o esqueleto de mim, e de dentro do guarda-fato, divertia-me a pincelar tons mastigáveis na solidão de uma casa pequeníssima, com cinco janelas, e uma chaminé, e durante a noite ouvíamos as lágrimas sorrido parede abaixo... até se derramarem no soalho embrulhado em humidade e caruncho, que em alturas de desassossego, ouvem-se, ouvem-se em pequenas festas como fazíamos quando vivíamos na cidade dos desejos e dos sonhos e dos pequenos mares que entravam em nós, e nunca, nunca mais nos abandonavam,

Voltar?

Se dançávamos, não percebo agora o significado da desordem...

Voltar, em vez de descer, subir, sentar-me sobre o telhado, e ouvir a conversa dos pássaros nas tertúlias tardes dentro das mangueiras, debaixo delas, duas crianças experimentavam a força utilizando um cordel fino, tão fino como o cabelo castanho do velho Domingos, Voltar? Não percebo a desordem dos meus braços, não percebo a rouquidão da minha voz, e... principalmente, tu existes dentro de uma lata de conserva, vestida com um lindo vestido em papel verniz, colorido, e quando chove, ouvem-se-te em pequenas chamas de luz os batimentos de um coração apaixonado, Voltar... nunca, jamais, para quê e porquê?

Se dançávamos? Às vezes...

Voltar e não encontrar as ruas onde as tínhamos deixado, durante a noite, homens, mulheres e algumas crianças, utilizando a única força disponível, mudaram de local todas as ruas da cidade, o mar, hoje, já não está lá, lá, hoje, está um campo de milho que perdemos no horizonte enquanto observamos, e onde havia, antigamente, campos de milho, está lá, hoje, o mar, só, sem ninguém a chapinhar na água salgada e na areia branca, e ninguém nos avisou, e dizem-nos que até a nossa casa mudou de sítio, deslocou-se avenida abaixo, e foi literalmente engolida pela fome, e pelo ódio...

Porquê regressar! Se dançávamos? Olho-me no espelho e vejo o rosto, o meu rosto de menina, de mulher apaixonada, desiludida com as manhãs quando desapareces de mim e ficas só entre papeis velhos e outras fotografias, tão velhas, tão... imagens sem significado, oiço-me de encontro ao espelho, reflecti-me

Evaporaste-te através dos orifícios que sobejavam na cubata, espetávamos pregos sobre um velha carica, servia para isolarmos o mesmo orifício da humidade e dos espíritos malignos dos retratos semeados sobre a mesa-de-cabeceira, raramente conseguias segurar-te e acabavas por tombar sobre o passeio em cimento, dos joelhos, pequenos riscos, cromados gelatinosos aos morangos de um dos canteiros ainda não destruído pelo canino REX,

E porquê se me reflecti num espelho com coração de xisto, dele conseguia-se ver o rio e os socalcos encurvados por carris que nos transportaram até hoje, aqui, à sombra de uma velha cubata, esquecidos na sanzala trémula, vagueando como imagens no lençol nocturno onde brincávamos antes de nos deitarmos, era noite, e o teu rosto imagina-se liberto das minhas mãos, e o teu rosto... também ele, como as ruas e as casas, mudaram-nos de sitio, e hoje habita numa outra cubata, numa outra sanzala... num outro País de sonhos desencantados, falsos sonhos, de um falso espelho; tu

Se dançávamos?

Todas as noites, tu é que não te recordas de mim, da música, e das árvores e dos candeeiros suspensos no tecto do céu...

Claro, claro que dançávamos...

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:25

02
Jun 13

foto: A&M ART and Photos

 

Sento-me nesta cadeira de gente, só, pego nas palavras e semeio-as sobre uma fina toalha de linho, sentado, percebo que sou um ignorante diplomado, sinto que lá fora, no meu jardim, há pássaros novos, vê-se pela penugem, parecem ainda bebés, depreendo que nasceram aqui, e aqui vão crescer, até se fazerem homens, mulheres, e zás... desamarrarem-se do cais seus pais e nunca mais regressarão, ou talvez um dia, quem sabe... regressem, visitem as minhas já então velhas árvores, possivelmente, a figueira, deixara de existir, possivelmente, o pessegueiro recheado de atrozes, possivelmente, a cerejeira, essa, de coluna vertebral inclinada a quarenta e cinco graus, e nada, ou quase nada, que, eu, possa fazer para mudar o curso normal das coisas, estas, banais, e tudo, porque estou sentado numa cadeira de gente, só, pego nas palavras e semeio-as sobre uma fina toalha de linho, sentado, oiço-te quando gritavas o meu nome do outro lado da rua, havia casas rasteiras entre nós, um dia quis fazer de uma velha televisão um aquário para peixes, abri-a, e queria abrir o velho embaciado ecrã do televisor munido de válvulas e outros apetrechos, ligava-se e a imagem aparecia segundos, minutos, depois, como das palavras do outro digno Senhor “Precisa de aquecer as bobines e parece um poço a deitar música”, neste caso, imagens, a preto-e-branco, além de parecer uma bomba, fiquei com o rosto golpeado, tudo, porque o dito explodiu, transformou-se em areia, finíssima, como a tua pele doirada depois de bronzeada pelos dóceis dedos pertencentes à minha mão,

Que parvalhão acreditaria na possibilidade de fazer um aquário do ecrã de um velho televisor?

Eu, sento-me nesta cadeira de gente, vejo-te entre a roldana do tempo e a corda das cinzentas nuvens de fim de tarde, oiço-te do outro lado da rua, das casas rasteiras, vozes, rádios vomitando músicas, e músicas inventando imagens na minha ainda cabeça de criança. Cerro os olhos, entro num longo túnel com muitas cadeiras iguais às que hoje me sento, cadeiras de gente, só, eu, pego nas palavras e levo-as comigo, sozinho, dentro do túnel com uma das mãos enfiada na algibeira, porque perder as sementes de palavras, certamente, o meu fim, assim, ainda me resta a esperança de sobreviver às magoadas paixões de silício, semicondutores, dentro de mim, aumentam-nos a velocidade, a aceleração multiplicada pela minha massa, sinto-me sentado, mas realmente há muito que não durmo, não como, apenas existo para guardar a algibeira das palavras, e consigo ver a força expressa no espelho

(Nunca duvidei que F=m * a)

E é tão feia, velha, serão assim no futuro as minhas árvores onde acabaram de nascer este belos pássaros?

Oiço-os, existe um melódico som como quando, às vezes, oiço pela trigésima sétima vez elevada ao cubo, o projecto Wordsong (AL Berto), e eu, sempre dentro do túnel, e eu, sempre de mão na algibeira, posso perder tudo do pouco que me resta, mas perder estas poucas sementes de palavras, minhas, inventadas para ti,

E pergunto-me?

Falo em ti e nem sei quem porra tu és...

És homem? És mulher? És pássaro, vento, madrugada, esplanada, beijo, púbis, coxas? Não... possivelmente não és nada,

E pergunto-me?

Falo em ti e nem sei quem porra tu és...

Sento-me nesta cadeira, de gente, só, embriagado pelo silêncio dos Deuses adormecidos, pego na mão, abro-a, começo, vagarosamente a semear as poucas palavras que me restaram sobre a fértil secretária de madeira, oiço o soluçar do teu corpo, e sinto-te, tu, do outro lado da rua, as casas rasteiras, tu, brincas com uma roldana, és a responsável pelo andamentos dos relógios de pulso, ou daqueles como o meu, suspenso na parede da sala, e de quinze em quinze minutos...

Horrível, o horror de saber que existes, do outro lado da rua, as casas rasteiras, e não sei quem és, como o serás nua, se és homem, se és mulher, se és pássaro, vómito, canção, poema, desenho ou apenas alguém a brincar numa roldana,

Sento-me nesta cadeira de gente, só, pego nas palavras e semeio-as sobre uma fina toalha de linho, sentado, percebo que sou um ignorante diplomado, sinto que lá fora, no meu jardim, há pássaros novos, vê-se pela penugem, parecem ainda bebés, depreendo que nasceram aqui, e aqui vão crescer, até se fazerem homens, mulheres, e zás... desamarrarem-se do cais seus pais e nunca mais regressarão, ou talvez um dia, quem sabe... regresses para olhares pela primeira vez a minha sementeira de palavras.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:08

11
Mai 13

foto: A&M ART and Photos

 

Azul sou azul como os pássaros do infinito amanhecer, desprezava os horários, relógios, comia-os, os calendários? Simplesmente, olhava-os como pequenos bichos amestrados, imaginava-me sobre um fino arame que atravessava a rua dos sentidos, e eu, juro, não sinto, não sentia, nunca, coisa alguma, como hoje que azul como sou, os pássaros do infinito amanhecer, descobrem, coitados, que não existe noite, embriagados prazeres, nem aos dias faltam malabarices eternas, como as pieguices do catrapuz sistema de equações lineares, havia uma fígado encharcado em vodka, um fígado doente, mas contente, um... perfeito idiota, mafiosa como as bolachas de água e sal que deixavas sobre a mesa de granito que em pequenas rotações, mínimas, conseguiam alimentar um exercito de abelhas com pequenos parafusos de aço, com asas de porcelana, lama, a cama na lama que havia em ti, havia e havia

aprendi a consultar nas páginas amarelas

O teu rigoroso endereço num papel encarnado, escreveste o teu nome, número de polícia e telefone,

e ouviam-se-te os berros das horas por terminar, e ouviam-se-te os berros dos dias entalados na penumbra que os pássaros do infinito amanhecer, esse

O teu

silêncio que dizias-me existir no teu coração e que eu, nunca, acreditei, acredito no azul como eu do azul os pássaros, colados na tela que as velhas flores que crescem nas tuas coxas que a Primavera absorve, come, diz-se que o teu

Esse?

porque são as tuas coxas amarelas?

Diz-se que o teu corpo pertence às searas brancas com pontos de luz e pequenos torrões de açúcar quando se acendem na tua pele os pigmentos mórbidos das caravelas em flor, misturam-se-lhes as ditas coisas que despedaçavas como gargantas infelizes, e berravas, dançavas como estrelas em queda livre, até que os dias se transformavam em martírios e delírios, e uma pequena longa cruz de cedro poisava-se sobre os teus cabelos, à rapaz, de rapaz, saltavas os muros da aldeia e partias as cabeças dos transeuntes como tu, crianças como tu, e como tu

desejavam-se-lhes as pequenas palavras tatuadas no pescoço, um poema em forma de vidro, ou um pequeno vidro, travestido de poema, efeminado, ele, eu, corríamos suavemente sobre as palha adormecida do palheiro do tio Joaquim, e adoçavam-se-nos os corpos com pequenas caricias de mel e de mãos dentro de ti que procuravam o clitóris literário dos teus dias como nós

Vagueávamos nas docas encobertas com rochas e músculos comboios de areia, sabia-te como fosses um gladíolo comestível, ou prisioneira numa jarra de murmúrio, havia-nos de acontecer entrar no nosso palheiro, além do desejo, da paixão, do amor... a eterna saudade de ti quando fingias não me veres, e sentia-te sobre o meu ventre...

todo o teu peso, mínimo, a equação de três incógnitas, três equações suspensas por três letras aleatórias, e eu, resolvendo-as sem saber que tu existias, nunca te vi, mas imagino-te habitares dentro de uma integral tripla, ou numa talvez... pequena, sempre pequena, derivada do co-seno ou seno, tão simples, e não conseguia perceber que estavas lá, que sempre

Estive nesse lugar como os protões e os electrões,

Que sempre, ou não,

“azul sou azul como os pássaros do infinito amanhecer, desprezava os horários, relógios, comia-os, os calendários? Simplesmente, olhava-os como pequenos bichos amestrados, imaginava-me sobre um fino arame que atravessava a rua dos sentidos, e eu, juro, não sinto, não sentia, nunca, coisa alguma, como hoje que azul como sou, os pássaros do infinito amanhecer, descobrem, coitados, que não existe noite, embriagados prazeres”

Que sempre, ou não, acreditar que dos teus lábios, um dia, soltar-se-à

os triângulos dos teus olhos, adoro-os sem o saberes...

Soltar-se-à a madrugada com pequenas pétalas das flores que és tu.

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:52

10
Mai 13

foto: A&M ART and Photos

 

Pouco ou nada nos pertencia, e a lua, que eu sempre tinha ouvido dos vizinhos ser pertença do senhor nocturno com olhos penteados como bicos de papagaio subindo o céu, e de um simples cordel, suspendia-me como débil que eu era, não às árvores do quintal, mas a um enferrujado portão de entrada, eu sentava-me, eu poisava os cotovelos, eu imaginava das grades crescerem leões e jibóias... que histórias ouvia, sem que tenha algum dia visto, sentindo ou olhando, uma, duas, três... e a única cobra que realmente apareceu na minha vida, essa, chamava-se Etelvina, tinha calafrios quando lhe tocava e ressonava durante a noite, não como porcos, porque esses ainda conseguem ser mais silenciosos do que ela realmente o era, mas coitada, falecida, partiu para longe, e dos mortos, em alguns mortos, eu, não, falo...

só falo na presença do meu advogado, queixava o cigano marreco acusado de malabarismos dentro de uma velha tenda onde vendia, CD'S pirateados, cuecas a cinco euros, digamos doze pares, e não esquecendo telemóveis com chamadas grátis para todas as redes, incluindo a rede presidiária onde iria permanecer os próximos seis meses de vida, ele, não via as coisas por esse prisma e considerava a prisão como uma reciclagem, aperfeiçoamento dos infinitos malabarismos da sua longa carreira,

Fantástico, para

só eu, pouco, ou, pouco ou nada, sobejava do teu peito ofegante, como o pensávamos quando abríamos a janela do quarto, e bem lá longe, talvez do outro lado do silêncio, ouviam-se-lhes os gritos de revolta das ondas ensanguentadas pela velha e nojenta espuma vómito dos caracóis de corrida, sempre em luta contra as semanas de ausência do senhor nocturno com olhos penteados como bicos de papagaio subindo o céu, e eu, claro, confesso, gostava dele

Fantástico, para a próxima vendo-te um avião em peças, é só encomendares e marcarmos o local de entrega, e eu completamente embriagado pelos olhos da Etelvina perguntava-me – Para que raio preciso eu de um avião? - assinei o contrato sem o saber, e em primeiro, as letras de tão pequeninas, recordavam-me os ordenados de muitos desgraçados deste País, tão pequenos, tão pequenos... que nem com uma lupa se conseguem ver

é tal e qual como as coxas da Etelvina,

Depois a minha embriaguez, combinada com uma certa dose de gaguez, e daqui a pouco, com os guez... esqueço-me da promessa da menina Etelvina, eu caso, senhor nocturno com olhos penteados como bicos de papagaio subindo o céu, mas primeiro tem de dar aquilo que me prometeu, e como diz a palavra, Prometeu nunca prometeu nada, absolutamente nada, e a minha gaguez pertencia já a um fundo imobiliário, rentável a tal ponto, que repentinamente vi-me com dinheiro suficiente para comprar o que tinha prometido à menina Etelvina e ainda sobejaram algumas moedas, em caso de dita guez... voltar, regressar a mim e entranhar-se-me nos ossos ditos pertencerem ao meu esqueleto, a dúvida persiste, porque neste momento, ninguém

nem eu consigo determinar o que pertence a quem e o quê,

E ninguém acredita que eu tenha realmente adquirido o dito avião, mas a verdade é que sim, só não o adquiri como dorme sobre o meu guarda-fato, e durante a noite, não sempre, oiço-lhe o rosnar, levanta-se, abra a janela, e depois

é tal e qual como as coxas da Etelvina,

Desaparece no nocturno céu como as abelhas da ilha inventada pelas insónias da minha menina, a Etelvina, que ainda acredita, que eu, ando perdido no Oceano, à deriva, em pequenas rotações, mas verdade verdadeira

eu sou um pássaro que poisa hoje aqui, e amanhã, não tem onde poisar, e

Depois de amanhã, quando acordar o Sol, se acordar, e se tu, desculpa, morreste numa manhã de Novembro, mas havia sobre nós

o quê?

Estou totalmente arrependido de ter adquirido tal objecto, que uns chamam de avião, outros, avioneta, e outros... pássaro de quatro patas,

o quê?

Gostava dele...

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:53

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