Procurava nas penteadas espigas de milho,
o sabor amargo de amar,
deitava-me sobre o chão frio do granito ensanguentado da eira,
pincelava o luar de madrugada,
e procurava...
adormecia sem o perceber,
porquê?
e se era aquele o momento de o fazer!
o sino ouvia-se ao longe,
o horário deixou de fazer sentido,
tal como o calendário,
procurava... e nunca as encontrava...
As chaves do espigueiro telintavam numa algibeira furada,
que servia de esconderijo a um corpo emagrecido,
cansado,
e ferido...
Havia lágrimas nos olhos das frestas do espigueiro,
a madeira envelhecida... rangia... parecia um homem desiludido com a vida,
acordavam-me para o jantar,
e fazia de conta que não ouvia...
nem sentia...
o vento soprar,
e eu procurava... e ele em pequenos círculos... me abraçava,
acreditava que das pálpebras dos pinheiros fugiam as estrelas em papel,
acreditava que à resina regressavam as plumas fluorescentes das meninas de cartão...
e nunca vi o mar acorrentado ao granito ensanguentado da eira,
nem os barcos, nem os marinheiros com odor a sexo,
e no entanto... havia uma mulata que dançava na eira só para mim,
O zinco da sanzala gritava,
e um menino em calções chorava grãos de pólen,
não havia abelhas para me consolarem...
nem... nem mangueiras sombreadas nas mãos dos mabecos enfurecidos com o meu sorriso,
Bufunfa...
o kimbundu poético da paixão dos pássaros,
o voo silencioso dos dentes de marfim sobre a mesa da sala de jantar,
uma ténue luz que iluminava o capim que jazia nas bermas da estrada,
caminhava, caminhava... e não tocava no granito ensanguentado da eira,
brincava com os papagaios de papel inventados nos seios de um coqueiro,
cintilavam em mim as gazelas, os elefantes... e ao meu lados os entristecidos marinheiros...
e procurava...
adormecia sem o perceber,
porquê?
e se era aquele o momento de o fazer!
Levantar-me do chão frio do granito ensanguentado da eira.
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 23 de Agosto de 2014