Despeço-me de ti, sabendo que hoje é o primeiro dia da minha ausência, tive um pai, uma mãe, nunca tive irmãos, infelicidade a minha, ao menos podia culpá-los das minhas asneiras, e tantas foram, a electricidade as pinturas nas paredes do quarto, sala e cozinha, na casa de banho lia revistas, na cozinha lia livros, e no quarto
Batem à porta, a vizinha assedia-me para lhe emprestar dois ovos, uma galinha e um tractor de brincar, dei-lhe tu, menos o tractor,
E no quarto ouvia o sorriso do mar, quem, quem nunca ouviu o mar a sorrir?
Antes de acordar desenhava os eléctricos nas paredes do quarto, e esquecia-me sempre do maquinista, só, sempre só, e regressava sempre ao ponto de partida,
A chegada, o regresso acompanhado de algumas compras, presentes e um cão… deixa lá, estava só,
Vivia nas clandestinas casas do musseque, sentia o turbilhão do Machimbombo descendo o capim deitando-se rabina abaixo, zero feridos, zero mortos, apenas… apenas cadáveres vivos com olhar de mortos, não faz mal, amanhã tudo esquece, esqueço-me eu do teu rosto, esqueces-te tu do meu sorriso, e esquecemo-nos da alegria sagrada,
Sempre longe, sempre do outro lado do rio, pegava num livro, e adormecia como se fosse uma criança, desconfio
Foste sempre criança?
Desconfio que o Sol anda à volta da terra, tretas, a terra andar em volta do Sol, e eu, e eu?
À volta das dívidas, do cansaço, da tristeza
Ontem,
Da tristeza de não saber que me despeço de ti sem o saber, um coitado, ele sempre um coitado...
(ficção)
Francisco Luís Fontinha
Alijó, 05/12/2015