(desenho de Francisco Luís Fontinha - Alijó / IPO-Porto, 28/07/2015)
Tenho asas nas pálpebras
Sou o solitário viajante das noites infinitas
Oiço a madrugada embrulhada em pedaços de lágrimas
E das palavras que incessantemente te escrevi
Já não preciso delas
Nem dos livros
Fotografias
Nada assim
Tenho nas mãos os secretos beijos dos teus lábios
Tenho no olhar a tua boca sonolenta
Em queda livre
Em direcção à cidade
Finjo que amanhã será um novo dia
Estará sol
E vão nascer nos teus braços tristes cordas de nylon
Transformar-te-ás num barco de papel
Sem bandeira
Comandante…
Nem precisarás de marinheiros
Ou vento para desceres a montanha da saudade
Imagino-te voando como as gaivotas sobre o Tejo
Sentava-me e fumava cigarros doentios
Depois escrevia num caderno o número de petroleiros contra o desassossego
Traziam a dor
E os movimentos pendulares do sonho
Tenho nas pálpebras
As asas
Que a madrugada há-de afogar nos Oceanos
Que a manhã há-de levar na algibeira
Para a outra margem
Fotografias
Em queda livre
Livre…
Como o luar dos amanheceres em vidro
Fusco
Cortinados abandonados numa janela sem sorriso
Fusco
Finjo…
Que tenho asas nas pálpebras.
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 29 de Julho de 2015