Clarissa, meu amor, este presídio humilhado na humidade nocturna das estrelas invisíveis, a falta da minha mãe ao acordar
Amo-te meu filho,
Quando não me apetece acordar, quando não me apetece… tu sabes, Clarissa, meu amor, tu sabes que este presídio é feito de espuma, branca, com círculos de desejo, se fossem gajas de Cais do Sodré? Não, não são gajas de Cais do Sodré, antes fossem, meu amor, Clarissa, antes fossem gajas de Cais do Sodré, amanhã, não sei se vou acordar, e tu,
Amo-te meu filho, e tu, e tu, Clarissa, meu amor, embrulhada nos lençóis da amargura, poisa a tristeza nos teus ombros, e por minha causa
Amo-te, meu filho,
Os dias passados junto ao mar, e tu, Joaquim… Clarissa meu amor, e tu, Joaquim acorrentado a um rádio a pilhas, o Benfica perdia, pontapeavas o balcão do café, e tu, Clarissa, meu amor
Amo-te meu filho, hoje, não, hoje não me apetece acordar, este presídio um nojo, pulgas, carraças e sonhos…, meu amor, amo-te meu filho, Clarissa, meu amor, amanhã acordarei, mãe, amanhã, Clarissa, meu amor, a tempestade na calçada, não tenho forças para regressar, então Joaquim? Vai-te “foder” meu amigo, vai-te “foder” … perdemos, sim, sim meu amor, Clarissa, amanhã a liberdade, deixo este presídio de sons e palavras, amanhã deixo este caixote do lixo no passeio em frente à nossa casa, e o homem da limpeza
Amo-te meu filho!
Pai?
Sim, sim, Clarissa, meu amor, sim…
(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
domingo, 17 de Janeiro de 2016